XXXIV - O Gênio

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NAMJOON TERMINAVA DE manipular o último id, sentindo dor em suas mãos machucadas por tanto escrever no quadro negro seus cálculos. Muitas vezes se sentou na cadeira de rodas eletrizada para ganhar tempo, não suportava mais andar de uma sala para a outra, o seu quadril não estava perfeito para isso. Foram duas intermináveis semanas de trabalho, e ninguém da empresa havia visto seu rosto, exceto uma das funcionárias que o encontrava apenas para levar um copo de café e o almoço que ficava, quase sempre, intocado.

A voz em sua cabeça o incentivava a não voltar para casa enquanto tudo não estivesse terminado: não pare de trabalhar. Continue programando, criando, solucionando. Dormia apenas quando a exaustão o obrigava parar. Seu cabelo estava uma bagunça, seu jaleco surrado. Quando tudo terminou, ele se permitiu olhar para o seu sistema nas telas do coração da TECVision.. Estava sufocando dentro da sala da engenharia, não tinha uma janela, nenhuma vista agradável. Se puniu por isso, e depois da dispensa de trinta dias que a equipe recebeu enquanto se dedicava sozinho ao seu novo projeto, concluiu que mandaria instalarem uma enorme janela naquela parede. Ninguém merece viver em um labirinto de tecnologia.

Tomou alguns remédios, pois era inegável o quanto rendia quando esquecia da dor.

As papeladas estavam espalhadas no chão, os calculos no quadro negro, e quando apertou o botão para testar a Inteligência Artificial nascida de sua programção o seu coração quase parou: "SUCCESFUL".

— Está feito. — disse em voz baixa, desabando na cadeira e suspirando.

Olhou para a carta na mesa que esquecera ali.

Já havia lido, pelo menos, umas cem vezes aquelas linhas tortas.

Pegou mais uma vez o papel e o abriu em sua frente.

"Kim Namjoon,

Esta carta é um último adeus, um adeus que machuca profundamente meu ser, mas que se faz necessário.Não é fácil pôr em palavras o quão profundamente te amo e como me culpo por dentro por demorar tanto em aceitar esse sentimento. Cada momento que compartilhamos, cada riso e lágrima, todas as vezes em que me ajudou... Tudo ficará marcado em minha alma. Seguir sem você é uma dor insuportável.

Por favor, entenda que essa despedida não é uma escolha que fiz, é o meu dever. Estarei sempre aqui, torcendo por seu sucesso, compartilhando suas alegrias e apoiando-o em cada passo que der. Nosso amor continuará aceso como uma chama eterna que nunca se apagará.

Por mais doloroso que seja, este é o meu destino.

Irei esperá-lo para o nosso último adeus no mesmo lugar em que nos conhecemos e no mesmo horário.

Com todo o meu amor,

Jeon Jisso."

As lembranças eram afiadas, e podia senti-las na pele.

Imprevistos acontecem o tempo todo, e aquele dia não havia sido diferente. Havia chego atrasado no escritório, a notícia do sucesso com o Anpanman estava repercutindo em toda parte, e os patrocinadores exigiam reuniões com emergência. Tudo se tornou motivo de comemoração, e os funcionários iriam participar do jantar executivo com o consumo pago pela TECVision no final do dia.

Porém, a energia de felicidade se tornou uma lembrança assombrada para Namjoon assim que encontrou aquela carta na mesa. Olha para o relógio. Estava atrasado, não conseguiria chegar a tempo para impedi-la de cometer uma loucura como aquela. Não podiam se separar. Não imaginaria uma vida onde Jisso não estivesse.

Sem se importar com os comentários que isso traria, apenas corre para fora da empresa.Todos viram. Todos estranharam. Namjoon está dentro do carro, e o tempo parece congelar.

Se conheceram na escola de Seul, ainda crianças. O lugar há muitos anos se tornou apenas uma construção abandonada e vazia.

A procura em toda parte e chama seu nome até que se tornasse um arfar incompreensível. Não sabia para onde estava indo, mas continuava correndo. Continuou procurando. Se virava, não a achava. Não havia nenhum rastro. Não havia Jisso. Os últimos dias de sofrimento, as noites em que a abraçou enquanto chorava pelo seu filho. A obsessão por Anpanman, mas nunca pensou que aquela máquina a destruiria tanto. Não pensou que quando a fizesse perder seus sonhos, a perderia também.

Culpou-se tanto que sentiu tudo desmoronar ao seu redor. Corre para fora. Estava chovendo. Aqueles dias de dor pareciam ser um reflexo interno da sua ruína.

Jisso desapareceu. Olhando para trás, agora, sentado naquela cadeira de rodas e encarando o seu próprio projeto em sua frente, tudo pareceu óbvio demais: Jisso era uma excelente mãe que faria tudo pelo seu filho, e um acidente a tornou uma mulher quase impotente, isso porque tinha uma arma diferente dos outros: o poder de Namjoon e a sua inteligência brilhante. Era um erro que qualquer pessoa poderia cometer, mas fora do comum da realidade. Havia quem tentasse mudar aquela condição com uma superstição, e Jisso tentou mudar aquela condição criando do zero a sua própria superstição.

A tetraplegia era cruel, vazia e sem vida. Jisso era uma mãe.

Não era simples de entender?

Tudo que Namjoon tinha a oferecer ela usou ao seu favor, e ele acreditasse que não fosse uma manipulação intencional: ela devia estar mesmo determinada. Nenhum sentimento de culpa, medo ou tristeza iria impedi-la de continuar. Deveria ter sido inteligente o bastante para perceber que Anpanman sempre foi Jeon Jungkook.

Tira o celular do bolso e completou a ligação:

— Saudações, General Junkyu.

— Soldado Kim?

— Descobri as razões das falhas frequentes do Anpanman. Sou o único que pode resolver esses problemas. O que estou pedindo é um favor. . — admite, mas não sente constrangimentos por isso.

— O que está querendo dizer com isso?

— Além disso, devo mencionar que menti. A bala ainda está dentro do meu corpo, e está cada vez mais próxima da coluna. Eu irei ficar paraplegico em menos de um ano.

Namjoon enrijeceu o maxilar.

O General continua:

— Soldado Kim, o que tem em mente?

— General, o Projeto 2000 que entreguei apresenta falhas. Eu sei disso. Me permita tirar os defeitos, com toda certeza não irá decepcioná-lo.

— Diz que é um favor, mas parece uma oferta.

— Senhor, se olhar bem para os olhos dele, entenderá o meu pedido. Cabe ao senhor general Junkyu, acreditar ou não.

Escuta um suspiro de compreensão.

— Onde você o encontrou?

— Tive um privilégio único.

— Há alguma verdade por trás disso, e quando decidir me contar, me chame para um café. — Namjoon podia escutar o som das botas do outro lado da linha — Agora, irei aceitar e agradecer pela sua bravura. Ainda lhe devo muito, seus pedidos ainda são tolos. Quero a capacidade melhor ou igual, não preciso de um robô que reage mal ao som de tiros e demonstra dor para o exército. Não é disso que precisamos.

Sente um alívio imediato, mas já esperava pelo acordo. Aquele dia havia enxergado a gratidão nos olhos do general, e isso o confortava.

— Dessa vez não será apenas um acordo, General, e sim uma promessa. 

ANPANMAN - JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora