14h Domingo, dia 12 de feveireiro

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O suor em minha testa teimava em escorrer, o lençol, já tão grosso de inúmeras noites, secava-me enquanto eu me contorcia numa dança desesperada por conforto. O quarto fedia, era uma mistura, uma receita, uma poção desconcertante. Cigarros, mofo que comiam as paredes, sujeira dispersa e, claro, há mim. Uma sinfonia dissonante. Tudo junto, muita coisa, odor é difícil de se livrar.

Girei para o outro lado da cama, chutando o cobertor, pelos sons vindos dos vizinhos, era evidente que o relógio havia ultrapassado as duas da tarde. Ah, domingo, Todo dia é domingo!.
Duas horas, domingo, o suor persistente, o fedor entranhado, o lençol cúmplice, eu, e agora, os vizinhos inquietantes.

Queria fumar.

Irritado, ergui-me, contemplando o ambiente, o maço vazio pairava ao lado de meu colchão, eu estava ciente da ausência de cigarros desde o início - afinal, fui o único a consumir o último do maço -, me deitei.

A textura do lençol, após breves segundos de contemplação, fez-me mais consciente da desagradável realidade ao meu redor. Ele grudava em minha pele, me envolvia até de mais. Melhor permanecer imóvel, pensava, embora fosse ainda mais doloroso, não apenas devido ao lençol.

Às vezes, era mais consciente sobre ao meu redor do que a mim mesmo.
Suor incessante, domingo, fedor persistente, o lençol cúmplice, os vizinhos ruidosos, o mofo sutil, eu e a falta de cigarros.

A ideia de comprar outro maço cruzou minha mente, mas a ausência de dinheiro se unia à ausência de cigarros. Estava limiar da insanidade ou da mera abstinência, não sabia ao certo.

Poderia recorrer a pedir dinheiro emprestado, minha mãe talvez, pensei ao me sentar novamente. Olhei para o chão ao lado da cama, era domingo. Maldito domingo. Mamãe estaria na casa de meu avô. Descartei a ideia. Deitei-me mais uma vez.

Nessa altura, eu e o lençol já éramos uma entidade única, numa fusão romântica, patética, triste. Mofo pairando, vizinhos festejando, duas horas intermináveis de domingo, nenhum cigarro, sem dinheiro, sem mãe. Silêncio e eu, cada vez mais eu.

Eu demais.

Cansado de escrever, de enumerar, de rimar. Cansado de pensar.
Rodo na cama, me ajeito.
Mas não desligo.
Queria um cigarro.

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⏰ Última atualização: Dec 22, 2023 ⏰

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