Sugiro algumas correções no texto:
Astarco pegou um barco e decidiu que não ficaria mais em Alexandria; ele iria para a ilha de Creta. Durante a viagem, ele trabalhou limpando o navio. Um jovem marinheiro, que conhecia a vida do velho sábio, ajudava-o. Então, numa tarde de primavera, ele disse:
- Senhor, vejo que cansa muito. Não estaria sendo imprudente, afinal, o senhor é mais velho; deveria descansar?
O velho olhou para o marinheiro e disse:
- Me alegro em ver sua empatia, mas não tenho interesse em descansar. Faço isso por obrigação, afinal, vocês estão me levando. Um homem deve ser capaz de retribuir as gentilezas que recebe. Mas aproveitando o momento, eu pergunto: como você está hoje?
O marinheiro franziu a testa e retrucou:
- Estou bem!
Astarco então olhou para o marinheiro e, como um raio, lançou outra pergunta:
- Mas você está melhor do que ontem?
O marinheiro ficou confuso e balbuciou:
- Não sei, isso faz diferença?
- Pode me dizer por que dessa pergunta, mestre Astarco?
O velho olhou para o marinheiro confuso e respondeu:
- Devemos sempre dar o nosso melhor, caso contrário, ficaremos com o peso da culpa. Eu pergunto: se um homem nunca faz o seu melhor, como será o fim da vida dele?
O marinheiro não sabia responder. Ele estava, de fato, fazendo seu serviço, e o capitão necessitava de seu trabalho. Astarco continuou:
- O sábio faz de tudo para sempre fazer o seu melhor, não por exibicionismo, mas porque tem a responsabilidade de demonstrar sua humanidade. O sábio precisa fazer o melhor para que possa examinar o ontem e definir o quanto melhorou. E muitas vezes, o melhor que o sábio faz pode não ser o melhor do mundo. Muitas vezes, o melhor pode ser condicional, dependendo de características que ele não controla. Ainda assim, ele faz o melhor.
O marinheiro então perguntou:
- Devo ser o primeiro, então?
Astarco pensou e disse:
- Ser o primeiro em quê?
O marinheiro parou seu trabalho e disse:
- Bom, se eu for o primeiro em limpar o navio, serei o melhor da tripulação.
O velho riu e respondeu:
- Não, você apenas seria o primeiro. Eu pergunto: como foi o resto da tripulação?
- Meu jovem, o lugar mais alto do pódio é uma ilusão, pois não é possível diminuir os esforços dos outros que o cercam. Tal ilusão causa sofrimento. O sábio jamais pensa em ser o primeiro, já que isso não desqualifica ou enaltece algo. Todos somos seres pensantes, então todos estão em um esforço coletivo. O sábio apenas se preocupa em dar o seu melhor ao mundo e faz isso com esmero, nunca como uma penitência. Se uma pessoa faz o seu melhor e sofre, é porque está se cobrando de maneira desequilibrada. É bom examinar suas ações e expiar seus passos, mas fazer disso um sofrimento pesa demais. Devemos seguir nossas ações de cabeça erguida.
O marinheiro então pergunta:
- Senhor, e se os outros me julgam incompetente? O que faço?
Astarco olha com seriedade e retruca:
- Se você ouvir os relinchos do burro, o condutor não sairá do lugar. Eu digo que as críticas são importantes, desde que não venham com ideias destrutivas. Aqueles que fazem críticas devem ser capazes de dar oportunidade para melhorar. Se não encontram nenhum ponto de melhoria, se o exercício de auto aperfeiçoamento não identifica pontos importantes, é porque as críticas são infundadas, são carregadas de sentimentos densos. Então, o sábio tapa os ouvidos para elas. E eu costumo sorrir, pois sou ousado. No entanto, não me orgulho disso.
Outro marinheiro vê a cena e pergunta:
- Mas então, o sábio também tem onde melhorar. Ele também tem defeitos. Ele acha que todos devem melhorar?
Astarco ri e, depois de rir, olha para o marinheiro e diz:
- Tu pensas que sou hipócrita? Vou dizer a você que o sábio não se ofende com seus erros. Ofensa para ele é não perceber os erros que possui e ainda não ser capaz de corrigi-los. Um homem que não enxerga seus próprios erros é perigoso, pois possivelmente enxerga no mundo os erros que possui.
O marinheiro mais velho olha com raiva e asco e diz para o marinheiro mais jovem:
- Você tem trabalho. Este homem está te distraindo. Devemos fazer nosso trabalho e pronto, sem mais nem menos. Afinal, não seremos recompensados pelo esforço, e sim, por obrigação.
O marinheiro jovem sai, e Astarco segura o ombro do velho marinheiro e diz:
- Ao julgar como você trabalha, vejo que não está feliz com o que faz. Estou certo?
O velho marinheiro responde de maneira ácida:
- Isso não é da sua conta!
Astarco então responde de maneira suave:
- Está correto, não é da minha conta. Mas ainda é triste. Creio que é um sofrimento fazer algo que não traz benefício para a alma e a mente. O dinheiro até pode ser um benefício, mas vale o esforço? Ser refém do dinheiro ou perseguir o que deseja?
O velho marinheiro diz:
- Estou velho demais para dar significado à minha vida!
Astarco responde:
- Então, estou velho demais para viajar? Vou dizer a você: idade vem com sabedoria de vida. Mas um homem velho que passou a vida sem perseguir o que é significante, creio eu, está morto. Ele só não deitou no túmulo. Sei que a vida é provocativa. Sei também que devemos ser equilibrados e não transformar a vida em uma saga para o amadorismo. Devemos ter consciência e lucidez em nossas escolhas. A razão jamais poda o homem, ela o orienta. Quando a razão está podando a vida do homem, é porque ele está sendo guiado por sentimentos. Portanto, a culpa por seus atos não está na mente racional.
O velho homem sorri para Astarco, o mar está tranquilo e sereno. Astarco também está tranquilo, pois refletiu sobre a necessidade de melhorar.
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Os discursos de Astarco
Kort verhaaluma coletânea de discursos filosóficos em formato de contos, onde o personagem Astarco, vive como um mendigo na era de Roma, questionando o sistema e o pensamento da época, com muitas metáforas, será que seus discursos podem ser usados hoje em dia ?