Passei meu primeiro dia naquela mansão, desvendando os cômodos, coloquei um terno azul marinho e arrumei meu cabelo cuidadosamente antes de sair caminhando pelos longos corredores.
Estava um silêncio sepulcral quando abri a porta da sala no primeiro andar, a porta dupla deu para um amplo escritório, varri o lugar com meu olhar, então observei a pequena estátua no centro do cômodo, me aproximei da escultura em gesso branca, tocando o objeto com a ponta dos dedos, o rosto angelical que estava esculpido me encarava, franzi o cenho com a sensação de que não me era estranho, ela estava em um estande de gesso, elevada do chão, e um pequeno papel colado escrito algo em tailandês me chamou a atenção.
Aproximei meu rosto abaixando para tentar ler, mas estava tudo escrito em tailandês. Franzi o cenho, eu realmente preciso aprender a ler em tailandês.
—A visão? —Balbuciei em inglês, tentando traduzir na minha língua materna, era algo como visão, de algo.
—Bom dia. —A voz impetuosa soou atrás de mim, pulei levemente me virando para encarar o homem vestido de preto. —Conhecendo sua casa nova?
Assenti para meu inimigo, perfeitamente vestido em um de seus ternos caros, ele caminhou em minha direção, com aquela mesma pose ereta, que mais parecia um tigre diante de uma presa.
Ele era um homem extremamente intimidador.
Seu caminhar parou a centímetros de mim, ele lentamente se inclinou em minha direção. Nossos rostos estavam na mesma altura, ele estava tão próximo de mim que eu podia sentir sua respiração quente em minha boca.
Continuei parado em silêncio o encarando, ignorando a minha própria sensação de precisar fugir de seu alcance, mantive meu rosto impassível mesmo com a curta distância entre nós. Um mínimo movimento e nossos lábios se tocariam.
A mão dele tocou algo atrás de mim. E então ele se afastou segurando o papel em suas mãos. Seus olhos leram o pequeno pedaço de papel e ele me sorriu, um sorriso provocativo.
—Uma visão do meu paraíso. —A resposta a minha pergunta silenciosa me fez elevar a sobrancelha. —Eu que fiz.
Isso me fez piscar confuso, embora eu soubesse da veia artística de Off Jumpol, eu não esperar que ele tivesse uma obra própria centralizada em seu lugar de trabalho.
Afinal Jumpol administrava as empresas da família, além do partido. Ele desviou de mim caminhando em direção a mesa.
—Sente-se —Caminhei até a mesa de Carvalho e me sentei diante de sua poltrona vermelha. Sentado diante de mim Jumpol colocou um livro em minha frente. Abaixei os olhos para a capa.
A capa vermelha dura, escrita em inglês.
O capital, Karl Marx.
O livro foi empurrado em minha direção, eu o segurei em minhas mãos. A essa altura nossas mãos se tocaram, ele não soltou o livro e eu não o soltei também.
O encarei em silêncio, nossas mãos cruzadas no livro.
—Você tem sotaque inglês, imaginei que seria mais fácil ler em inglês do que francês.
—Quer que eu leia esse livro? —Esse acervo de ideologia barata?
—Você não gosta de ler ?
Puxei o livro de suas mãos, o nosso toque se separando, descansei ele em meu colo.
—Porque me deu uma arma?
Jumpol arrumou o próprio terno se sentando ereto.
—Você pode trabalhar nas criptografias na sua escrivaninha.
Ele me ignorou por completo. Mordi o lábio irritado e observei seu olhar impassível encarar minha boca por um instante.
—Ela estava descarregada.
—Você tentou usá-la?
—Não, eu apenas verifiquei.
Ele riu baixinho, se encostando na poltrona.
—Já tomou café da manhã?
—Já.
—Vou deixar por uns dias você sob a observação de alguém, para que você entenda nossa causa.
—Eu entendo a causa.
—Nesse meio tempo você pode se dedicar a traduzir esse livro para o tailandês, assim vai conseguir estudar o nosso alfabeto.
Levantei da mesa antes que eu fala-se algo que o ofendesse e caminhei porta a fora. O silêncio se passou por trás.
Naquela tarde folheei o livro sentado na escrivaninha, as horas se passaram rapidamente, antes que eu pudesse me dar conta, o meu adversário entrou no quarto após uma curta batida na porta.
—Conseguiu ler?
—O livro todo? Não!
—Pode ser uma parte, quer falar sobre?
—Eu conheço o capital.
—Se quiser discutir sobre o que aprendeu estou disposto a conversarmos.
—Faz isso com todos os novatos?
—Somente com os que tem potencial para me dar dor de cabeça.
Silêncio, balancei cabeça observando seu olhar sobre o quadro de minha família.
—Você concorda que todos devem ter direitos iguais?
—Claro.
—Todos devem ter acesso à educação?
Semicerrei os olhos, mais uma vez eu estava dentro do seu jogo perigoso. Off Jumpol e eu travávamos mais uma batalha mental.
—Sim.
—E se essa pessoa precisar trabalhar desde jovem? E ganhar quase nada por isso?
Suspirei me levantando, esse debate não levaria ninguém a nada, essa queda de braços só o faria enxergar quem eu realmente sou.
—E se fosse sua irmã? Que tivesse fazendo esse trabalho, trabalho que vai render muito dinheiro para alguém, mas que ela tivesse recebendo um valor que não serviria para viver um mês.
—Ela deve receber o que vale seu trabalho. —Mordi a língua, nossos olhares se cruzaram, eu pude ver a paixão silenciosa em seu olhar, a força com que ele se segurava no que acreditava, era forte e até arrebatador.
Podia enxergar que ele pegaria em armas pra defender o que acreditava, em cada uma de suas ações ele demonstrava esse poder, a imponência que parecia uma parte dele.
Por dentro eu estremeci diante disso, mas lhe sorri docemente.
—Ela deve ser dona em parte da empresa. Ela deve ser dona do que ela faz com as próprias mãos.
—Khun Jumpol sabe criar jóias? —Me peguei falando. Off se aproximou lentamente de mim.
—Sei, aprendi com meu avô.
Assenti, mais para mim mesmo do que para ele.
Agora estávamos frente a frente.
—Quer que eu lhe faça uma? Um anel?
—Um anel?
Ele riu de minha confusão e tirou um envelope do bolso, entregando em minhas mãos.
Abri o envelope tirando um colar de dentro, observei a joia dourada, com o pingente da foice e do martelo.
—O que é isso?
—Algo que fiz para você.
Apertei o pingente na minha mão, sem desviar o olhar do objeto.
—Espero que goste. E entenda.
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Liberté • OffGun
FanficGun Atthaphan, era filho de um tailandês e uma norte americana, membro do serviço de inteligência dos EUA, ele estava prestes a receber a missão de seus sonhos, voltar a Tailândia e destruir antes de se tornar um problema o PCT (partido comunista ta...