- Pai, você tá destruindo todo o meu trabalho – Bandit diz puxando minha mão.
Eu já roí todas as unhas pelo simples fato de que estou ansioso, mas isso já é inerente ao meu ser. Eu costumava roer até fazer sangrar, mas agora estou mais contido, principalmente porque desconto nos cigarros.
- Desculpa – digo em uma resposta quase catatônica e me levanto, como se fosse programado, de novo indo para a varanda, onde eu pego a carteira de Marlboro Gold.
Frank costumava fumar um cigarro mentolado vagabundo, que não tinha nem marca. Eu dizia que ele planejava me matar. Onde ele conseguia essas coisas? Por que eu estou pensando nele, afinal? Nós fumávamos juntos e olhávamos pela janela, a vida era cinza do lado de fora. Planejávamos coisas que nunca fizemos.
Já nem percebo mais a textura do fino cilindro entre meus dedos, o cheiro também não importa, mas parece que eu preciso de fumaça o tempo inteiro em meus pulmões, como se o ar que me rodeia não tivesse as toxinas necessárias para me manter vivo.
Tento pensar nas pessoas que passaram por minha vida. Um cara de olhos azuis e cabelos castanhos. Ele se chamava Jacob e tinha lábios bem desenhados. Fico me perguntando quando foi a última vez que beijei uma mulher. Mais de seis anos, eu acho. Por que tudo se torna tão aleatório quando deixo minha mente fluir por conta própria? Eu só queria ter foco.
Quando nós voltamos para casa ontem foi esquisito, principalmente porque eu estava cansado. Eu havia pedido para que Evan e Bandit avaliassem as bandas, que eles me dissessem quais eram suas favoritas, mas eles não gostaram de nada, o que foi pior, porque eu também não gostei de nada.
- Nós nunca mais vamos ter grandes bandas de Rock – minha filha dizia durante o caminho de volta. – Nada como Nirvana, Led Zeppelin, Motörhead, Joy Division... – Ela seguiu tagarelando, como se fosse uma especialista, e eu estava impaciente. – Minha geração é um fracasso.
- Se a sua geração é um fracasso é porque a nossa falhou – respondi sem pensar muito e todos concordaram. Não tinha muito que discutir naquele caso. – Mas vamos parar com esse pensamento derrotista por aqui, a gente ainda tem muito material pra desbravar. Inclusive, essas incursões vão fazer parte do documentário. – Foi um pensamento de última hora, mas que fez sentido.
Nesse instante, com o cigarro já queimando entre meus dedos, penso que é difícil mergulhar em uma piscina de jovens com seus instrumentos desafinados e com o carisma de uma batata crua para tentar encontrar algo memorável.
Deixo que o resto da noite passe, me machucando com meus próprios pensamentos, colocando essas horas em uma caixa de inutilidades a serem esquecidas. Quando percebo já estou vivendo outro dia, pronto para os compromissos e em um trânsito ruim, que ainda assim é melhor do que na maioria das cidades.
Estou pensando em Frank Iero, não posso evitar. Ele está na minha mira há muito tempo, por mais que eu esteja deixando essa carta para o final, sempre evitando mencionar seu nome como algo relevante. Ele vai estar em Los Angeles nas próximas semanas, ele já esteve aqui antes para a gravação de um EP, logo será um álbum. É meu trabalho saber disso, não é verdade? Isso não tem nada a ver com a estranha obsessão que eu adquiri desde o nosso fatídico término.
Eu não me importo com ele enquanto pessoa. Confesso que já desejei que ele morresse, que ele atravessasse a rua e fosse atropelado por um ônibus escolar, mas agora eu não ligo mais, ele é só parte do meu trabalho. Não é como acompanhar cada passo de uma pessoa procurando por sinais de que ela sente sua falta, é só trabalho. Trabalho.
Abro meu e-mail e meus olhos correm rapidamente pelas recomendações de produtos, lembretes de contas a pagar, assuntos da escola de Bandit, tudo misturado, linha abaixo de linha, parece um emaranhado de letras, nada faz sentido e eu nem tento procurar por ele. Apenas direciono o aplicativo para onde posso escrever um e-mail. Penso em enviar o arquivo diretamente para Swanson.
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Radioactive
FanfictionTento me afastar, antes que me veja envolto em sua armadilha de novo, mas a minha alma é receptiva, por mais que meu cérebro me alerte para o perigo iminente, até que ele se concretiza e me faz rastejar mais uma vez. [Sequência de Poison]