VINTE E CINCO

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Arabella, Ano 377

NÓS TÍNHAMOS APRENDIDO A VIVER NAS RUAS.

Mudamos de nome para evitar a perseguição, passamos a vestir roupas normais; qualquer coisa longe do branco. Viajamos a pé, pegando carruagens clandestinas ou caminhões de carga de óleo ou vegetais para descansar ou nos locomover em longas distâncias. Nós conhecemos cada centímetro de Syfer juntos, mantendo o máximo de distância possível de Marshaw.

Nós víamos nossos retratos falados de vez em quando e dávamos graças aos deuses que não se pareciam conosco. Minha mãe nunca prestou tenção o suficiente em mim e a única coisa que condiz com a aparência de Norvell em seus retratos era sua característica mais memorável — seu olho negro. Os Pontiac possuem política própria, e nossa fuga nos tornou propensos a punições decididas por nosso próprio líder. Nenhuma outra tribo é como a nossa.

Um dia, a Governadora impôs uma regra em suas terras. "Você pode anular suas penas e ter seus crimes perdoados se alcançar uma posição política acima daqueles que o acusam." Era conveniente para ela, a autoridade máxima de Syfer. Além disso, qualquer legítimo já é considerado acima de híbridos politicamente apenas por possuírem dons, o que também anula suas chances. Mas nós estávamos na posição perfeita.

Para nós, fugitivos, legítimos, poderosos e ambiciosos que precisavam escapar das dívidas, a nova regra prometia nos favorecer. Demorou muito para entender porquê Joah nos aceitou no governo. Naquela época, Syfer estava caindo aos pedaços, lutando para recuperar seu poder econômico depois da Primeira Grande Guerra de Myliand contra Oriwest, reivindicando a queda da muralha — sem sucesso. Seu Círculo de Influência estava morto ou à beira da morte. Todos os membros viveram nos Tempos Antigos da Terra e eram mais velhos que a Governadora, tornando sua habilidade de manipulação consideravelmente mais difícil. Ela precisava de caras novas, jovens poderosos com rostinhos bonitos e que, com sorte, beijariam seus pés por terem sido tirados das ruas.

Haviam panfletos sobre um torneio em Belltown que convidava qualquer um que preenchesse tais requisitos à uma batalha até a morte pela posição que escolhesse no novo Círculo de Influência. Os vencedores ganhariam um lugar no palácio permanente pelos próximos setecentos anos.

Nós nunca gostamos de política, mas aquela era nossa salvação.

Dias atuais

É um milagre que minha cabeça ainda não tenha explodido. Se tivesse uma arma à minha disposição, eu mesma me explodiria. Estou a ponto de implorar para que Nox me exploda.

— Depois disso, eu cortei a língua dele! — Nox finaliza sua história pela quinquagésima sétima vez esta manhã, desfrutando de um cacho de uvas roxas graúdas, limpando seu cachimbo e dobrando um envelope.

Tudo indica que Nox não vai me matar, mas também não vai me deixar em paz até que eu ceda.

Não tenho um quarto próprio, estou acorrentada à mesma cadeira de madeira desde que recuperei a consciência. Fazem dias que sequer sou autorizada a usar o banheiro porque, segundo Nox, este era um trabalho para Brutus — e Brutus está morto. Brutus tem tanta sorte.

— Pelos deuses, cale-se por um segundo! — grito, o garoto gargalhou, por sua vez. Minhas pernas formigam e meu estômago ronca.

— Levarei isso como um agradecimento a ter a honra de dividir o escritório comigo. — Ele encara o cachimbo por segundos dramáticos. — Sabe, um dia eu fiz uma promessa para uma pessoa especial: prometi que iria parar de fumar. Eu parei, entendeu? Mas é que agora estou morto, então não importa.

Quebradora da MaldiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora