A outra eu

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Mais uma caixa de Diazepam foi para o lixo. Isso sempre vem acompanhado de uma dose de melancolia. Isso porque ele meio que é o meu melhor amigo e tem sido assim a uns dois anos. Ao mesmo tempo que eu sofro pelo remédio ter acabado, eu também sofro por depender dele. Uma coisa meio que colide com a outra. Isso é tão patético...preciso comprar mais uma caixa  para parar de pensar sobre isso.

A história do último comprimido daquela cartela foi um pouco engraçada. Eu penso nisso a caminho da farmácia. O Google fotos tinha me mandado um lembrete sobre o "aniversário" de uma foto que eu tinha tirado. A foto de uma fotografia moldurada que um dia já  foi a minha foto favorita.

"Dois anos atrás" a notificação dizia. Era uma foto em família, de quando eu tinha seis anos. Nela, estamos eu, meu pai, minha mãe e meu irmão.

Aquilo me quebrou...trouxe a tona memórias que eu venho reprimindo a vários anos. Eu sinto tanta saudade daquela época. Da segurança de ser uma criança. De ser protegida e não ter responsabilidades. Quando meu pai era o meu super herói e minha mãe era minha super heróina.

Isso tudo acabou quando eu cresci. Quando Tyler, meu irmão mais velho, foi quem de fato encheu meu pai de orgulho. Sendo o primeiro aluno da classe desde o fundamental até o fim do ensino médio. Primeiro lugar da turma da faculdade e ainda tendo tempo de sobra para ser popular com as garotas.

Eu ficava feliz por ele. Até porque por mais que eu quisesse odiá-lo, ele nunca me deu reais motivos pra isso. Ele não era um babaca comigo, muito pelo contrário, me protegia e cuidava de mim. Ele me deu várias aulas quando eu comecei a colecionar várias notas vermelhas na escola e foi graças a essas aulas que eu nunca reprovei, mesmo tendo chegado perto diversas vezes.

Mas eu nunca fui primeiro lugar em nada, diferente dele. Eu era apenas uma garota mediana. Eu achava que apesar disso, meu pai amava nós dois da mesma forma. Que não havia qualquer tipo de favoritismo ou distinção. Mas eu descobri que estava enganada quando ele me disse que não podia pagar a minha faculdade porque já estava pagando a do Tyler.

Foi naquele dia que eu abri os olhos. Eu comecei a me lembrar de coisas que eu deixei passar durante a minha infância. Quando meu pai sempre levava o  Tyler para andar de bicicleta e para jogos idiotas de Baseball, mas raramente me levava. Ele, sem me perguntar se eu queria ou não, dizia que sabia que eu não iria querer porque isso era coisa de homem e uma garotinha como eu, com toda certeza, não iria querer fazer esse tipo de coisa.

Mas como ele era meu herói, eu nunca pensei na possibilidade dele me dizer isso porque gostava mais do meu irmão ou coisa assim.

Pouco tempo depois de descobrir que eu não iria para a faculdade, a não ser que conseguisse uma bolsa de estudos, houve uma terrível briga entre os meus pais. Já fazia um tempo que meu pai estava tendo problemas com a bebida e já estava mais que óbvio pra mim que o casamento dos dois estava indo para o buraco.

Será que ele descobriu ou ao menos, percebeu, que minha mãe traia ele ? Eu descobri.

Minha mãe nunca foi muito boa com tecnologia, então, ela acabou deixando uma conversa de whatsapp para trás. Ela tinha me pedido para dar uma olhada no celular dela porque o aparelho estava muito lento e quando eu peguei ele para mexer, eu acabei vendo as mensagens.

Elas eram bem ...como eu posso dizer ? Elas não eram nada do que se esperava de uma mãe de dois filhos. Eu estava em choque, passei a ver ela com outros olhos depois desse dia. Não apenas por descobrir que ela não era perfeita, como eu imaginava que era, mas por ver onde ela era capaz de chegar com o seu amante. O nível baixa ao qual ela se sujeitou.

Intrigada com aquilo, eu fiquei vários dias pensando se deveria falar para ela que eu havia descoberto ou não. Eu não tinha certeza se deveria confrontá-la.

Ao invés disso, eu pensei em outra coisa. O casamento dos dois está indo para o buraco, não é ? Será que o meu pai também tem uma amante ?

Eu esperei ele ir tomar banho e voei para pegar o celular dele. O aparelho estava protegido com desbloqueio facial, mas o que o meu velho não sabia, era que pelo fato daquele aparelho não ser dos melhores, ele tinha uma terrível falha de segurança. Eu peguei uma foto do meu pai e aproximei do aparelho até que ele reconhecesse o seu rosto. Por mais idiota que isso tenha sido, funcionou.

Eu descobri, revirando as redes sociais do meu pai,  que ele não tinha apenas uma amante, ele flertava com várias mulheres, e se encontrava com algumas delas.

Aquilo foi outro grande choque pra mim, pois várias coisas vieram a tona; eu era um fracasso,  meus pais não eram heróis e o casamento deles estava sendo sustentando pelo comodismo. A minha família perfeita...ela nunca existiu. Eu era uma criança iludida que tinha acabado de tirar a venda dos olhos.

Foi minha mãe que me convenceu a ir no psicólogo quando ela viu que eu comecei a mudar. Eu me tornei cada vez mais calada. Cada vez mais fria. Saia de casa sem dizer para onde ia e comecei a chegar cada vez mais tarde. O motivo era bem simples: aquela casa, assim como aquela família, foi significando cada vez menos pra mim. Ela não era mais o meu lar, era uma prisão. Algo  cujo qual eu sentia que precisava fugir, me afastar, porque pouco a pouco aquele lugar estava me matando.

Isso começou a piorar depois que Tyler foi embora de casa. Ele já tinha 28 anos e tinha começado uma vida ao lado de sua noiva. Não podia ser diferente, até porque ele estava ganhando muito bem como cardiologista. "O primeiro médico da família, que orgulho" meu pai dizia.

Tyler ter ido embora, só fez eu e meu pai ficarmos ainda mais distantes. Nós mal conversávamos e devido as minhas aventuras noturnas, ele dizia que eu devia estar "dando" por aí e que se eu chegasse grávida em casa, ele não iria cuidar do filho de ninguém.

Enojada, eu quase joguei na cara dele que era mais fácil uma de suas amantes aparecer grávida na porta de casa do que eu, mas ao invés disso, eu subi as escadas e comecei a arrumar as minhas coisas para ir embora. Minha mãe me seguiu e implorou para eu não fazer aquilo, mas eu já estava de saco cheio.

— Por favor, Dahyun. Não faça isso.— Ela disse aos prantos.

— Já passou da hora deu ir embora, mamãe. Eu já sou uma mulher adulta, não é ? Não tem porque eu ficar aqui, parasitando a vida de vocês.

— Não diga isso, querida. Eu sei que as coisas não estão indo bem...nós precisamos de ajuda, filha. Todos nós. Eu, você e o seu pai. Precisamos de uma terapia, ou sei lá.

Foi nesse momento que ela me convenceu a ir no psicólogo. Eu não podia negar que ela estava se esforçando. Aquele gesto me pareceu sincero e eu e ela começamos a ter acompanhamento médico. Meu pai, idiota como sempre, não aceitou ir. Mas eu não queria deixar minha mãe sozinha nessa e de alguma forma, ela não estava me deixando sozinha também, então, eu aceitei.

Foi assim que o Diazepam entrou na minha vida.    O acompanhamento médico ajudou até certo ponto. A doutora Im Nayeon me ajudou a entender que a culpa não era minha e qual devia ser a minha postura perante aquela situação. Também me receitou esse medicamento para me ajudar a controlar a ansiedade e me orientou para estar preparada para um eventual processo de divórcio dos meus pais. Ela me disse algo que já estava mais que óbvio, como meu pai não estava disposto a fazer algo a respeito dos problemas conjugais, era natural que ele e minha mãe se divorciassem. É melhor assim...eu acho.

Penso nisso enquanto caminho, após sair da farmácia com o meu remédio. Ainda bem que estou de toca. Além de me proteger do frio daquela noite de sexta, elas impedem meus fones de ouvido de caírem. Tento mudar a música que está tocando no Spotify. Eu fico pulando de música em música, não sei o que quero ouvir, até que começa a tocar Hell in heaven.

Eu sorrio com o prazer que as batidas daquela música me fazem sentir, pronta para colocar o celular no bolso do casaco, mas uma buzina repentina me faz olhar para o lado, bem mais lenta que o vulto que se aproximou em alta velocidade, me atingindo e me jogando longe.

Andar distraída no meio da rua mexendo no celular...que idiota que eu fui. Aquele som foi tão assustador. Eu ainda nem tinha me recuperado do susto quando colidi com o chão duro com toda a força, batendo com a cabeça.


===

Acordei quase que em estado de choque. Eu me sentei sobre uma cama espaçosa, cuja qual eu desconhecia. O medo ainda está sob o controle do meu sistema nervoso, acho até que eu gritei ao abrir os olhos. Eu olhei ao meu redor, tentando reconhecer o lugar onde eu estava.

"Acidente" foi o que me veio na cabeça. Eu sofri um acidente, então, eu deveria estar num hospital, certo ?

Mas olhando ao meu redor, tudo que eu vi me dizia que eu estava em um quarto comum. Eu me levantei, olhei para a janela. A luz do sol entrava abundantemente, atravessando a cortina branca sob a janela. Eu olhei o porta retrato sob uma cômoda. Levei um susto com o que vi. Era uma foto minha com a minha mãe e o meu pai. Eu parecia estar em uma festa de formatura. Minha mãe e meu pai estão sorrindo fartamente, com um olhar sinceramente alegre. Eu também estou sorrindo. Mas quando foi isso ? Eu não tenho a menor ideia de quando isso aconteceu.

Estou nervosa, tento por as ideias no lugar. A sensação horrível de ter sido atropelada ainda estava repercurtindo na minha mente.

Eu começo a examinar o meu corpo. Não estou sentindo nada quebrado. Não estou com nenhuma roupa de hospital, mas também não estou com a roupa que estava usando antes de sair de casa. Após me certificar de que estou inteira, começo a procurar pelo meu celular.

Havia um celular na mesa de cabeceira, mas não era o meu. Eu tenho um Poco F5, aquele era um Iphone de sei lá qual tipo. Eu peguei o aparelho o examinando, para minha surpresa, quando a tela do celular acendeu, tinha uma foto minha na tela de bloqueio, toda sorridente, em um vestido vermelho.

Novamente, eu não sabia quando tinha tirado aquela foto e tinha certeza de que aquele vestido não era meu.

O que estava acontecendo ?

Eu coloquei o dedo no sensor biométrico e para minha surpresa, funcionou. Abri o aplicativo de mensagens e vi algumas que eu sabia que não fui eu quem tinha mandado, mas as pessoas respondiam como se tivessem falando comigo. Eu nem sabia quem elas eram. Exceto algumas que haviam sido mandadas para os meus pais

Eu saí do quarto e comecei a andar procurando por alguém. Não sabia para onde ir, até porque eu não conhecia aquele lugar.

Percebi que definitivamente eu  não estava em um hospital. Era uma casa e das grandes. Eu desci as escadas e saí em uma sala de estar gigantesca. Ao lado dela, tinha uma cosinha. Pela mobília do lugar deu para perceber que os proprietários tinham dinheiro.

Percebendo que tinha alguém preparando algo na cozinha, eu entrei e disse:

— Com licença, eu..

— Ah, minha princesa. Você já acordou ? Bom dia, querida. — Era o meu pai. Ele dizia enquanto lavava a louça.


— Pai ?

Ele me olha com uma expressão de estranheza quase maior que a minha.

— Sim, querida. Sou eu. — Ele faz uma pausa me analisando. Lava as mãos antes de fechar a torneira, se vira para mim e diz — Está tudo bem ?

— Que lugar é esse?  O que nós estamos fazendo aqui ?

Meu pai franzi a testa. Olha pra mim com uma cara de preocupação que eu não me lembro dele já ter feito algum dia.

— Querida, isso é algum tipo de brincadeira nova ? — Ele pergunta secando as mãos e caminha na minha direção.

Ele levou a mão até a minha testa, verificando a minha temperatura.


— Você não parece doente. — Ele conclui.


— Humm...que cheirinho bom. — Mamãe diz entrando na cozinha.

Eu deixei um  suspiro de alívio enorme escapar ao vê-la. Ter os dois ali me deixou bem mais calma.

— Mamãe! — Eu falo correndo e abraçando ela. — O que está acontecendo? Que lugar é esse ? Eu quero ir pra casa. — Ela corresponde ao meu abraço e me olha frazindo a testa como se eu tivesse dito algo idiota.

— Que brincadeira é essa, Dahyun ? É algum meme novo ou algo assim ?

— É, amor, ela acordou dizendo essas coisas hoje. — Me pai diz, rindo, enquanto virava uma panqueca na frigideira.

— Vamos tomar café, querida. Depois nós precisamos ir até a loja comprar as coisas do seu consultório. — A mais velha falou enquanto pegava os pratos e os copos colocando eles sobre a mesa.

— Meu consultório ? — Eu cruzo os braços e pergunto em um tom quase inaudível, olhando para ela.

— Sim, Dahyun, o seu consultório. Você esqueceu ? — Ela se aproxima e começa a estalar os dedos perto do meu rosto. — Alô! Terra para Dahyun. Vamos, querida, acorde!

— Ah, certo...e cadê o Tyler ?

— Quem é Tyler ? — Mamãe pergunta enquanto come uma ameixa que ela pegou na geladeira.


Ao ouvir isso, meu coração disparou dentro do peito. Eu comecei a ter uma crise de ansiedade. Podia sentir as mãos suando, trêmulas, eu caminhei até a pia e tomei um copo d'água para tentar me recompor, sob o olhar atento dos dois.

— Dahyun ? — Mamãe chama por mim.

— Não é nada, deixa pra lá. Eu devo estar sonhando acordada. — Eu digo para ela caminhando em direção as escadas.

— Amor, você não vai tomar café ? — Ouço mamãe gritar da cozinha enquanto eu subo as escadas.

— Eu estou sem fome.

Eu voltei para o quarto onde eu havia acordado. O que estava acontecendo ? Eu estou sonhando ? Eu morri? Que lugar é esse ?

Ao entrar no quarto e fechar a porta, eu me joguei sobre a cama e num ato de desespero, eu me belisquei.

Nada, só a dor. Eu não estou sonhando.

Eu olhei novamente para o celular na mesa de cabeceira. Coloquei o dedo no senhor biométrico e ele novamente destravou.


— Não...calma, respira, Dahyun. Se acalma — Eu digo para mim mesma respirando profundamente.

Após bloquear o celular mais uma vez, eu tentei acionar o sensor biométrico com outro dedo, para ver se o aparelho era mal programado igual o do meu pai. Mas não...ele só desbloqueava com o meu dedão direito, o que significava que ele funcionava perfeitamente bem. Aquele celular era meu.

Eu abri a galeria de fotos e comecei a vasculhar, procurando por qualquer pista, qualquer coisa que pudesse me ajudar. Tinha muitas fotos minhas com os meus pais e tinha uma pasta chamada "aniversário da mamãe". Eu abri a pasta que continha outras fotos e muitos vídeos. Eu abri um dos vídeos e nele eu estava brincando com o meu pai, enquanto ele fazia uma calda de chocolate no fogão da cozinha onde eu estava agora a pouco.

" Vejam só! Eis aqui o melhor pai do mundo, fazendo o bolo de aniversário da sua amada esposa. Awwnnn que fofinho! "

Eu dizia, na gravação.

Meu pai estava rindo de maneira tão alegre e serena. Ele tinha até ficado vermelho.

" Pare, querida. Que tal pegar os morangos pra mim, hum ?"
Ele diz, tentando disfarçar a timidez.

Eu viro a câmera pra mim e começo a fazer outras brincadeiras até o vídeo acabar. Naquela filmagem eu estava tão feliz. Tão alegre. Quando foi que eu me senti assim ?


Quando o vídeo acabou, eu coloquei outro, onde estavam meus pais, eu e muitas outras pessoas que pareciam ser convidados, amigos da família. Eu não os conhecia, pausei o vídeo em um enquadramento bom, que parecia pegar todos que estavam presentes e comecei a procurar por Tyler, mas ele não estava lá.

No vídeo, nós estávamos cantando parabéns para minha mãe. Ela estava tão linda, tão feliz. Todos nós estávamos muito felizes. Nas fotos , haviam belíssimas fotos minhas com eles.

Eu não consegui suportar a emoção e comecei a chorar. Eu não sabia dizer porque aquilo mexeu tanto comigo. Deve ser porque eu sempre sonhei com isso. Uma família feliz.

Tinha várias pastas dos aniversários de anos anteriores. Não apenas da mamãe, mas do meu pai e os meus também. Sem falar nas de natal e fim de ano.

Larguei o celular na mesa de cabeceira e fui olhar no guarda-roupa da minha "outra eu". Achei sensato tratar a situação dessa forma, já que ainda não me convenci de que nós somos a mesma pessoa.

A minha outra eu de fato tem uma vida espetacular. Muitos vestidos de tecido fino e sapatos que devem ser bem caros. Descobri que ela revela as fotos que tira, pois tinha um álbum de fotos gigantesco no guarda-roupa. Quando eu o peguei eu senti uma energia tão boa. Eu não sei explicar. Aquela sensação era tão gostosa. A minha favorita é a foto que abre o álbum. Nela, estamos nós três atrás de uma gigantesca árvore de natal.


— Querida! — A voz da mamãe.

— Eu já vou.

— Por que você se trancou ? — Ela pergunta com uma expressão seria, depois que eu abri a porta.

— Ah...é...não é nada.

— Amor, você quer ir ao médico ?

Eu demorei para respoder. Seria uma boa, não é?


— N-Não, mãe. Eu estou bem. Eu só tive uma noite ruim.


— Como assim ?

— Que tal eu te contar enquanto nós tomamos café ?

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Contei para minha mãe o meu "sonho". Falei para ela e para o meu pai que eu sonhei que tinha sido atropelada e que por isso eu estava agindo estranho. Porque o "sonho" tinha sido muito real.

— Awwnnn, querida. Está tudo bem, meu amor. Vem aqui com a mamãe. — Ela me abraça de lado e dá um beijo no meu rosto. — Já passou, está bem ?

— É. Nós estamos aqui, querida. — Meu pai diz, se inclinando e acariciando meu braço, com um sorriso amoroso.

Aquilo era...assustador...quer dizer, o que está acontecendo ?

Nós tomamos o café da manhã com suco de laranja e as panquecas feitas pelo pa...pai.

É tão estanho voltar a chamar ele assim. Eu o chamava dessa maneira quando ainda gostava dele. As panquecas estavam deliciosas. Ele disse que tinha utilizado essência de baunilha, açúcar e raspas de limão siciliano.

— Ficou bom, querida ? — Ele perguntou, provavelmente por ter percebido o entusiasmo com o qual eu estava comendo aquilo.

Eu fiz que sim com a cabeça e pude perceber como ele se sentiu a pessoa mais feliz do mundo naquele momento, orgulhoso por ter acertado a mão.

— Você sabe que a sua comida é a melhor. Deve ser por isso que eu não consigo te largar, querido. — Mamãe diz segurando no rosto dele e roubando um selinho.

Eu desvio o olhar, pega de surpresa com essa demonstração de afeto por parte dos dois. Quando olho de volta, meu pai estava vermelho como uma pimentinha.

— Agora, vamos acelerar. Eu ainda tenho que ir para o escritório depois que eu e a Dahyun comprarmos as coisas para o consultório dela. — Mamãe diz.

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Após tomarmos o café, eu fui para o meu quarto, se arrumar. Quando finalmente terminei e estava descendo as escadas, minha mãe me olhou,  como se algo estivesse faltando.

— Há algo de errado ? — Eu paro de descer e pergunto, segurando no corrimão.

— Você não vai pegar a sua bolsa ?

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Eu revirei o quarto inteiro até finalmente achar. Ela estava na primeira gaveta da cômoda, mas eu sempre guardava minhas coisas na minha parte  do guarda-roupa de casa.

Dentro da bolsa de cor pastel, tinha um brilho labial, colírio, balas de menta, meu documento e muitos cartões de crédito.

Ao olhar para o documento, eu tive uma grande surpresa: eu nasci no dia 28 de maio de 1998, mas aqui, seja lá o que isso for, eu nasci no dia 14 de abril de 2000.

Eu me olhei no espelho da penteadeira, escovei o cabelo e passei um pouco do perfume que já estava lá. A fragrância era deliciosa.

Então...aqui, eu sou mais nova ? Não mudou muita coisa, mas foi bom saber que estou um pouco mais longe dos trinta.

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Eu e a mamãe nos despedimos do papai. Ele me deu um abraço bem forte e um beijo no topo da cabeça. Óbvio que foi uma sensação estranha, ele não me tratava assim nem quando eu era criança, mas o meu coração gostou daquilo, porque ele ficou se mexendo dentro do peito. Eu correspondi o abraço e segui minha mãe até a garagem.

Eu fiquei de boca aberta quando vi uma BMW X1 na cor branca  diante de nós. A minha reação não poderia ser outra, até porque minha mãe tinha um  HB20.

Também tinha outro carro na garagem, uma Volvo XC60, que eu julguei ser do meu pai.

Eu disfarcei a minha surpresa e entrei dentro do carro da mamãe.

— Que milagre. Não vai me pedir para deixar você dirigir ? — Ela pergunta.

Eu não sabia dirigir, até porque eu não tinha um carro.

— Ah...é...hoje não. — Foi a melhor desculpa que eu consegui, em meio a um sorriso forçado.

Os portões automáticos da garagem se abriram e ela deu a partida.

Enquanto ela dirigia, eu fiquei pensando.

Eu descartei a possibilidade deu estar morta, porque eu duvido muito que a morte seja assim.  Será que isso é um tipo de sonho? Mas eu me belisquei e não acordei...

Então...se eu não estou morta e não estou sonhando, isso é uma experiência de quase morte ? Porque eu tenho certeza que o acidente foi real. Mas nos filmes que eu vi, as experiências de quase morte não são assim. É algo mais sobrenatural e tirando o fato deu estar em outra realidade, não há nada de sobrenatural aqui.

Outra realidade! É isso!

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Olá, se você gostou dessa história, não se esqueça de avaliar e se possível, comentar. Estou gostando bastante de escrevê-la e o engajamento de vocês me ajuda muito. Até a próxima 🫰

A garota esquilo (SaiDa)Onde histórias criam vida. Descubra agora