O ranger da porta sendo aberta me despertou no susto do meu sono. Por mais que a pessoa estivesse tentando abrir o mais lento possível, eu acordei.
Olho a janela e, pela altura do sol, deveria ser por volta das sete horas.- Oh, Emilly! Me desculpe, não queria tê-la acordado. - Ouço uma voz familiar. - Como se sente? -
- Não tem problema, Serena... Me sinto muito bem, obrigada. - digo, levantando e dando alguns passos, mas com dificuldade.
- Que bom ouvir isso! Então acho que você precisa de um banho, vou preparar a água.
- Não, Serena! Não é preciso se incomodar, mesmo! Eu consigo me virar sozinha, não se preocupe. Inclusive, sabe onde estão minhas roupas?
- Oh, sim! Estão ainda na lavanderia. E o próprio príncipe disse que eu poderia apresentar à senhorita os vestidos da falecida rainha. - ela diz, Sorrindo de lado e segurando minhas mãos em extase.
- Oh, Meu Deus! - reviro os olhos. - Isso não é necessário! Sério.
- Ah, pare com essa bobagem, Emilly, venha! Vamos escolher. - Ela abre o guarda roupas do lado direito do quarto. De repente, ela para, olhando para mim. - Não tem problemas em usar roupas de pessoas falecidas, tem?
- Oh! Não! Claro que não. - digo. - Mas, preferia minhas roupas.
- Aham, tá. - Ela ignora completamente. - O que acha desse? - ela pega um azul marinho com detalhes bordados em dourado.
- É, talvez. - franzo a testa e ela entende o recado. - Não vamos abusar, né?
Vou até o armário e observo as roupas que haviam ali. Vestidos de inúmeras cores, do vermelho ao verde, do azul ao preto, mas todos de tons escuros e frios. Muito bonitos e muito bem feitos.
- Pode ser este. - escolho um vestido neutro e discreto, preto com detalhes em uma cor mais clara como bege.
- É, vai ficar muito bom! Tem certeza que não quer ajuda para o banho?
- Oh, meu Deus! Não, Serena, muito obrigada, mas pode ir, você deve estar cheia de trabalho, inclusive.
- Bom, então vou indo! Tento passar para vê-la mais tarde. - ela sai e então fico sozinha novamente.
Tomo um banho, visto o vestido e tranço meu cabelo para trás como de costume.
A manhã estava fresca, embora o sol estivesse brilhando alto.
Agora era possível ver o longo jardim do palácio tomado por flores e a água que corria de um lago onde havia uma fonte. Era lindo. Caminho um pouco mais e percebo que a dor já havia melhorado consideravelmente.Decido então sair um pouco do quarto. Não poderia fazer mal.
Me deparo então com um enorme corredor onde haviam muitas outras portas, mas todas fechadas.
Caminho, lentamente e com cuidado, em direção ao fim do corredor.
Ele dava acesso a um outro corredor virando à esquerda, e este outro corredor dava acesso a um hall esplêndido. Guardas e serviçais andavam por todos os lados, alguns voltavam olhares para mim sem entender minha presença, mas continuavam seus trabalhos.
Mais a frente vi uma claridade que parecia vir da porta. Pus-me então a caminhar até lá. A porta dava de frente ao longo jardim.
Começo então a caminhar por ele e sentir o delicioso perfume das flores.Mais ao longe, à esquerda, vejo de costas uma silhueta familiar e inconfundível. Príncipe Philipe vestia uma armadura pesada com o símbolo real e duelava com um homem que aparentava ser um pouco mais habilidoso que ele e que, aparentemente, não parecia ligar de estar lutando com o príncipe.
Era como uma dança de espadas, que causava um alto som de combate.
Eles pareciam estar nesse embate a horas, visto que as gotículas de suor brilhavam na luz do sol.Philipe parecia entender bem o que fazia, como se fossem anos de treinamento, mas ainda assim estava com dificuldade de vencer os golpes complexos de seu professor.
Por fim, o último golpe foi dado pelo príncipe, que conseguiu desarmar o oponente e apontar sua espada para a garganta. A mesma espada com as inicias "E.R."Vendo o embate, lembro-me de quando o encontrei na floresta, ele poderia ter me tomado a espada a qualquer momento e me matado, mas não o fez.
Ao fim da luta, nossos olhares se cruzam . Ele então se vira para o homem, conversa por alguns segundos, entrega a ele a arma, seca o rosto com uma toalha e põe-se a caminhar em minha direção.
- Vejo que já está caminhando, senhorita. - ele diz, ao chegar próximo a mim e me olhar de cima a baixo. Seu cabelo estava molhado, seu rosto vermelho, mas ainda assim o cheiro almiscarado exalava de seu corpo.
- Alteza. - faço uma reverência breve. - Sim, estou. Disse que eu não era prisioneira, então tomei a liberdade de explorar o jardim do palácio. Espero que não tenha feito mal.
- De maneira nenhuma, senhorita. As flores realmente precisam ser apreciadas, confesso que não tenho muito tempo para isso. - Ele apoia as mãos sobre a espada e solta um sorriso de lado e discreto.
- Embora as circunstâncias não tenham sido as melhores, devo agradecer-lhe por todo o auxílio e cuidado, alteza. Agradeço vossa hospitalidade.
- Um agradecimento? Vejo que temos um avanço por aqui. - reviro os olhos e ele arqueia a sobrancelha. - Não tem o que agradecer, senhorita. Fico feliz que esteja bem.
- Estou! Inclusive, eu realmente preciso voltar para casa. Minha família deve estar preocupada comigo. Sei que vossa alteza mandou que os avisassem, mas eu realmente preciso voltar.
Então, somos interrompidos por relinchar de cavalos adentrando os muros do palácio, cerca de 10 cavaleiros mais uma carruagem pomposa, cavalgam depressa em nossa direção.
Philipe parece inquieto com aquilo.- Alteza! - um guarda o chama, se aproximando de nós.
- Sim. Eu sei. - é a única coisa que ele diz. - Emilly, ouça-me bem, sim? Quero que volte para dentro do palácio e me espere em seu quarto, por favor. - a última parte sai como uma súplica e entendo ser algo sério.
Sem responder, adentro novamente o castelo, a medida que ouço o relinchar cada vez mais próximo. O que estaria acontecendo?
Adentro o quarto, encosto a porta e vou espiar pela janela. Os cavaleiros, cinco a frente e cinco atrás da carruagem, param todos em frente à porta do castelo.
O príncipe parece estar nervoso. Dois guardas estão ao seu lado. A carruagem para exatamente a sua frente. Ele está com as mãos nas costas e vejo-o apertar o punho com força.
A porta é aberta e vejo então a figura que sai de dentro da carruagem. Todo em armadura, sem coroa e sem pompa, mas o reconheço. Rei Henrique, aparentemente exausto e com uma carranca em seu rosto, troca meia palavra com o príncipe e adentra o palácio sem ao menos tocar nele. Cinco dos 10 cavaleiros o seguem para dentro, seguidos de Philipe e dos outros guardas. Reconheço um dos últimos, Dylan, irmão de Serena.
O rei parecia estar esgotado, assim como os cavaleiros. Com certeza a situação na guerra estava cada vez pior. Lembro-me então de Brian e meu coração se aperta. Eu estava aqui, no palácio e segura, , enquanto ele estava sabe Deus onde, passando sabe Deus pelo que. Talvez vivo, talvez morto... não dava para saber.
É estranho como o mundo fora dos muros parece ruir, mas aqui tudo aparenta estar na mais perfeita normalidade. E o causador de tudo isso estava a metros de distância de mim.
Raiva invade meu consciente, minha pulsação aumenta e minha respiração descompassa. Sentia como se meu coração fosse parar a qualquer momento, não conseguia respirar.
Eu preciso sair deste lugar!
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Reinado de Espinhos
Ficção HistóricaO reino de Nervídea está sendo assolado pela guerra. A jovem camponesa Emilly tem seu irmão gêmeo convocado para a guerra e isso faz com que ela aumente ainda mais seu ódio pela realeza do país. O que ela não contava, é que teria que lidar com o prí...