A árvore do caminho

239 14 3
                                    

Na biblioteca do grande castelo de Ventura estava reunida a turma de aprendizes do velho mestre Palma. Um acontecimento importante iria transcorrer na tão silenciosa e demasiada calma aula de Organização e classificação de livros.

Com um aceno de mão, o mestre fez o aluno da primeira fila se levantar. Nervoso e suando feito um trabalhador braçal, o rapaz aparentava estar em choque. Isso parecia divertir os alunos que o assistiam. Levantando de sua cadeira e sem aparentar nenhuma preocupação com as intrigas juvenis de seus alunos, o velho começou a falar:

─ Hoje, tenho o prazer de vos anunciar o pupilo que dará continuidade aos trabalhos na grande biblioteca do reino. - disse, olhando com sincero carinho para o jovem. - Pérgamo! Venha até aqui.

A classe inteira riu, era demasiado divertido que o novo diretor da biblioteca quase se chamasse "Pergaminho", aliás, esse era o carinhoso apelido que recebera dos colegas de turma. Contrariado, Pérgamo lançava um olhar fulminante aos colegas que nem um pouco se preocupavam com as caretas do garoto.

Como de costume, todo novo diretor da biblioteca era obrigado a ler um trecho de um livro que considerasse mais importante em sua busca pelo saber e que de certa forma inspirasse sua jornada. Pérgamo escolhera o livro que muitos consideravam "fábula para crianças", mas ele não ligava para isso, pois dentro de seu âmago sabia que as coisas no reino não iam tão bem quanto se pensava.Ainda encarando com severidade os colegas, Pérgamo se dirigiu à mesa que estava de frente para os alunos. O mestre apreciava cada momento e com calma esperava que o jovem dominasse a situação.

─ Eu sei que muitos de meus colegas não acreditam em profecias, mas lamento, pois elas sempre existiram e confirmaram o atual estado de Ventura. - disse firmemente - A bela do caminho vive!

Os seus colegas olharam incrédulos para o jovem e muitos foram os protestos para que ele se calasse. "Blasfêmia!" disse entre risos Amadeus, o jovem grande e corpulento aparentava mais vocação para ser bobo da corte do que mestre.

─ Calem-se! - Disse o velho mestre aparentemente cansado de tanta rebeldia. - Não duvidem do meu poder de escolha. Vocês apenas são aprendizes, quando forem mestres assim como o jovem Pérgamo, saberão do que ele fala.

Um silêncio ensurdecedor tomou conta do ambiente. Pérgamo olhou para os jovens e meio contrariado começou a ler o livro de capa verde com detalhes dourados. Já estava muito encardido e parecia ter algumas folhas roídas pelas traças.

"Do tempo sou filha... E que bela e frondosa filha sou eu. Mas não tenho mãe. A minha origem não me intriga, pois venho de onde tudo sempre existiu e o começo é uma mera percepção daqueles que me contemplam. Não sou má como muitos tentarão fazê-lo acreditar. Sou apenas dedicada a minha missão. O vento roça os meus ramos e, eu incólume em meu sono, sou grata por ser benevolente. Não dou frutos e não me desgasto em ato tão generoso, o que seria de mim se me perdesse no meio daquelas árvores comuns? Cansei de ser apenas um oráculo para seus jogos; divertiram-se muito vendo a desgraça de seus inimigos, mas dentro de meus cascos, no lenho de meu ser, os consumirei por terem profanado meu sono eterno. Quando o tempo se passar e as estações me levarem as forças, no inverno mais rigoroso, darei uma flor mais vermelha do que o sangue, ela será o começo de um novo tempo para mim e do fim de uma dinastia rebelde..."

─ Chamam-me Frondosa ou Bela do Caminho. - disse uma voz feminina interrompendo a leitura. Era uma senhora de cabelos negros e muito magra que adentrou o salão, seus passos ecoavam rígidos e severos. ─ Não sabia que ensinava fábulas aos seus aprendizes, mestre Palma.

─ Senhora Melissa Arno - que surpresa inesperada, pensou consigo. - Ainda vaga pelo castelo enquanto deveria estar ocupada com a arrumação das festas da corte?

O sonhador, a velha árvore e o reiOnde histórias criam vida. Descubra agora