Pretty Dress - Uma história Jogos Vorazes

Capítulo 10 - Her

She had blue skin, and so did he. He kept it hid, and so did she. 

They searched for blue their whole life through, then passed right by - and never knew. 

- Shel Silverstein

Já fazia dias desde que a rotina de Gale passara a envolver as atividades na Academia, separando armas do arsenal com Doc, carregando peso pelo lance de escadas, desfazendo os nós complexos da rede que pendia sobre o ringue de lutas, guiando pintores através de galerias e monitorando toda forma de serviço com que pudesse se ocupar.

Nas horas que se seguiam enquanto ele trabalhava em silêncio, sempre acabava se deparando com alguma coisa nova. Descobriu que uma das portas laterais do salão principal levava a um ginásio alto como uma catedral, onde uma grande piscina, agora vazia, se estendia de uma extremidade a outra. Nos jardins para além do prédio, uma escadaria desaguava para um lago amplo, circundado por uma pista de corrida interceptada por linhas concêntricas apagadas pelo tempo. Demarcações no jardim indicavam o que provavelmente fora espaço para variadas atividades ao ar livre, onde mesmo as árvores retorcidas pareciam um elemento pensado para o treinamento das crianças.

No fim daquela tarde, seca como as folhas que lentamente cediam à virada da estação, Gale finalmente terminava mais um dia de expediente e atravessava os portões para a calçada além da academia quando identificou uma figura familiar recostada no poste torto de luz a pouca distância da cercania elevada.

O sorriso morno e inesperado de Rory foi uma surpresa bem-vinda depois de tantas horas indiferentes de conversas unilaterais com Doc, olhares desconfiados de Aaron e múltiplas ausências de Madge. A essa altura, ele já tinha se habituado à loucura e decidido agir como se não visse o absurdo de toda aquela situação sempre que precisava encarar a Undersee como se um dia não tivesse quase se matado por ela.

- Finalmente. Pensei que fosse dormir aqui te esperando – brincou Rory, ajeitando o aro dos óculos sobre a ponte do nariz reto. – Tão pegando pesado com você aqui embaixo quase tanto quanto pegam ali em cima, hein?

Lá em cima era a maneira como os habitantes daquela região se referiam ao complexo militar, sitiado no topo mais alto da cadeia montanhosa que dividia o distrito em uma série de setores distantes.

- Também não via a hora de acabar – admitiu Gale. - O que está fazendo aqui, aconteceu alguma coisa?

- Ei, ei, gavião, calma. Está tudo bem. Não posso apenas querer dar checada no meu irmão mais velho, ver como ele está?

Um olhar de descrença bastou para fazer Rory rir, gesticulando a mão em sinal de descaso.

- Ah, está bem. Não é nada demais, na verdade. Por coincidência, Posy tem um amiguinho na escola que é criado por um cara que tá trabalhando aqui com você. E aí ontem...

Antes que Rory terminasse de se explicar, um ágil furão albino surgiu brincando no espaço entre os dois, rodopiando entre suas pernas e depois voltando para o ponto de onde viera apenas segundos antes de alguém se aproximar aos tropeços.

- Rory?

Parando subitamente de andar, Doc deixou os braços amplamente tatuados penderem ao lado de seu corpo esguio, indiferentes aos movimentos que o velho furão albino parecia fazer para chamar sua atenção, mordiscando seus tênis surrados. Depois da aparente surpresa, ele abriu um sorriso que Gale não tinha visto antes.

- Ah, e aí, Jay? – Rory cumprimentou um pouco sem jeito, dirigindo-se ao rapaz e estendendo a mão com a cordialidade habitual que apenas velhos conhecidos compartilhavam. – Era você mesmo que eu tava procurando.