EllieTrês horas.
Já se passaram quase três horas e minha mente ainda continua nublada.
Parece que estou perambulando por um cômodo completamente escuro, procurando os interruptores de luz.
— Você está bem? — Pergunta Daisy.
Faz vários segundos que estou a encarando, tentando reconhecer alguma familiaridade no rosto que aparentemente deveria ser o mais familiar de todos para mim.
Nada.
Ela olha para sua carteira, e o cabelo loiro escuro e grosso cai entre nós duas. Quero dar uma olhada melhor nela. Preciso que algo me desperte, algo familiar. Quero prever uma marca de nascença ou uma pinta mesmo antes de vê-la, porque preciso de alguma coisa reconhecível. Vou me agarrar a qualquer parte dela que me convença de que não estou completamente louca.
Ela ergue a mão finalmente e põe o cabelo atrás da orelha. Ela me observa com os olhos azuis arregalados, que me são completamente desconhecidos. A ruga entre a sobrancelha fica mais profunda, e ela começa a morder o dedão.
Está preocupada comigo. Talvez com nós duas.
Nós duas.
Tenho vontade de perguntar se ela sabe o que pode ter acontecido comigo, mas não quero assustá-la. Como explico que não a conheço? Como explico isso para qualquer pessoa? Passei as ultimas três horas tentando agir normalmente. No início me convenci de que devia ter usado alguma substância ilegal que me fez apagar, mas isso é diferente. Não é como estar chapada ou bêbada, e não faço ideia de que maneira sei disso. Não me lembro de nada além das ultimas três horas.
— Ei. — Daisy estende o braço como se fosse tocar em mim, mas logo depois se afasta. — Você está bem?
Agarro a manga do meu moletom e limpo o suor da testa. Quando ela ergue o olhar para mim novamente, percebo que ainda há preocupação em seus olhos. Obrigo meus lábios a formarem um sorriso.
— Estou bem — murmuro. — Tive uma noite longa.
Assim que digo isso, eu me encolho. Não faço a mínima ideia de que tipo de noite eu tive. E se essa garota ao meu lado é realmente minha namorada, imagino que uma frase como essa provavelmente não vai deixá-la muito tranquila.
Percebo seu olho tremer sutilmente, e então ela inclina a cabeça lentamente para o lado.
— Por que teve uma noite longa?
Merda.
— Ellie — chama alguém na frente da sala. Olho para em direção a voz. — Nada de conversa — diz a professora.
Ela retoma a aula, sem se preocupar muito com a minha reação por ter sido chamada à atenção. Olho de relance outra vez para Daisy e logo em seguida fixo o olhar em minha carteira.
Daisy ainda está me encarando, mas não consigo olhar de volta para ela. Viro a palma da mão para cima e passo os dedos nos calos que encontro.
Eu trabalho? Talvez aparo a grama dos vizinhos para me sustentar. Toco algum instrumento?
Talvez seja do futebol. Durante o almoço, decidi aproveitar o tempo para observar todos ao meu redor, e descobri que tenho treino de futebol feminino à tarde. Não faço ideia do horário nem do local, mas de algum jeito consegui sobreviver nas últimas horas sem saber onde eu deveria estar a cada momento.
Talvez eu não tenha nenhuma lembrança no momento, mas estou aprendendo que sei fingir muito bem. Talvez bem até demais.
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INERENTE; ellie williams
RomansaMelhores amigas desde a infância. Apaixonadas desde a adolescência. Desconhecidas desde essa manhã. Todas as recordações desapareceram... Ellie e Daisy precisam trabalhar juntas para descobrir a verdade sobre o que aconteceu com elas e o porquê. Por...