Capítulo Dez

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Yunah se sentia melhor após a medicação.

Alguns minutos de soro, sono e analgésicos, parecia o combo perfeito para se sentir revigorada.
Fisicamente, já estava pronta para outra. Mentalmente, queria ser enterrada no jardim do hospital, tamanha era a vergonha que sentia.

Odiava movimentar as pessoas por problemas que eram seus e, principalmente, odiava se sentir dependente como esteve há algumas horas.
Apesar de não ter consciência de como tudo aconteceu, se lembrava de ver seu paciente correndo para segurá-la antes de desmaiar e - infelizmente - se lembrava exatamente de como estava amparada por ele quando acordou.

Estava em seu colo ao despertar. Perto demais, diga-se de passagem.
Ficou desacordada nas mãos de um paciente. O quanto aquilo era errado e até mesmo perigoso?

De certa forma, quando retomou a consciência e se viu sob os cuidados de Yoongi, não teve medo. Sabia do histórico e tinha plena consciência de que não deveria se deixar levar por uma única boa atitude.
Mas ver suas íris tão de perto, e as expressões de preocupação em seu rosto tão evidentes, não conseguia evitar a sensação de... Segurança.

Era completamente estranho pensar assim, mas sentiu certo alívio quando o viu cuidando de si. Talvez fosse o tempo morando sozinha, tendo que se virar em sua vida adulta, ou a tpm, mas se sentiu protegida.

"Protegida por um assassino?" seu subconsciente gritou.

A luta interna travada em sua mente poderia fazê-la ficar zonza.
Sentiu-se acolhida e isso não podia negar, precisava agradecê-lo na próxima consulta. Mas não conseguia se desprender de tudo que havia aprendido sobre ele. Era inevitável.

Todos os laudos, provas escritas de tudo o que havia acontecido, todo o desenrolar confuso da história, falavam mais alto que qualquer sensação que pudesse, erroneamente, ter sentido.
Ainda não entendia como Eun-ji havia conseguido desligar seu lado racional diante todos os fatos, mas definitivamente, não tinha racionalidade para tal.

Se lembrava perfeitamente das falas de sua chefe "você é médica, não advogada", e tentava manter isso em letras neon em sua mente, mas não conseguia separar. E não sentia que conseguiria tão cedo, perante todo o silêncio e esquiva do seu paciente.

Decidindo espairecer um pouco desses pensamentos que lhe rodeavam à mente, resolveu retornar para sua sala e pegar suas coisas para retornar ao dormitório. Havia se acostumado com o local e nem morta voltaria para casa, sozinha, após o susto do desmaio.

Dormiria mais uma noite por ali.

Andou pelo corredor da enfermaria, até avistar o corredor de sua sala provisória.
Seus pés, no entanto, fixaram no chão com a visão à sua frente.

Um pouco mais distante de onde estava, no fim do corredor, mais precisamente em frente ao consultório, estava Min Yoongi sentado com a cabeça jogada para trás, apoiada na parede, e com os olhos fechados.

As mãos nos bolsos e a postura imóvel, sugeriram a ela que ele estava dormindo.
Se questionou milhões de coisas, desde 'será que ele está aqui desde o ocorrido?', até 'será que entrei em coma e acordei pra nossa consulta da outra semana?'. E nenhuma das questões pareciam coerentes.

Independente da razão de estar ali, não esperava vê-lo tão cedo, tanto que nem sequer se preparou para pedir desculpas pela cena e agradecer. Não tinha tanta facilidade com isso e planejava encontrar a melhor forma de engolir o orgulho, durante a semana.
Encontrá-lo ali, havia acabado com todo seu planejamento. Então, resolveu contar com a sorte e caminhar pé ante pé até a sala, para não acordá-lo.

Yoongi, no entanto, estava acordado e percebeu a presença da médica sem sequer abrir os olhos.

- Bom ver cores no seu rosto de novo, doutora. - Exclamou vendo a morena virar para ele, com a mão na altura do coração, devido ao espanto.

- Quer me matar de susto, Sr. Min? - Yunah recebeu um riso de lado soprado. - Achei que estivesse dormindo. Está tarde, não devia estar no dormitório?

- Não. Eu só... - Pigarreou. - Eu achei melhor esperar. Você demorou bastante, comecei a pensar que pudesse ser algo grave. Só quis ver com os meus próprios olhos se estava tudo bem.

Yoongi comprimiu os lábios, um pouco sem graça por sua fala e se levantou. Não soube encontrar as melhores formas de se expressar, não teve tempo para isso, então acabou falando exatamente o motivo por estar ali. Mas, tão logo percebeu, quis fugir.

Yunah, por sua vez, ficou sem saber o que dizer. Tão pouco soube explicar o coração, de repente, batendo tão apressadamente em seu peito.

- Ah, é... - Engoliu em seco. - Está tudo bem, foi só uma queda de pressão por causa da dor intensa. - Yoongi assentiu, suavemente, olhando nos olhos de Yunah, como se estivesse buscando algum resquício de mentiras em sua fala e, com isso, um silêncio ensurdecedor pairou sobre eles. - A propósito, obrigada. Você sabe, por me ajudar. - Decidiu quebrar o silêncio. - Podia ter batido a cabeça no chão com a queda, então, obrigada mesmo. E me desculpa por não tê-lo atendido, não queria ter desperdiçado o dia que veio espontaneamente para a consulta. Podemos remarcar para amanhã, meia hora, se concordar.

- Podemos. - Respondeu, sem pensar, imediatamente. "Como assim, podemos?" sua mente gritou, mas resolveu ignorá-la. - Mas dessa vez não vou aparecer por aqui de supetão, para evitar que desmaie de tanta alegria com minha presença.

E lá estava o Yoongi que Yunah havia conhecido: o sarcástico, cheio de piadinhas.
Assim era melhor. Dessa forma, sempre manteria os pés no chão quanto a personalidade de seu paciente.

- Muito engraçado! - Forçou um riso, propositalmente, fazendo Yoongi sorrir satisfeito. - Agora que sabe o caminho, suponho que não precise de babá para buscá-lo certo? Amanhã, aqui mesmo, às nove, Sr. Min.

O mais alto franziu o cenho, semicerrando os olhos e sorrindo de lado.

- Então é do tipo que gosta de mandar? - Gargalhou, vendo a boca de Yunah formar um perfeito "O" em espanto, apenas para se virar para o lado oposto do corredor e seguir seu caminho de volta para o quarto. - Não fique muito ansiosa esperando muito por mim, doutora.

E assim, a médica viu o homem se distanciar com as mãos no bolso, andando despreocupadamente, como se não tivesse dito nada demais.

Definitivamente, aquele Min Yoongi estava de volta.

***

No dia seguinte, Yunah não esperou por seu paciente. Não foi preciso. Às 8:58 ouviu o toque à porta e a figura de Yoongi passando por ela.

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