UM

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21 de Outubro de 2023

O relógio desperta às seis, mas Jungkook já está acordado. Dormir tem sido uma tarefa difícil desde que Jimin parou de responder suas mensagens e não retornou suas ligações. Mas ele tinha razões para não fazê-los. Há meses tinham se tornado ex noivos, já não tinha mais direito nenhum de receber resposta ou coisa parecida. Só que faz falta, sabe? Foram seis anos de relacionamento, não é algo que se esqueça da noite pro dia. Às vezes Jungkook se pergunta se Jimin também está sofrendo com o término. Se chorou alguma vez ou disse que ele também fazia falta. Seria egoísmo demais pensar assim? Não foi o melhor noivo, mas fez o que pôde para manter a relação de pé, mas será que estava fazendo tudo errado? Onde errou? Por que Jimin simplesmente apareceu um dia e disse que não queria mais se casar? O que Jungkook não estava enxergando? Tantas perguntas...

O telefone toca sobre a mesa de cabeceira. Nem se preocupa em atender. Personalizou um toque para cada contato importante e aquele é o do CEO, certamente está querendo falar sobre a reunião de acionistas que está para acontecer às oito. Jungkook é um dos diretores executivos, o mais jovem, e braço direito de Namjoon. São melhores amigos que cresceram juntos e abriram uma gravadora, estão querendo lançar o primeiro girl group da companhia e precisam estabelecer algumas coisas. Soltou um longo suspiro e sorveu o resto do café, deixando a xícara sobre a penteadeira ao se obrigar a ir para o banheiro. O banho é gelado, não tem ânimo nem para mudar a temperatura. Sai tremendo de frio, se enxuga rápido e se envolve no roupão felpudo. O de Jimin ainda está pendurado na parede. Não só isso, mas as coisas na casa ainda estão em par. Duas escovas de dente, duas toalhas, duas canecas personalizadas, duas pantufas de casal, dois pijamas combinando... Parece errado se desfazer de tudo isso. No fundo tem esperança de que ele volte.

Encarando o próprio rosto no espelho sente que envelheceu uns dez anos com aquela barba por fazer e decide se livrar dela. Não sente satisfação, mas só de saber que não vai mais ouvir Namjoon falando que parece desleixado já vale a pena. O cabelo precisa de corte, isso faz com que envie uma mensagem à secretária Lee, pedindo que marque um horário no barbeiro. Escolhe o terno preto que chegou da lavanderia no dia anterior, ao invés da famosa camisa branca, decide colocar uma turtleneck cinza. Jimin gostava quando usava roupa daquele estilo. O relógio da Cartier prata enfeita o punho e o cordão contendo as duas alianças é escondido por dentro da gola. Outro suspiro, mais curto que o anterior, seguido de um pequeno sorriso para a imagem refletida no espelho que reveste uma parede inteira.

Por fim, a maleta. Namjoon liga novamente, dessa vez atende dizendo que já está indo, desligando antes que o amigo possa dizer mais alguma coisa. Jungkook não usa perfumes, apenas desodorante, por um segundo pensou ter esquecido de passar, mas lembra que fez isso logo após cuidar da barba. Solta uma pequena risada sem motivo, descendo as escadas. Recusa o café oferecido pela governanta, indo direto para o carro que o aguarda na entrada da casa. Dá bom dia ao chofer e pede que o leve até a empresa. BE!YOUTH Company. A viagem é curta e silenciosa. Já não tem mais ânimo para falar sobre qualquer coisa, os dias não têm sido bons.

— Senhor, há jornalistas na porta da frente. — Alerta o chofer. Jungkook ergue o olhar, franzindo o cenho, como odiava esse tipo de gente. — Devo ir pelos fundos novamente?

Jungkook apenas acena positivamente. Desde o término vem evitando qualquer contato a mídia, normalmente é ele quem faz algum anúncio da empresa ou aparece em vlogs do grupo debutado ou de trainees, mas prefere que outro esteja em seu lugar pois não quer responder nada sobre o assunto.

— Me diz que você dormiu pra eu não ter que socar a sua cara. — O CEO fala ao receber o amigo no elevador dos fundos.

— Se quiser que eu minta, tudo bem. Do contrário, pode bater. — Responde o diretor executivo, virando o rosto.

— Você ainda vai acabar adoecendo. — Namjoon diz, visivelmente preocupado. — Seis meses. Não acha que está na hora de começar a seguir em frente? — Aperta o botão do oitavo andar, onde fica a sala de reunião. — Vante disse ao Jin que ele trocou de número, vendeu o apartamento e saiu do país.

As palavras pesam. Jungkook sente que vai desmaiar a qualquer momento, não sabe se é pela falta de comida ou nervosismo por entender que nunca mais irá ver a pessoa que ama. Tudo gira, ele se apoia na parede metálica, respirando fundo. Não pode chorar agora, não na frente dele. Ergue a cabeça e encara o teto, um... dois... três... Namjoon está ocupado com uma ligação, que bom. O corpo dói, há uma mão apertando sua garganta, outras tantas desferindo socos fortes em sua barriga, quer vomitar. Mas precisa se recompor quando as portas abrem. Namjoon dá uma batidinha em seu ombro, retribui com um sorriso e o segue.

Cumprimenta todos os que já estão presentes, esboça um pequeno sorriso, se senta na cadeira do lado direito ao presidente. Recusa o café e aceita a água, a garganta seca o faz virar o copo todo de uma vez. A boca amarga. Agradece à funcionária, "ela deve ser novata", pensa.

— Ei, diga lá embaixo para que lavem os copos direitos, ok? — Sussurra ao que ela se aproxima, colocando o copo na bandeja. Ela sorri e diz que irá transmitir o recado.

Logo a reunião começa. Seu corpo está presente, mas a mente viaja, não uma nem duas, diversas vezes. Vai até Jimin, até o dia em que, naquela mesma sala, o pediu em casamento quando ele apareceu trazendo mochis, tinha comprado um pouco a mais do que podia na cafeteria. Ah, sim, Jimin trabalhava na empresa, era coreógrafo.

Sempre que assiste a qualquer apresentação de 5OUL (Soul) se lembra do loiro, ele está em cada passo, em cada movimento. Lembra das noites em que ficou até mais tarde na empresa apenas esperando o ensaio terminar e depois saíam para comer em qualquer barraquinha que encontravam aberta ou se arriscavam a cozinhar algo ainda que fossem ruins nisso. Quando foi que tudo começou a dar errado?

Marca vinte pras onze quando a reunião acaba. Os acionistas e diretores decidem onde vão almoçar, Jungkook agradece o convite e se retira da sala, indo até a sua, no nono andar. Secretária Lee avisa que o barbeiro está marcado para as três, ele agradece e bate a porta. Quer ficar sozinho. E chorar.

Chora tudo que precisa. Mas já não sabe se é de tristeza ou de confusão por não conseguir saber em que ponto as coisas começaram a desandar. A partir de que momento? Por que não conseguia ver? O que o cegava tanto?... Se pudesse voltar no tempo prestaria mais atenção nos detalhes. De repente, boceja. O choro trouxe o sono que há muito não o visita. O próximo compromisso é às três, dá tempo de cochilar. Ele tira o paletó e o relógio, os deixando sobre a mesa de centro, retira os sapatos com os próprios pés e deita no sofá. Nem bem encosta a cabeça na almofada, é embalado por um sono pesado.

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O alarme despertou às seis da manhã. O garoto se revirou na cama, resmungando coisas inaudíveis, tateando a mesa de cabeceira à procura do aparelho. Se esticou, ainda embaixo das cobertas, gemendo preguiçoso. A cabeça atingiu algo ao se sentar no colchão. Uma beliche? Ele se levantou esfregando a parte atingida, coçando os olhos com a mão livre. Um grito ficou preso na garganta. Aquele lugar... Era tão familiar.

A porta do quarto abriu, o vapor do banho quente adentrando o cômodo pequeno. Quase caiu para trás quando reconheceu o garoto que surgiu de toalha na sua frente. O cabelo verde, o piercing na sobrancelha direita e na boca, a tatuagem recém feita cobrindo todo o ombro esquerdo e peitoral. Kim Namjoon aos 23 anos, não tinha dúvidas, ele usava um estilo mais descolado por causa da banda. Sem deixar que o rapaz proferisse alguma palavra, correu para dentro do banheiro, fechando a porta atrás de si.

Usando uma toalha limpou o espelho embaçado, finalmente deixando escapar o grito preso na garganta. Tateou o próprio rosto, apertando a própria bochecha e dando tapas para acreditar se era real. Doía, então não era sonho. Que dia era? Voltou ao quarto desesperado.

— Um calendário. Onde tem um calendário? — Perguntou ao amigo que apontou para a parede da escrivaninha.

21 de Março de 2018.

Jungkook havia voltado no tempo.
5 anos atrás, no início da faculdade.
Um dia antes de conhecer Jimin.

Uma segunda chance | JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora