Capítulo 1 - A música que virou barulho.

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Suas mãos tremiam. Seus braços estavam encolhidos e apertados contra o corpo. Seus lábios, já roxos, tiritavam pelo frio.
Estava escuro, ele era incapaz de identificar sua localização no mundo. Via-se apenas inúmeras árvores; árvores que tocavam o céu com seus longos galhos e copas. Ele não via as estrelas da noite, a vegetação cobria o céu, assim como uma floresta densa deve ser.
Ele buscava o céu, almejava-o, mas seus olhos estavam voltados para a terra, via apenas a grama, desconfortável e pontiaguda sob seu corpo.
Ele estava sentado, encolhido com as costas apoiadas em um grande tronco. No ar, o cheiro de uma fogueira apagada reinava, porém, não haviam restos de madeira visíveis.

Ah, como ele queria o fogo neste momento!

Fazia tanto frio! Seus braços estavam nus e seu coração rogava por abrigo.
Ele estava perdido, onde estava?
Olhava por todos os lados mas a paisagem era igual e repetida. Sempre repetida.
Até que...

Escutou-se um uivo de um lobo.
Aquele som assustador transpassou por seus ouvidos e, ao ser decodificado por seu cérebro, surgiu-se a sensação de perigo.
Seus olhos arregalaram, seu corpo tremente levantava vagarosamente a fim de fugir do uivo, mais especificamente, de seu dono.
O uivo continuava, e ficava mais forte.
Porém o barulho vinha de todas as partes, não sabia de onde o canto amargo surgia, o canto da morte. Corria para todos os lados, direita e esquerda e nada! A paisagem era igual por todos os lugares, o frio e o vento gélido cortavam sua face, uma face amedrontada pela morte.

Logo, as melodias obscuras multiplicaram-se, parecia uma alcatéia.

Seu coração batia rápido, sua respiração era pesada e forte, certamente estava já exausto mas seu corpo obrigava-o a correr por sua vida. Até que o ar faltou-lhe nas narinas.

Ele parou.

Colocando as mãos sobre os joelhos ele respirava fundo, sentia seu corpo inteiro pulsando.
Até que... ao olhar para trás... pôde ver entre a escuridão das árvores, dois olhos amarelos que cintilavam, como duas jóias na negrura da noite.
Ele paralisou, ficou estático. Parou de respirar e se mover. Seu coração gritava para ele correr, todavia, o cérebro não atendeu esse chamado. Seu corpo permaneceu imóvel.
Os olhos amarelos chegaram mais perto e, com eles, mostraram -se dentes longos e afiados de uma fera. Gotas de saliva pingavam da boca do animal e ele rugia lentamente em direção a sua presa. Revelou-se um corpo todo negro, pelos embaraçados e espetados, unhas afiadas e olhos fixos que hipnotizavam.
O jovem dava pequenos passos para trás, tentando, em vão, fugir do lobo, mas ele sabia que era inútil.
Até que... o lobo deu um salto em cima dele, rugindo, uivando e usando suas garras a seu favor. O menino soltou um grito lascinante e caiu no chão ao ataque do animal.
O lobo arranhava seu corpo inteiro, cortando sua pele e arrancando sangue de dentro dela. Ele, desesperado, gritava e chorava de dor e medo.
A fera abriu a boca e, enfim, abocanhou por completo seu rosto.

Tudo estava escuro.

Até que ele, num salto, como se tivesse tomado um choque elétrico, acordou.

Silêncio.

Ele estava deitado no sofá de seu camarim, no seu corpo, haviam três garrafas de bebidas alcoólicas diversas; já, no chão, mais dez, todas vazias.
Sua cabeça doía e latejava. Olhou em volta, havia caixas de som, microfones e fios espalhados pelo chão, restos de pizzas e hambúrgueres por toda parte. Sua guitarra estava apoiada em uma parede ao lado e sua camisa estava levemente molhada, talvez pelo seu suor.
Até que ele escutou três batidas frenéticas e pesadas na porta do camarim.
- Nicholas! - gritava a voz de um homem - Nicholas! Abre essa porta!
Nicholas, então, sentou-se no sofá. Levou seus dedos nas têmporas pela dor que lhe causavam. Ele reconheceu a voz do homem, era seu baterista, Martim.
Nicholas levantou vagarosamente e se dirigiu até a porta para destrancá-la, assim feito, girou a maçaneta e viu o rosto do amigo.
Martim era um baterista talentoso, jovem e forte, possuía músculos definidos pelo corpo inteiro, além de seu braço esquerdo ser fechado de tatuagens, tinha piercings e as pontas do cabelo pintadas de vermelho.
Quando Nicholas abriu a porta, Martim levantou as duas sobrancelhas, arregalando os olhos.
- E aí? Você está achando que está onde? Na praia? - ele dizia gesticulando exageradamente enquanto segurava as baquetas de sua bateria em uma das mãos - Nicholas, nós temos que entrar no palco em 15 minutos!
Nicholas respirou fundo e abaixou os ombros. Seus olhos estavam perdidos e, de certa forma, pediam por ajuda.
Martim notou seus gestos e raciocínio lentos, olhou de soslaio para dentro do quarto e pôde ver as diversas garrafas jogadas ao chão.
Então, Martim pronunciou, sussurrando desta vez:
- Você voltou com o álcool? De novo?
E revirou os olhos enquanto empurrava Nicholas para dentro do camarim e fechava a porta atrás deles.
- Eu não acredito... Esse é um dos nossos shows mais importantes e você simplesmente está bêbado! Você tinha parado, Nicholas! Você estava conseguindo, o que aconteceu??
Nicholas olhava lentamente para os lados. Suas pálpebras estavam caídas e seus lábios entreabertos, como se não tivesse força para fechá-los. Então, repentinamente, Nicholas levou suas duas mãos para a barriga e apertou-as levemente.
- Nossa... - disse - eu preciso muito mijar.
Martim suspirou fundo, passando as mãos pelos cabelos.
- Eu não acredito... Vai logo no banheiro que a gente precisa entrar do palco de qualquer jeito!
Nicholas obedeceu. Virou -se e foi até um banheiro existente dentro do próprio camarim, sem nem mesmo fechar a porta. Ao chegar no vaso, percebeu que Martim observava-o. Nicholas sentiu-se ligeiramente desconfortável e então, estendeu o braço para ligar a torneira da pia.

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