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Chuuya Nakahara estava súbita e espantosamente ao lado de Dazai.
Os olhos azuis mais vivos do que uma criatura semi-morta deveria ser capaz de ter. Ele esquadrinhou o corpo de Dazai e encarou o braço direito, onde sangue encharcava as bandagens.
Dazai esperou a perda de controle. As veias inchando. As presas. O rosnado. Seria comum para um vampiro novato, diante de tanto sangue. No entanto, mais uma vez provando que podia surpreendê-lo, Nakahara tirou os olhos do ferimento apenas para checar o rosto dele, procurando por alguma coisa. Talvez uma careta de dor. Ou medo.
Dazai suspirou.
"Faz parte do trabalho." — respondeu com um sorrisinho tranquilo — "Comprando poções para ajudar no crescimento?"
Nakahara não disse nada por um bom tempo. Observou Dazai puxar a manga do casaco e cobrir as bandagens sujas. Sem dar indícios de que as trocaria.
"Não sou tão mais baixo que você." — rebateu, por fim, aceitando a dica de não insistir no assunto.
"Se é nisso que gosta de acreditar." — Dazai provocou.
Os dois saíram caminhando pelo Mercado Oculto. Entre barracas de um carmim vivo e as pequenas chamas azuladas que flutuavam acima da cabeça dos compradores, Nakahara seguiu os passos de Dazai, mantendo-se sempre no seu lado direito.
"Já fiz o que precisava." — disse Dazai — "Podemos ir quando você preferir."
"Eu..." — as palavras de Nakahara ficaram presas, interrompidas por uma melodia.
Era obra de uma flauta. No fim da rua, sentado num tapete no chão, um jovem moço soprava seu instrumento. O som era delicado. Mas ele não era o foco da comoção que se iniciava.
Havia um tablado circular. Todo enfeitado com peônias desabrochando em tempo real e fitas de seda. E no topo, um cisne negro. A ave rodopiou e voou alguns metros acima do chão. Cabeças se ergueram para não perder nada do espetáculo.
O cisne abriu as asas no máximo de seu tamanho. As penas de um lindo preto lustroso. E quando voltou a pousar no tablado, era agora uma bela mulher de pele negra, dançando no ritmo da flauta, equilibrada na ponta dos pés. Metamorfose.
Maravilhado com a transformação e a dança, Nakahara puxou Dazai e os dois se juntaram à pequena plateia.
O vestido de armação volumosa, a seda de um azul-cobalto cintilante. O grupo ao redor soltava "oohs" e "aahs" em apreciação.
Vagamente, Dazai notou uma mão em seu bolso. Furtos não eram nenhuma surpresa no mercado. Devido às aparências paranormais, muitos faziam parte dos marginalizados da cidade, sem conseguir arranjar emprego com os Mundanos.
Dazai levou o total de um segundo para compreender a situação e se virar e talvez conseguir enxergar o rosto do ladrão, quando um uivo de pânico ecoou no ar.
O sujeito já estava estatelado no chão, a bota de Nakahara na garganta e a carteira de Dazai na mão enluvada de Nakahara.
Ainda havia o zumbido constante do mercado, mas o círculo em torno deles se calou. Curiosos com a cena.
"Está tudo bem. Ninguém se machucou." — Dazai anunciou, então se inclinou para baixo e sussurrou para Nakahara — "O pobre menino precisa respirar."
Nakahara ergueu a bota mas não permitiu que o sujeito corresse. O agarrou pela gola da camisa e ergueu como se ergue um saco de rabanetes. A multidão que tinha se reunido, desapontada por não presenciar sangue, voltou aos próprios afazeres, desinteressados.
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What The Dead Whisper
Hayran KurguNa Era Vitoriana, Osamu Dazai é um assassino de aluguel. Quando seu mais novo trabalho o leva de volta à sua cidade natal, ele conhece Chuuya Nakahara, um vampiro novato que busca vingança contra o tão famoso Vampiro Demônio. Em uma história de mist...