Prólogo

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Puxou Jamie, em completo desespero, pela decima vez quando o pequeno garoto tropeçou nas próprias pernas quase levando ambos ao chão. O choro e soluços altos eram acompanhados pelo som dos galhos e folhas sendo esmagados e se partindo sob seus pés descalços enquanto se embrenhavam cada vez mais dentro da densa mata.

Seu coração batia forte em seus ouvidos, o ar mal entrava em seus pulmões conforme mantinha a mão presa firmemente na do irmão. Ele lutava entre as lagrimas para acompanha-la em sua corrida desenfreada entre as arvores e arbustos, tentando ao máximo desviar dos galhos baixos, mas seus rostos infantis, braços e pernas já acumulavam uma quantidade absurda de cortes devido aos galhos que lhes atingia a pele como laminas com tanta força que fazia os olhos de Bonnie lacrimejar.

Não podia parar de correr, mesmo que seus pés sangrassem e seus pijamas se rasgassem por completo ao se prenderem as arvores altas e ásperas, ela não podia parar, porque as botas pesadas ficavam a cada segundo mais próximas, os assovios divertidos eram cada vez mais altos e as risadas lançavam calafrios por sua coluna.

Camuflados no breu assustador, Bonnie sabia que eles estavam perto demais. Jamie soluçou se atrapalhando nas folhas caídas, as pequenas pernas eram curtas demais para acompanha-la floresta a dentro. Sua mãos suava o que a obrigava a se agarrar com mais força a ele, não perderia mais ninguém aquela noite.

Não enxergava absolutamente nada, a única luz no lugar estava distante demais para fazer alguma diferença ali. As chamas que consumiam sua casa mesmo altas não eram o suficiente para iluminar a floresta, não existia um caminho para seguir. tudo o que podia fazer era obedecer o ultimo pedido da sua mãe e correr, sem rumo, implorando para que os homens fossem embora e os deixasse em paz.

O terror se misturava com a tristeza e a raiva, sua mãe e avó queimavam dentro daquela casa naquele momento, estavam presas e morrendo... mas havia um conforto em estar perdida entre as arvores: estava longe o bastante e não podia mais ouvir os gritos delas.

Ela olhou para trás, buscando ver algo através da escuridão, talvez saber com certeza onde eles estavam, mas era como fugir de fantasmas.

Seus joelhos cederam quando tropeçou em uma raiz, rolando no chão macio e húmido de terra e folhas levando Jamie consigo, Bonnie apertou os dentes para não gritar com a dor violenta que aqueceu seu tornozelo. Jamie resmungou chorando mais vigorosamente ainda, enchendo Bonnie com desperto de não ser pega. Tateou a escuridão com a mão livre se arrastando na lama até sentir o emaranhando de folhas.

Arrastou Jamie consigo para debaixo do que ela jurava ser um arbusto denso, rezando para que estivesse certa. Se encolheu sob as folhas trazendo Jamie pra entre suas pernas e envolvendo o pequeno corpo com seus braços em um abraço que deveria ser tranquilizante, mas ambos tremiam demais, tanto pelo frio quanto pelo medo.

— Eles já vão embora, mas precisa ficar quieto. — Pediu em um sussurro contra o ouvido do irmão mais novo que soluçava em completo descontrole. Bonnie tentou secar as lagrimas dele, era inútil pois mais desciam, assim como as suas próprias.

Sua respiração estava pesada devido a corrida longa, os pequenos cortes em seu corpo ardiam e seus pés sangravam, mas Bonnie não se importou com nada daquilo quando abraçou o irmão com mais força.

Sua avó sempre dizia que em momentos de dificuldade Deus ajudava seus filhos, ela também dizia que todos eram filhos dele, então Bonnie pediu com todas as suas forças, abraçada a Jamie de apenas 4 anos, implorou para que Deus os ajudasse. 

Quando os passos se tornaram mais próximos, mais lentos até parar, Bonnie prendeu o ar em seus pulmões e em um ato desesperado pressionou a mão contra os lábios de Jamie para tentar abafar os soluços do garoto. 

Lagrimas quentes molhavam sua mão quando mãos pequenas envolveram seu pulso enquanto suas próprias lagrimas encharcavam suas bochechas.

Ela queria sua mãe, queria acordar e descobrir que aquilo não era nada além de um pesadelo. Queria descobrir que era tudo fruto da sua imaginação e que quando acordasse sua mãe e avó estariam na cozinha preparando o café da manhã, como faziam todos os dias.

Jamie estremeceu em seus braços quando algo se moveu ao redor do arbusto e um estalar ecoou alto.

— Coelhinhos, eu sei que estão por aqui, eu vi vocês. — A voz grave cantarolou cortando a noite e congelando o sangue dela.

Bonnie apertou Jamie mais contra si sentindo seus lábios tremerem contra sua palma.

— Vamos lá, apareçam. O titio só quer brincar um pouquinho com vocês. — assobiou. O som das botas se afastando um pouco sendo seguida por mais outra, Bonnie soube então que eram dois deles.

— Porra! está muito frio aqui. — outra voz resmungou. — vamos embora logo.

O primeiro estalou a língua em desaprovação.

— Pare de chorar, ordens são ordens. Quando acabar eu mesmo pago uma puta para aquecer esse seu maldito rabo.

O homem riu de uma forma horrorosa.

Jamie se encolheu mais contra ela, buscando calor na noite fria. Aqueles homens tinha razão, o frio estava mais intenso aquela noite do que qualquer outra, estavam em pleno inverno e ambos não vestiam nada mais do que pijamas rasgados enquanto se encolhiam no solo quase congelado da floresta que rodeava sua casa.

— São crianças, Bernard! Quanto tempo acha que vão durar nessa mata? Deixar eles aqui é a mesma coisa de enfiar uma bala em suas cabeças. — Argumentou o outro.

Medo revirou seu estomago e Bonnie mordeu os lábios com muita força para segurar o choro amedrontado que se formava em sua garganta quase a sufocando. A mão de Bonnie sobre os lábios de Jamie vacilou com a perda repentina de forças e ela a afastou tremula.

— Você é a porra de um bebe, não aguenta um pouquinho de frio?

— Eu estou congelando aqui, caralho!

— Bonnie... — Jamie chamou baixo e Bonnie arregalou os olhos. — Eu quero a mamãe.

— shh... — Bonnie pediu.

Implorou mais um pouco a Deus para que eles não o tivessem ouvido, rezou sem sequer saber rezar para que eles não percebessem...

Mas Deus não estava disponível naquele momento, então suas preces não foram atendidas.

Em um momento estava olhando Jamie na escuridão e no seguinte seu cabelo havia sido agarrado e ela era arrastada para longe dele aos berros, enquanto se debatia chorando todas as lagrimas que segurou desde que presenciou sua mãe ser amarrada naquela cadeira. 

Lutou com desespero tentando se livrar da mão grande. A dor em seu couro cabeludo era insuportável, Jamie gritou e ela procurou na escuridão pelo irmão.

ela não o via, não via nada além de silhuetas e borrões, as lagrimas e os soluços escapando dela com força enquanto gritava por Jamie, tentando voltar para ele e protege-lo como sua mãe disse que deveria fazer.

Bonnie congelou imediatamente quando foi forçada a ficar de pé e algo frio se pressionou contra a pele exposta da sua barriga, o cheiro forte de cigarros a atingindo quando o homem aproximou os lábios do seu ouvido e com uma voz carregada de prazer murmurou:

— Achei você, docinho.

'NDRANGHETA - LIVRO 2: EM ANDAMENTOOnde histórias criam vida. Descubra agora