Capítulo único

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O relógio sobre a mesa de cabeceira marcava duas horas quando Hyungwon levantou-se da cama em busca dos comprimidos que usava diariamente para controlar seu sono, sem eles dormir era uma tarefa impossível, e não importava o quanto tentasse sua mente era assombrada por memórias e seus sonhos se transformavam nos mais terríveis pesadelos de modo que a única maneira de ter uma noite contínua de sono era a base de medicamentos com o único propósito de apagá-lo temporariamente dando-lhe a ilusão de que havia descansado o suficiente para enfrentar o dia.

Ele encarava o relógio, buscando forças para caminhar até o banheiro, lembrando-se do motivo exato pelo qual mantinha aquele objeto de aparência horrenda perto de si, os ponteiros eram tão antigos que o barulho que faziam era uma tortura ambulante, o aspecto de madeira antiga envernizada não combinava com nada naquele ambiente e aquilo irritava seu senso estético. Desde o princípio Hyungwon nunca foi fã daquele objeto, mas o deixava ali porque, apesar de tudo, combinava com aquele que foi seu grande amor um dia e que ainda era, porque Hyungwon sabia que um sentimento tão avassalador e intenso não era possível de ser apagado do dia para a noite, manter aquele simples objeto em meio à suas coisas era uma forma de tê-lo consigo.

- Odeio tanto o seu péssimo gosto para decoração. - Hyungwon sorriu brevemente pegando o objeto e o colocando dentro da gaveta, longe de seus olhos e ouvidos mas perto o suficiente para que pudesse se lembrar sempre de sua origem e seu significado.

A melancolia da madrugada o tomou por completo naquele instante e ele respirou fundo a fim de conter algumas lágrimas que insistiam em escapar de seus olhos. Hyungwon sabia que não seria fácil passar por aquela dor, ele tentava ser forte de todas as maneiras, buscou ajuda profissional e apoio da família e amigos sempre que houve a necessidade, mas era durante a noite que a saudade, carregada de angústia, o invadia e nesses momentos sempre estava sozinho e sabia que tinha que aprender a lidar com suas emoções.

Seis meses haviam se passado desde o ocorrido, mas ainda era tão difícil quanto nos primeiros dias. A sensação de vazio ao acordar na cama sem o outro ao seu lado todos os dias traziam um desconforto que se transformava na mais profunda tristeza, que provocava em Hyungwon crises que o faziam chorar até seus olhos arderem e seu peito apertar com a falta de ar. Com o tempo as crises se tornaram menos frequentes, mas a tristeza e a angústia continuavam perturbando-o de uma maneira que não lhe deixava outra escolha a não ser afogar seus pensamentos em trabalho durante o dia e dormir o máximo de tempo possível durante a noite para que nunca houvesse espaço para a dor em sua agenda.

Sete anos atrás Hyungwon caminhava pela praia que ficava próxima à casa de férias de seus pais, era uma noite agradável, a lua brilhava no céu e era refletida pelo mar, a orla era parcialmente iluminada por alguns quiosques de bebidas e comidas. Próximo ao local havia um pequeno parque onde crianças corriam livremente e casais trocavam olhares apaixonados, aquela visão o fez sorrir instantaneamente porque amava o brilho no olhar das pessoas apaixonadas e ansiava por um dia poder captar essa beleza em sua arte. Na areia algumas pessoas praticavam esportes e outras apenas passeavam com seus cachorros, era uma noite agitada, mas apesar da movimentação, ainda era possível ouvir o barulho das ondas do mar, ele gostava desse som porque o trazia uma paz inexplicável e foi a busca por essa sensação que o levou até ali naquele momento.

Estava irritado com uma briga que teve com os pais durante o jantar, eles insistiam para que ele fosse para uma universidade no exterior, aprender administração e assumir os negócios da família. Hyungwon, por sua vez, queria estudar artes, viajar o mundo, conhecer novas culturas e pessoas. Mesmo com apenas dezenove anos, sabia que não queria aquela vida para si, não se imaginava passando o resto de seus dias dentro de um escritório, amava pintar e desenhar, e sabia que queria viver daquilo, pouco lhe importava a fortuna que seus pais o deixariam no futuro porque sabia que não seria feliz com aquela vida corporativa tão cinzenta, enquanto isso tinha plena convicção de que a felicidade poderia ser facilmente encontrada nas cores de suas telas, ou pelo menos era naquilo que ele queria acreditar.

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