Eu estava na frente do espelho pelo que parecia uma eternidade.
Não sabia se marrom era a cor certa para se usar em um encontro, mas gostava de como acentuava minha pele, era inesperado e ficava chique. Me fazia parecer alguém interessado em ler livros antigos e visitar restaurantes veganos por diversão. Ou não. Talvez parecesse apenas alguém usando marrom.
Verifiquei meu celular apenas para constatar o óbvio de que eu estava atrasado. Dei mais uma volta no meu apartamento me certificando de que não estava esquecendo nada e finalmente saí para meu fatídico encontro às cegas.
Havia aceitado essa situação humilhante após muita insistência de uma das minhas colegas do trabalho, local onde exercia a função de assistente pessoal de um empresário do ramo da construção civil e ainda era obrigado a repensar minha vida de solteiro todo santo dia.
Melina trabalhava para um dos sócios do meu chefe no andar acima e sempre que podíamos estávamos juntos para falar mal de nossos colegas e chefes. Fui contratado após a esposa do meu, descobrir diversas traições envolvendo suas tantas assistentes pessoais ao longo dos anos.
Em um belo dia, um mês após minha formatura em história da arte (curso que não pagaria minhas contas como minha mãe adorava dizer) eu estava na recepção do prédio em que trabalhava hoje, aguardando me chamarem para uma entrevista de assistente. Foi bem estranho perceber que não era uma recrutadora de recursos humanos que estava ali e sim a esposa traída que fez questão de bater o martelo sobre de quem seria a vaga.
Foi a primeira vez que não precisei me esforçar por um emprego. Quando a mulher me viu entrar na sala com 1.60 metros de altura, claramente gay com zero masculinidade e muito diferente das modelos que o marido contratava, se deu por convencida e bateu o martelo. Consegui a vaga imediatamente após algumas perguntas sobre disponibilidade e meu nível de inglês.
Agora lá estava eu de novo, mas dessa vez tentando outra vaga, a de ser um possível objeto de desejo para algum desconhecido.
Por insistência de Melina, me cadastrei em um aplicativo que prometia te ajudar a fazer conexões profundas e divertidas ao proporcionar encontro às escuras. Basicamente, você respondia um questionário sobre seus interesses, como música, vida social e até algumas perguntas mais esquisitas como medo de escuro e viagens sozinhos, o que me fez pensar se não estava em algum tipo de rede criminosa de psicopatas tentando encontrar suas próximas vítimas.
Continuei com a experiência mesmo não sabendo se era tão seguro, apenas ouvindo que conhecidos da minha colega de trabalho tinham feito e havia dado certo, ela no caso, não poderia saber pois estava casada há cinco longos anos com o marido que conheceu no metrô e planejavam agora financiar o próprio apartamento.
Recebi após uma semana do envio do meu questionário, uma combinação de nomes de pretendentes que tinham os mesmos interesses que os meus ou que eram compatíveis comigo. Bastava escolher uma das fichas que constavam os nomes dos homens com suas respectivas idades (acredito que para evitar situações constrangedoras com homens que já viveram longos anos) e um dos cupidos do aplicativo faria a ponte para marcar a data e o local do encontro.
Escolhi aleatoriamente, William de 31 anos que não conseguia nem ao menos imaginar como era de aparência física ou o sobrenome para um pesquisa rápida na internet, mas que pela idade, poderia ser um homem maduro vivendo uma fase mais séria que a minha aos 26. Recebi no mesmo dia, um e-mail confirmando uma reserva para dois em um restaurante caro para o próximo fim de semana. E de repente, tinha um encontro marcado com um completo desconhecido.
Me dei conta do nervosismo e ansiedade quando fiquei apertando o botão do elevador do meu prédio por tempo demais, era só um encontro, não precisava ficar tão atônito. Se fosse ruim poderia inventar que minha mãe havia caído no chão do banheiro e precisava ser socorrida. Sempre funcionava.
YOU ARE READING
Perfeito Estranho
Mystery / ThrillerAllie Mendes foi a um encontro às cegas pela primeira vez. O herdeiro William Hernani também. Tudo estava perfeito, o homem parecia um modelo de comercial de barbear, o restaurante caro, beijos quentes na rua de despedida, até que um desaparecimento...