Depois.

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Para Ry,
por ter me ajudado durante todo o processo de escrita e ter lido as quinhentas versões diferentes que eu escrevi.

"Depois de sonhar tantos anos..."

O soar de uma doce voz feminina passou a ser emitido pela vitrola retrô, localizada em uma das prateleiras de Anita. "Que música é essa?" ela se perguntou, reconhecia o ritmo, mas não conseguia identificar exatamente qual melodia era aquela, nem lembrava qual disco de vinil havia escolhido, mas se deixou aproveitar a nova descoberta.

A mulher sempre fora muito observadora, prestar atenção nas letras das músicas que ouvia já era natural, mesmo que estivesse fazendo outras coisas. No caso, estava limpando seu quarto, uma tarefa comum em um domingo, dia de reorganizar tudo para iniciar uma nova semana.

"De fazer tantos planos
De um futuro para nós..."

A loira começou a tirar as coisas da pequena cômoda que tinha em frente a sua cama, embaixo da televisão. Nem lembrava direito o que estava em cima da superfície, não limpava sua casa há tempos por conta do período conturbado em que ela se encontrava. Porém, ela estava reunindo forças para reconstruir sua vida inteira, começando pela sua casa.

Começou pegando um pequeno prato espelhado, onde se encontravam vários brincos, colares, anéis que a doutora fora deixando para trás após chegar em casa.

Depois eu vejo isso... — falou para si, deixando o objeto em cima de sua cama.

"Depois de tantos desenganos,
Nós nos abandonamos como tantos casais..."

A medida que fora retirando seus pertences de cima da cômoda e, em seguida, passando um pano molhado para retirar toda e qualquer sujeira que pudesse estar lá, finalmente chegara ao fim do móvel, restando apenas dois itens...

"Quero que você seja feliz,
Hei de ser feliz também."

Uma pequena foto, contornada por uma moldura de carvalho escuro com delicados desenhos esculpidos e protegida por um vidro transparente, descansava em cima de um grande álbum. A foto documentava o dia da primeira peça de teatro que a ex-escrivã havia escrito e dirigido. Uma peça feita pensada especialmente em Anita, para Anita.

A vida da morena sempre girou em torno das artes; nunca quis ser escrivã, apenas se submeteu a ideia por conta de forças maiores, dinheiro. Seu padrinho havia conseguido a vaga se trabalho para ela na delegacia que ele trabalhava, com o intuito de ser temporário até que a mesma se encontrasse em algum outro lugar.

Entretanto, ao entrar na delegacia pela primeira vez, avistou uma loira de olhos verde-azulados hipnotizantes, trajada com uma calça de alfaiataria, blazer preto e uma camisa bordô de gola alta; foi aí que ela teve certeza que amor à primeira vista, de fato, existia.

A peça era um romance dramático, exagerado. Contava a história de duas mulheres que sempre tinham algo em seu caminho, impedindo que o tão sonhado final feliz chegasse, se é que havia alguma possibilidade dele chegar. O ponto da peça era justamente retratar o quão angustiante a situação era para as duas, e como cada uma lidava com tal situação. A trilha sonora, as luzes, os cenários, tudo milimetricamente pensado para passar exatamente a sensação que Verônica queria para a plateia.

Seu trabalho foi muito bem executado, era perceptível como o público vibrava a medida que as cenas iam se desenrolando: muitos se contorciam, choravam, soluçavam, continham gritos pela agonia em que as protagonistas se encontravam, e a maior parte da peça fora assim. Porém, em um dado momento, o final feliz conseguia ser avistado e alcançado, transmitindo uma sensação de alívio e calmaria para toda a audiência, após 1 hora de completo desespero.

depois de ser sua - veronita (one shot)Onde histórias criam vida. Descubra agora