Dunas de areia e lagrimas salgadas

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Rune
— Rune, precisamos falar com você — meu pappa disse, enquanto
almoçávamos no restaurante em frente à praia. — Vocês vão se divorciar?
O rosto de pappa empalideceu.
— Deus, não, Rune — ele logo assegurou, pegando a mão de minha mamma para enfatizar. Minha mamma sorriu para mim, mas eu podia ver lágrimas começando a brotar em seus olhos.
— Então o quê? — perguntei.
Meu pappa lentamente se encostou em sua cadeira.
— Sua mamma andava chateada com meu emprego, Rune, não comigo.
Eu estava bem confuso, até que ele disse:
— Estão me transferindo para Oslo, Rune. A companhia teve um problema lá e estou sendo mandado de volta para dar um jeito nele.
— Por quanto tempo? — perguntei. — Quando você volta?
Meu pappa passou a mão pelo cabelo loiro grosso, do mesmo jeito que eu fazia, e respondeu:
— Aí é que está, Rune — ele disse, cautelosamente. — Pode levar anos. Pode levar meses. — Ele suspirou e continuou: — Realisticamente, qualquer coisa entre um e três anos.
Meus olhos se arregalaram.

— Você vai deixar a gente aqui na Geórgia por todo esse tempo?
Minha mamma estendeu a mão e cobriu a minha com a dela. Eu a observei sem pensar direito. Então as verdadeiras consequências do que pappa estava dizendo começaram a entrar em meu cérebro.
— Não — eu disse, sussurrando, sabendo que ele não faria isso comigo. Ele não podia fazer isso comigo.
Olhei para cima. Vi a culpa tomando seu rosto.
Eu sabia que era verdade.
Agora eu entendia por que tínhamos vindo para a praia. Por que ele queria que estivéssemos sozinhos. Por que ele havia recusado a companhia de Poppy.
Meu coração disparou enquanto minha mente dava voltas... Eles não iriam... Ele não iria... Eu não iria!
— Não — respondi, agora mais alto, atraindo olhares das mesas próximas. — Eu não vou. Eu não vou deixá-la.
Eu me virei para minha mamma buscando ajuda, mas ela baixou a cabeça. Arranquei minha mão da dela.
— Mamma? — supliquei, mas ela balançou a cabeça devagar.
— Somos uma família, Rune. Não vamos ficar separados todo esse tempo.
Temos que ir. Somos uma família.
— Não! — dessa vez gritei, empurrando a cadeira para longe da mesa. Fiquei em pé, com os punhos fechados do lado do corpo. — Eu não vou deixá- la! Você não pode me obrigar! Aqui é nossa casa. Aqui! Não quero voltar para Oslo!
— Rune — disse meu pai, de modo pacificador, levantando da mesa e estendendo as mãos.
Mas eu não conseguia ficar naquele espaço fechado com ele. Eu me virei e corri para fora do restaurante o mais rápido que pude, rumo à praia. O sol havia desaparecido atrás de nuvens espessas, fazendo um vento frio chicotear a areia. Continuei correndo em direção às dunas, e os grãos grossos atingiam meu rosto.
Enquanto corria, tentava lutar contra a raiva que me rasgava por dentro. Como eles podiam fazer isso comigo? Eles sabiam o quanto eu precisava de Poppy.
Eu tremia ao subir a duna mais alta e me jogar sentado no topo. Então deitei, observando o céu que se acinzentava, e imaginei a vida de volta à Noruega sem ela. Senti o estômago virar... só de pensar em não tê-la ao meu lado, segurando minha mão, beijando meus lábios...
Eu mal conseguia respirar.

Minha mente disparou, buscando ideias de como eu poderia ficar. Pensei em cada possibilidade, mas conhecia meu pappa. Quando decidia algo, nada o fazia mudar de opinião. Eu iria embora; o olhar no rosto dele me disse claramente que não havia como escapar. Eles iam me tirar da minha garota, da minha alma. E eu não poderia fazer nada a respeito.
Ouvi alguém subindo a duna atrás de mim e sabia que era meu pappa. Ele se sentou ao meu lado. Olhei para a outra direção, para o mar. Eu queria ignorar a presença dele.
Ficamos em silêncio até que por fim eu cedi e perguntei:
— Quando vamos embora? — Senti meu pappa endurecer do meu lado, fazendo-me olhar para sua direção. Ele observava meu rosto com expressão de pena. Meu estômago revirou ainda mais. — Quando? — insisti.
Pappa baixou a cabeça e respondeu:
— Amanhã.
Tudo parou.
— O quê? — sussurrei, em choque. — Como isso é possível?
— Sua mãe e eu soubemos há um mês. Decidimos não contar a você até o último minuto porque sabíamos como você se sentiria. Eles precisam de mim no escritório na segunda-feira, Rune. Organizamos tudo com a sua escola, fizemos a transferência de seus históricos. Seu tio está preparando nossa casa em Oslo para nossa volta. Minha empresa contratou uma equipe de mudança para esvaziar nossa casa em Blossom Grove e enviar nossas coisas de navio para a Noruega. Eles chegam amanhã um pouco depois que a gente for embora.
Encarei meu pappa. Pela primeira vez na vida, eu o odiava. Cerrei os dentes e olhei para longe. Eu me sentia nauseado com o tanto de raiva que corria em minhas veias.
— Rune — meu pappa disse suavemente, colocando a mão no meu ombro.
Eu me livrei de sua mão.
— Não — sibilei. — Jamais me toque ou fale comigo de novo. — Virei a cabeça e disse: — Eu nunca vou te perdoar. Eu nunca vou te perdoar por tirá-la de mim.
— Rune, eu entendo... — ele tentou dizer, mas eu o cortei.
— Você não entende. Você não tem ideia de como eu me sinto, do que a Poppy significa para mim. Não tem ideia. Porque, se tivesse, não ia me levar para longe dela. Você diria para sua empresa que não ia se mudar. Que precisávamos ficar.
Pappa suspirou.

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