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Eu tenho navegado pela solidão há um bom tempo já. Eu a conheço bem, mesmo assim, eu continuo navegando,
continuo andando,
continuo respirando,
A única coisa que me traz um sentimento de conforto é o céu.
Onde quer que vamos, estamos todos conectados por ele.
Estou sob o mesmo céu que estava em casa, e aqueles que amei também.
É uma pena que eu não possa simplesmente voltar a esses lugares. Eu estou preso aqui, sozinho. Não tenho mais certeza de onde eu estou, mas não importa, de qualquer forma. Está escuro, e eu não sei para onde vou.

Me deparo com a margem de um rio. Eu poderia ver até onde ele vai. É bonito como a luz da lua se reflete na água. À medida que ondula, lança uma fraca luz sobre os juncos ao meu lado.
É reconfortante - a luz. Isso me dá uma sensação de calor inexistente no frio da noite. Eu poderia tentar dormir. Meus pés doem e meus pensamentos me atormentam. Vou só me deitar encostado em uma árvore e torcer pra que isso acabe. A grama sobre o solo levemente úmido é macia e confortável. Enquanto eu me deito, olho para o céu noturno. Olho para as estrelas e para as nuvens que se dissipam lentamente ao passar pela lua. Quando começo a adormecer, percebo algo que se destaca entre o mato mal iluminado. Há uma garota, mais alta que eu, mas aparentemente da minha idade. Existe uma presença solene e sombria sobre ela, uma tristeza profunda que penetrou em seu próprio ser. Algo nela é fascinante para mim. Tento chama-la.

- Ei, você está bem? - Eu pergunto.

Ela responde:

- Estou. Eu acho... Você se importa se eu for até aí?

Balanço a cabeça afirmativamente e me coloco um pouco para o lado para que ela se junte a mim. Ela se coloca contra o tronco da árvore atrás de mim e desliza pra baixo de modo que seus joelhos fiquem juntos, e ela passou os braços em volta deles. Consigo ver melhor o rosto dela. Ela tinha olheiras escuras, lábios levemente rachados e algumas sardas. Apesar disso, havia outro detalhe que se destacava: seus olhos inexpressivos, mas que brilhavam ao luar - muito mais brilhantes que a água, existia algo cativante naquele olhar.

- Por que você está aqui? - Ela perguntou.

- Eu não tenho certeza. Eu estou um pouco perdido.

- Eu também.

A voz dela era suave e delicada, como se
eu pudesse imaginar um copo de vidro caindo e resultar em várias cacos quebrados a cada palavra que ela proferia ela me cativava mais.

- Então nós dois estamos perdidos?

Ela assentiu e olhou para cima, para o céu.

- Você está cansada?

Ela olhou de volta e disse:

- Sim.

Enquanto estavamos juntos lado a lado, houve um silencio, só sendo quebrado pela água lenta correndo no rio, e um suspiro das folhas da árvore. Uma brisa suave passou por nós, e a garota começou a tremer.

- Está com frio?

- Sim.

- Pode pegar minha blusa.

- Obrigada.

E o mesmo silencio de antes se instaurou, fazendo com que eu voltasse a pegar no sono. Até que o silencio foi quebrado novamente por ela. Mesmo que tenha me tirado do descanso, eu não consegui deixar de gostar, pelo menos um pouco. A voz dela era uma sinfonia.

- Me diz, nesse momento, qual é a coisa que você mais deseja?

- Eu não tenho certeza. - Respondo. - O que seria pra você?

- Tenta me dar uma resposta primeiro.

- Bom...

Sentia a brisa fria em mim, e a solidão que tenho presa dentro de mim sobrecarregar. Eu sabia minha resposta.

- Eu estou apenas desejando companhia.

Ela olhou diretamente nos meus olhos e quebrou sua neutra expressão com um pequeno sorriso. E eu esperava que ela começaria a rir de mim. Eu poderia ter dito qualquer outra coisa, mas decidi ser honesto. Por um momento, tudo que realmente desejava era a companhia de alguém.

- Eu acho que eu desejo a mesma coisa.

Então, ela se aproximou e me abraçou. O calor do seu corpo tomou conta de mim. Senti a respiração dela no meu ombro e o aperto de seus braços ao meu redor. E o fato de que eu consiga sentir o coração dela batendo calmamente contra o meu fazia com que tudo a minha volta desaparecesse. Tudo que havia naquele momento era apenas eu e ela. Nós nos deitamos ali debaixo daquela árvore, pelo que pareceu ser uma vida. Tinha um desejo não comunicado entre nós, e nunca iríamos deixar dele. Eu tinha o desejo ardente de não deixar essa garota, cujo nome ainda era desconhecido. Nós durmimos ali, sem nos separar até o amanhecer.

A partir daí, eu acordei sozinho. Eu tinha dormido embaixo de uma árvore.
Eu me levanto, esfrego um pouco meus olhos. Eu volto a caminhar. Meus pés ainda doem. O ar voltou a ser áspero.

Eu olho para o rio que eu estava seguindo. As visões que passavam pela minha mente durante a noite começam a sumir lentamente. 'Que desejo mais estúpido.' Eu penso.
Então olhando mais uma vez para as águas que agora refletiam o meu próprio reflexo, vi a imagem da minha silhueta levemente distorcida dentro da água e o céu claro expandindo. Antes, olhar para o céu me trazia conforto, nesse mesmo céu, só existe arrependimento. Eu sinto um frio incomodo e meu corpo doendo. Eu não queria reconhecer essa dor.

Quando isso acaba?

Eu quero dar um fim nisso.

O ar me causa desconforto. Olho mais uma vez para o rio ao meu lado. No fundo dessas águas, não há ar que me faça sentir assim. 'Quão bom seria ser dividido pelo desconhecido', eu penso.

Eu entro no rio e aceito a água gelada em meus pulmões. Eu começo a sentir mais daquelas visões desaparecendo. Finalmente, tudo acabou.

' Arrependimento.Onde histórias criam vida. Descubra agora