UTOPIA: A caminho do sol

A detetive que lê pensamentos descobriu o segredo dos robôs

Yunjin acordou cedo como de costume, quando o sol recém começava a nascer no horizonte. Após escovar os dentes e lavar o rosto, preparou uma xícara de café e se sentou no parapeito da janela de seu quarto, de onde conseguia ver todo o oceano. Não fazia muito tempo que havia saído da casa dos pais, um hotel que ficava perto do porto, e alugado uma casinha pequena no alto da montanha, com janelas vermelhas e vista privilegiada. De lá, conseguia ver as demais casas coloridas ao seu redor e boa parte do mar. Por isso, sempre se sentava, ainda de pijama, para beber uma xícara de café quente e apreciar a vista antes de começar mais um dia de trabalho.

Ela era conhecida como a senhorita Yunjin Jennifer Jones, uma detetive particular relativamente famosa em Sunset Way. Tinha recém completado vinte e três anos e já ganhava seu próprio dinheiro, porém vivia se sentindo incompleta. Muitas vezes, enquanto olhava para o mar, sentia que não pertencia àquele lugar e se perguntava quais aventuras poderia viver se tivesse a coragem de partir sem rumo por aí, mesmo ciente do quão absurdo era esse pensamento. Por que abandonar uma vida tão segura?

Além de ser detetive, ela guardava um segredo: seu pai era um Tenebris, e essa condição foi passada para ela. Por causa disso, precisava esconder a pinta debaixo de seu olho com bastante maquiagem e não contava a ninguém sobre seu poder especial. Assim como seu pai, ela conseguia ler pensamentos ao tocar nas mãos de alguém. Muitas vezes, sentia-se frustrada por conta de sua condição; se ao menos tivesse um poder que a ajudasse a lutar, teria alguma utilidade. No entanto, lendo pensamentos, o máximo que podia fazer era trabalhar como detetive, já que isso sempre a ajudava a desvendar os casos mais rápido. Mas nunca viu sua condição como algo bom; passou a vida inteira tendo que se esconder, com medo de ser caçada pelo rei, como muitos Tenebris eram. Sua mãe sentia o mesmo medo; tendo um marido e uma filha Tenebris, a ideia de perdê-los a apavorava todos os dias.

Aquela manhã não estava sendo diferente das anteriores: ela havia tomado banho, aplicado a maquiagem para esconder sua pinta e saído para trabalhar. Ainda não tinha seu próprio espaço, então estava usando uma sala que ficava no hotel de seus pais. No entanto, antes que atravessasse o portão de entrada, levou um susto ao ver uma mulher se aproximar com uma panela na mão. No segundo seguinte, foi empurrada contra a parede e a panela já havia ido de encontro à sua cabeça!

Quando ela começou a gritar, sua mãe correu para acudi-la. Yunjin sabia muito bem quem era aquela mulher: uma cliente que havia pedido para investigar seu marido. Quando começou a trabalhar como detetive, achou que desvendaria mistérios eletrizantes. Porém, ao invés disso, seus clientes eram apenas mulheres que desconfiavam da infidelidade de seus maridos. Bastava que Yunjin apertasse a mão deles uma única vez para descobrir a história toda. E com essa mulher não tinha sido diferente, era apenas mais uma traída em meio a tantas outras. No entanto, a maioria se vingava dos próprios maridos; era a primeira vez que ela estava apanhando!

— É tua sua culpa! — A mulher gritou enquanto a espancava com a panela. — Meu marido me contou tudo, me disse que você que o corrompeu!!!

— O quê??? — Yunjin gritou de volta e levou mais uma pancada.

— Minha senhora, já chega! Minha filha é uma garota de bem, ela nunca faria algo assim! — A senhora Jones tentou defendê-la.

Enquanto isso, Toto estava parado na porta do hotel, olhando a cena que acabara de acordá-lo, sem entender nada. Mas, por algum motivo, achava que a ruiva ajoelhada no chão era inocente.

Quando, por fim, o padeiro que trabalhava perto dali ouviu a gritaria e veio ajudar, a mulher foi carregada para longe enquanto ainda gritava desaforos. Yunjin fez um bico enorme e abraçou sua mãe. Algo lhe dizia que o dia de hoje seria cheio de surpresas desagradáveis...