Wednesday's Love

4

Pov Enid

Wednesday Friday Addams, ou o mais fiel sinônimo de uma sociopata com perfeito senso de narcisismo, estava em estado profundo de concentração, dividindo o seu olhar entre as diversas flores ali presentes, e eu a observava ao longe, vestindo um sobretudo preto, com óculos escuros e um bigode incrivelmente realista que eu havia comprado na Amazon. Um disfarce perfeito!

De qualquer modo, depois de gastar horas fazendo mais conexões em meu quadro do assassino falso, eu criei muitas possibilidades sobre como as minhas pistas se ligavam e a mais forte entre elas envolvia a linhagem dos Addams. Ou em outras palavras, quem sabe esses sintomas fossem uma fase, ou problemas de gene de família, e Goody, de uma forma sobrenatural, aconselhou Wednesday a procurar “E”.

Digo, eu sei que existem pontos em aberto, mas fazia sentido! E a simples ideia de que Friday ficaria bem era o suficiente para que eu me prendesse a essa teoria. Então, eu optei por apenas acompanhar discretamente os sintomas de Wednesday e descobrir quem era “E”, para assim, saber como ajudar a teimosa Addams.

Sendo assim, me preparei fisicamente e aprimorei as minhas habilidades com o auxílio de Thing, resolvendo as colocar em ação quando o corvo me avisou que iria para Jericho para repor o seu estoque de papelaria. No entanto, como uma boa garota intrometida, eu sabia que ela não precisava de mais material, e se dois mais dois eram quatro, então, eu havia pego Wednesday em uma mentira! 

- Yoko, câmbio, como estão as coisas? -perguntei discretamente em meu walktalk, usando o meu jornal para me esconder e espiando por cima dele quando a Addams não olhava em minha direção.

- Enid, pela quinta vez, você consegue ver e ouvir com perfeição o que acontece! Se sentou em um banco literalmente na frente dessa droga de floricultura! -resmungou ranzinza- eu preciso mesmo continuar aqui? Eu estou quase sem dignidade! -o seu choramingo soou manhoso, mas eu não me deixei abalar com a sua reclamação. No caso, para ser mais discreta e coletar informações com total precisão, eu peguei emprestado sem avisar (roubei) uma fantasia de flor para a minha assistente, e lhe pintamos como uma íris, para ela se camuflar.

- Aguente firme, minha cara Watson! -lhe incentivei com otimismo- e lembre de falar “câmbio” -eu acrescentei, disfarçando quando uma garotinha passou por mim, me fitando esquisito.

- Enid, vai se ferrar, câmbio! -ela disse e pelo vidro do estabelecimento eu pude ver uma Yoko de flor me mostrando o dedo do meio.

Todavia, eu não consegui rebater, pois no instante seguinte o mais amedrontador trovão soou, seguido de uma garoa fina e eu me encolhi, morrendo de medo do som. E assim, fechei os meus olhos e depositei as minhas palmas em meus ouvidos, abafando o som aterrorizante, enquanto a chuva engrossava e me atingia, causando frio.

Mas, de repente, as gotas pararam de bater sobre mim e eu abri lentamente os olhos, levantando o cenho e fixando os meus azuis nos mais doces castanhos. E ali estava Wednesday, sorrindo fraco, segurando o seu guarda-chuva sobre as nossas cabeças e protegendo um lindo buquê de margaridas.

- Não deveria ficar na chuva, Enid! Ou vai adoecer! -disse suave e eu corei, sentindo o meu coração disparar, provavelmente, pelo susto do trovão.

- Enid? Eu não conheço nenhuma Enid! Eu sou apenas um senhor qualquer de bigode real lendo o meu jornal! -respondi, engrossando a voz, e ela revirou os olhos.

- A sua mentira iria ser mais convincente se o jornal não estivesse ao contrário -retrucou simples e eu fitei o papel, resmungando desgostosa, afinal, as habilidades que Thing me ensinou não haviam funcionado! E eu certamente reclamaria com ele depois!

E então, outro som estrondoso seguido de raios me fizeram choramingar, levantando-me abruptamente e abraçando Wednesday, em busca de um abrigo seguro.

- Ei, não se preocupe… eu… estou aqui -me consolou e eu suspirei em alívio, sentindo o seu abraço desajeitado por conta das flores- vem, vamos para casa -sussurrou gentil, retirando os meus óculos e o meu bigode, antes de indicar o caminho.

E eu, por minha vez, senti novamente o meu corpo entrar em êxtase e de repente a Addams estava tão mais fofa e as suas atitudes para comigo eram tão mais encantadoras, diferente do modo que ela se dirigia aos demais. E quem sabe, o meu lado egoísta estivesse gostando dessa sua versão mais carinhosa, mas a minha enorme consideração por si me fazia ignorar os meus sentimentos e apenas garantir que ela ficaria bem.

De qualquer forma, eu resolvi ignorar momentaneamente a bagunça que eu sentia e concordei com o mais bobo sorriso sem dentes, perdendo o fôlego quando a mais velha me estendeu o buquê.

- Hm, pode segurar para mim? -pediu e leve desânimo me abateu, mas a culpa foi minha, eu fui extremamente ingênua cogitando que as flores eram para mim.

- Claro! -afirmei, disfarçando a minha decepção e apanhando o buquê- o que vai fazer? -perguntei curiosa, enquanto ela se ajoelhava e, surpreendentemente, amarra os meus tênis com delicadeza, sem se importar com a chuva ou em sujar as suas mãos com a lama que havia respingado em meus sapatos.

- Eu não quero que você caia -sentenciou, voltando a se levantar, e eu desfaleci brevemente, respirando fundo para me recompor e lhe devolvendo o buquê- oh, não, elas são para você! Eu sei que são as suas favoritas! -comentou, como quem não se importava, e eu paralisei, sabendo que os meus azuis estavam brilhosos demais.

- Se… lembrou das minhas flores favoritas? -murmurei fraco e, na verdade, era uma pergunta retórica, para mim mesma, para conseguir processar que Wednesday Friday Addams havia me presenteado com flores! Com as minhas flores favoritas!

- Obviamente, você encheu o nosso quarto com elas! -resmungou, fingindo uma postura ranzinza, e eu sorri largo, lhe abraçando sem me importar em estragar a reputação fria de Wednesday.

- Eu nunca havia ganhado flores… obrigada… -sussurrei, escondendo o meu rosto em seu pescoço e me deixando permanecer ali por longos segundos. Friday era tão cheirosa e desejável.

- Hm, podemos ir? -ela indagou em desconcerto, parecendo não saber lidar ao certo com a situação e eu concordei com diversão, andando ao seu lado.

- Wednesday, eu posso abraçar o seu braço? -pedi, rezando internamente para que ela concordasse.

- Não… -murmurou, buscando regressar a sua postura usual.

- Por favor… eu estou com medo, Wendy! -insisti, lhe fitando com olhinhos de filhote, e ela suspirou, me estendendo o seu braço, em uma confirmação silenciosa.

Eu, por minha vez, comemorei baixinho e lhe segurei com carinho, caminhando consigo na chuva sem mais temor, e entrelaçando os nossos dedos algumas vezes, desejando que Wednesday sempre estivesse por perto para espantar os meus medos e sorrir para mim.

- Eu não quero lhe perder, Wendy…  nunca -sussurrei, descansando a bochecha em seu braço e sentindo ela apertar suavemente a minha palma.

- Não se preocupe, Sinclair… você não vai se livrar de mim tão cedo -assentiu e eu me perdi de mim mesma ao receber um beijo na testa, vindo de Wednesday Friday Addams! E eu irei repetir, Wednesday Friday Addams beijou a minha testa! E beijou com carinho!- hm, agora pode me explicar, por que você se vestiu de sequestrador de crianças e por que Yoko estava de samambaia entre as flores? -indagou em confusão e eu gargalhei gostoso, impressionantemente, lhe contagiando.

- Por hora, eu vou lhe deixar curiosa -disse de modo levado e ela sorriu ladino. Deus, que sorriso ladino infeliz de tão lindo e fatal!

- Sabe que eu vou descobrir de qualquer forma, certo? Então, não soa mais simples apenas me contar? -sugeriu e eu entrei em sua frente, deslizando uma de minhas palmas por seu formoso rosto repleto de adoráveis sardas.

 - A objetividade nem sempre me apetece, Addams… algumas vezes, devemos ser complicados para despertar certo interesse! -eu sussurrei docemente e ela sorriu com diversão, suspirando fraco quando plantei um beijo longo em sua bochecha.

- Touché, Sinclair… -concluiu, perdendo as palavras e me fitando de uma maneira diferente, a qual, eu não consegui reconhecer, mas nem me importei em fazer qualquer esforço para indentificar a intenção no seu olhar. Eu estava caminhando na chuva, abraçando a minha Wednesday, e isso era o que importava para mim.