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O cheiro de maresia preenche o ar. Sob meus pés, sinto a areia branca e fina da praia. Me dou conta de que estou mesmo em frente ao mar sem a presença da minha mãe. Quase ouço dona Clarice exigir que eu passe o protetor solar imediatamente, mas dois outros sons acabam por soar fortes em meus ouvidos: o alvoroço de meus amigos tentando colocar o nosso guarda-sol contra o vento e a melodia das ondas quebrando na praia. Respiro fundo, enchendo todo o meu pulmão de ar, e observo, encantada, a beleza selvagem que nos rodeia.

A Praia do Meio deve ter esse nome por conta da formação rochosa que separa duas pequenas baías. Bem no meio da praia, forma-se, em direção ao mar, uma quase montanha que queria ser maior e não foi. Algo parecido com o que estava sendo o meu lance com o Cadu. Um quase relacionamento que queria ser maior e não foi. Quando paro de fazer comparações entre a praia e a minha vida particular, olho em volta mais uma vez e noto o contraste do azul turquesa do mar com o verde das montanhas. Daqui, é possível ver a imensidão do oceano e a água cristalina da enseada.

― Quem vai ser o primeiro a entrar na água!? - grita animadamente a Babi.

Todas as garotas se esquivam, fazendo gestos corporais que claramente dizem "eu não" sem precisarem falar. Júlio então se aproxima de Bárbara e a levanta no colo enquanto diz entusiasmado:

― Geralmente, a resposta está em quem pergunta!

Ele corre em direção ao mar e joga Babi na água. Ela grita tanto que acorda uma senhora que dormia sob seu chapéu de sol. Ambos ficam brincando de se atacarem mutuamente na água, e eu noto o olhar incomodado na face da Samanta.

As meninas então estendem suas cangas, colocam seus óculos escuros e se deitam ao sol. Vejo o Cadu se dirigir a uma das muitas barraquinhas de comida e bebida improvisadas na areia. Ele veste apenas uma bermuda de tactel preta, e é possível ver o contorno do seu corpo, que não é mais tão magro como era quando o conheci antes de ele ir morar com o pai. Ele pega uma bebida e acende seu cigarro. Vitor se senta em uma cadeira de praia e passa a mexer no seu celular. Eu me ajeito em uma das cadeiras que sobraram e tiro um livro da minha bolsa. Estou ainda lendo o primeiro parágrafo do capítulo quando Cadu se aproxima.

― Quer dizer então que dona Clarice contratou um recreador para nossa viagem? ― ele expressa um sorriso de canto e depois dá uma tragada no cigarro.

Eu quero ser enterrada na areia viva para não precisar responder àquela pergunta com um "sim, minha mãe acha que ainda estou no ensino fundamental um". Mas preciso responder ao Cadu logo justamente para encerrar o assunto:

― Parece que sim. ― suspiro ― Minha mãe tem medo de...

Eu paro, procurando as palavras certas para não parecer ridícula. Mas Cadu apenas ri e balança a cabeça.

— Relaxa, todo mundo tem uma mãe meio doida, né? — ele diz, tentando me tranquilizar.

— É... — eu digo, e tento voltar a atenção ao livro.

— Não se preocupa, marrenta. Eu dei cinquentinha pra ele fazer vista grossa e deixar a gente se divertir um pouco. — ele pisca para mim e dá um gole na sua bebida.

Olho em volta e então me dou conta de que, de fato, o suposto recreador do camping havia sumido. Cadu então se senta na cadeira ao meu lado, observando o mar. Surge um silêncio constrangedor entre nós até a Babi voltar às gargalhadas com o Júlio. Ela se chacoalha, espirrando gostas de água salgada sobre o corpo roliço da Samanta, que ergue o tronco enfurecida. É chegada a hora da Babi atacar:

— Não fica brava, Sá! Vamos fazer esse oceano acordar de vez? Pronta para deixar todos os seus problemas na areia e entrar no mar comigo? — ela estende a mão para erguer o corpo de Samanta.

Sempre fomos nósOnde histórias criam vida. Descubra agora