Era uma noite fria de inverno, quando a escuridão dominava o céu com uma soberania incontestável. Eu e minha esposa, Samanta, estávamos sentados junto à lareira em nossa velha e decrépita morada. Encontrávamo-nos há dois dias no coração da floresta, nas proximidades do lago Walden, distantes do alvoroço da cidade. Nossa missão, proteger os aldeões, impelia-nos a permanecer naquele ermo.
- A munição está acabando. - indagou Samanta, seu olhar perdido nas chamas dançantes do fogo. –Não estamos preparados para essa noite. Eu suspirei profundamente, sabendo que suas palavras não eram desprovidas de verdade.
- Samanta, meu amor, bem sabes que minha alma anseia por sair deste decrépito lugar. Contudo, opeso da responsabilidade sobre meus ombros é insuportável. Não posso encontrar paz enquanto vidas inocentes estão à mercê de tais horrores. Ela assentiu, compreendendo a tormenta que assombrava meu coração.
- Se ao menos tivéssemos outra escolha, Simon... se ao menos houvesse um caminho que nos permitisse viver em tranquilidade, longe das garras da morte e do medo. Estou cansada desta vida.
Antes que pudesse responder, um grunhido aterrador cortou o silêncio da noite, fazendo nossas almas estremecerem.
- Ele está próximo. - murmurei, levantando-me de pronto. "Pegue a arma e os punhais."Samanta e eu trocamos um olhar carregado de determinação e tristeza. Armamo-nos com o pouco que tínhamos – uma velha espingarda de caça, facas afiadas e nossa coragem exaurida.
- Simon, será que conseguiremos? - disse ela, sua voz tremendo ligeiramente. - Temo que não será como os outros.
- Os aldeões disseram que ele só devorou alguns animais da fazenda. Já enfrentamos criaturas muito piores. - declarei, tentando infundir confiança em nossos corações.
A criatura começou a rondar a casa, suas garras arranhando as paredes, produzindo um som arrepiante. - Está nos testando. - sussurrei, apertando a espingarda com mãos trêmulas. – O desgraçado está brincando conosco.
- Simon, se algo acontecer comigo, prometa que vai abandonar essa miserável vida de caçador. - Disse Samanta com lágrimas escorrendo pelo rosto.
- Mas o que deu em você? Nós vamos matá-lo e pendurar sua cabeça...
De repente, a estranha criatura investiu contra a porta, com uma força brutal que quase a despedaçou. Disparei a espingarda, mas a criatura era rápida, desviando-se e saltando pela janela,estilhaçando o vidro.
Samanta que estava próxima à janela, assustou-se com a repentina chegada do visitante. Desesperadamente tenta futilmente atacá-lo com uma faca. Mas ela é lançada ao chão com um terrível golpe.
- Samanta! - gritei, correndo para ajudá-la. O monstro se postou entre nós dois de modo que não pude prosseguir. Estava agachado, semelhante a uma aranha armada para o ataque. Mas curiosamente ele havia parado de se mover. Lentamente ergueu-se sobre os dois pés, revelando ser um apenas um homem de aparência decadente. Estava completamente nu, e sua pele estava imunda, como se nunca tivesse se banhado.
Arma em punho, Desferi o primeiro disparo no estomago.
- Esse é pela Samanta!
Habilmente posiciono novamente a espingarda sobre seu peito.
- Esse é pelos aldeões que você aterrorizou por meses.
Coloquei o cano da espingarda de baixo do queixo do desgraçado e, antes que eu pudesse puxar ogatinho, ele sorriu. Parecia aliviado, como se matá-lo fosse um favor que eu estava prestes a fazer.
Não disparo, deixando-o caído no chão prestes a morrer. Ele... esboçava um sorriso com muito sangue saindo de sua boca. A respiração era rápida e, quando deitou enfim a cabeça, disse: - Toda criatura viva, morre só. – e fechou os olhos.
Virei-me para Samanta, mas já era tarde. Ela jazia sem vida, seu rosto pálido e seus olhos fechados para sempre.- Não, não pode ser. - murmurei, ajoelhando-me ao seu lado, as lágrimas escorrendo livremente.
- Seu demônio sem alma! – Gritei para o corpo sem vida do homem.
Naquela noite, enquanto a lua cheia iluminava a cena trágica, compreendi a extensão de minha desgraça. Samanta, minha amada esposa e companheira, havia partido. Levantei-me com dificuldade, sentindo o peso insuportável da perda. Olhei para Samanta uma última vez. Arrastei o corpo do homem para fora da cabana, enterrando-o em uma cova rasa, como um último ato de respeito pelo inimigo caído.
Faz duas semanas desde o ocorrido. Decidi permanecer na velha cabana e estar próximo dos aldeões. Pensei em começar uma vida nova, mas nenhuma realidade me parece suficiente sem minha Samanta. A noite já é chegada. Mas essa noite é especial, pois tenho escutado algo arranhando as paredes. Sinto frio e meu corpo treme. Estou indo encontrar minha amada. Aquele que encontrar estes escritos, saiba que fiz o possível.
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Lua Vermelha (conto)
Short StoryUm casal aguarda a chegada de um curioso visitante.