O começo da jornada no navio-balão a caminho do sol

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O ano era 1830, e um casal que vinha sendo caçado pelo rei de NewGlory fugia pelo mundo. A mulher era uma Tenebris Fairy, seu sangue preto podia curar qualquer doença; já o homem era um humano normal. Eles tinham se acostumado a viver nas sombras, lutando para sobreviver e escapar dos olhares dos soldados do rei, que os perseguiam como cachorros bem treinados. Fugir sempre tinha sido a única alternativa, mas deixou de ser quando a mulher engravidou. Era impossível continuar correndo de um lado para o outro enquanto carregava um precioso bebê em seu ventre.

Eles tinham chegado à Rain City e decidiram que teriam o bebê no esconderijo onde estavam vivendo; jamais poderiam ir para um hospital. No entanto, o parto não estava sendo nada fácil, e ao ver sua mulher gritar e perder tanto sangue, o homem não teve outra escolha a não ser correr ao hospital mais próximo e pedir ajuda. Sabia que as pessoas de lá poderiam acabar matando sua esposa pela ganância de seu poderoso sangue. Porém, se não fizesse nada, ela iria morrer de qualquer forma.

Havia uma médica de plantão naquela noite fria e chuvosa. A doutora Beaufort ouviu o apelo do homem e decidiu acompanhá-lo até sua casa. Logo percebeu que os dois viviam em condições deploráveis e que aquele era o pior ambiente possível para se ter um bebê. Porém, a Tenebris estava em condições tão ruins que não seria possível levá-la até o hospital. Ela também notou, é claro, que seu sangue era preto.

Depois de muita dor e insistência, um bebê magrinho de pupilas arroxeadas veio ao mundo e chorou pela primeira vez. Aquela foi uma das poucas vezes em que pôde derramar lágrimas, pois durante sua vida nunca teve a chance de ser fraco se queria sobreviver. Mas ao segurá-lo em seus braços em seus primeiros momentos, a doutora Beaufort sentiu tanta compaixão por ele e por sua família que prometeu que os protegeria. Dali em diante, a família Fairchild foi viver no porão da casa dos Beaufort.

Os primeiros anos da vida daquele bebê foram os melhores. Heeseung Evan Fairchild era uma criança de bochechas redondas que sorria sempre que estava com seus pais. Eles não podiam sair de casa, viviam no porão sem iluminação natural, mas só pelo fato de estarem vivos, nenhum deles reclamava. Pelo contrário, viam os Beaufort como anjos que os tinham protegido naquela jornada desafiadora.

Algumas vezes, a Tenebris Fairy havia confessado para a doutora Beaufort sua insatisfação com a própria vida. Ela nada mais era do que uma ferramenta; se morresse, seu sangue poderia ser usado para curar milhares de pessoas. O único momento em que se sentia humana era quando segurava seu bebê nos braços, a criança que, infelizmente, tinha herdado o mesmo fatídico destino que o dela. Em seu coração, tudo o que queria era que ele tivesse uma vida diferente da sua.

— Doutora Beaufort — ela perguntou um dia. — Poderia me dizer o que é o amor?

— O amor? — A médica ponderou por alguns segundos. — Não acho que seja algo que eu possa colocar em palavras, é um sentimento inexplicável, um calor que sinto no peito quando vejo as pessoas que amo.

— Calor no peito? — A Tenebris sorriu, embora não soubesse o que era isso.

Uma lenda muito antiga dizia que Tenebris Fairies eram amaldiçoados e nunca poderiam amar. Todos eram herdeiros de Dux, o primeiro Tenebris Fairy a existir neste mundo, por volta de 1500. Dizem que ele nasceu como um Tenebris normal, porém, como se tornou muito forte para se proteger, sofreu uma mutação e seu sangue se tornou preto. A humanidade, que o odiava e o torturava até então, passou a desejá-lo por conta de seu sangue preto. Na juventude, o corpo de Dux era como se fosse um ímã que podia atrair qualquer metal. Já na vida adulta, ele se tornou tão forte que era capaz de atrair elementos do cosmos, como um meteoro, por exemplo. Ele tinha poder o suficiente para destruir o planeta, se quisesse. No entanto, essa não era sua intenção.

UTOPIA: A caminho do solOnde histórias criam vida. Descubra agora