E por fim

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-Eu preciso lhe contar algo - pediu Chad antes de segurar o braço da ruiva a levando para outro lugar do navio, um lugar vazio e sem movimentação aparente - eu... Não sei como lhe dizer isso... É a primeira vez que conto isso para alguém... Não sou espanhol, não nasci na Espanha, nasci em Portugal...
Chad fez uma careta ao se lembrar de seu país de origem e balançou a cabeça negativamente tentando manter o rumo de seus pensamentos.
-Quando meus pais morreram eu fui para a Espanha, morar com a minha tia, ela não era uma pessoa ruim ao todo, era promiscua, alguns diziam que ela era uma puta, se vendia barato por qualquer homem que passasse na sua frente e eu... Bem, acabei pendendo para o mesmo lado, entende? Às vezes o meio molda o homem... Eu juro que não queria, era mais forte que eu e eu pendo pro lado que me paga mais - Chad deu um sorriso torto e suspirou cansado - seja homem ou mulher, se me pagavam que mal fazia? Era esse meu lema... E depois eu... Me apaixonei por minha própria tia, fui para a cama com ela, foi frustrante, não o ato, mas o fim, o dia seguinte, as outras noites... E eu fugi, porque no fundo eu era um covarde e não conseguiria lidar com uma rejeição.
Helena ouviu tudo calada e preferiu não se pronunciar, pois sentia que Chad precisava de um momento para se reestabelecer e prosseguir com sua narrativa, demorou-se alguns minutos até o loiro retomar sua fala.
-Foi quando os conheci... os corsários portugueses, em uma taverna perto do porto, eles me ofereceram dinheiro para invadir o navio e passar as informações que pudesse... Aquele dia que você foi sequestrada... Eu sabia que eles estariam lá, mas eu juro que não compactuei com o fato de terem te sequestrado, eu realmente fiquei desesperado para lhe encontrar... O navio abandonado, esse eu sabia, mas na hora me esqueci, talvez pela adrenalina, ou pelo desespero e quando vi quase não pudemos sair a tempo... E eu não sei quanto tempo eu terei quando sair desse navio, posso ter dias, meses ou apenas algumas horas, sei que eles virão atrás de mim, então quero lhe deixar ciente de que posso partir a qualquer momento...
-Chad... Não... Não tem outra forma? Não quero lhe perder também, não agora, nós iriamos ter uma nova vida, uma nova casa, sonhos e metas, outros objetivos, uma nova etapa em nossas vidas e eu não sei como... É horrivel saber que você vai partir por coisas do passado - Helena se jogou nos braços do loiro e deixou algumas lágrimas cairem - você se tornou meu melhor amigo, meu irmão, se tornou parte de mim, como espera que eu vá reagir tendo uma parte de meu coração sendo quebrado e estilhaçado quando nem ao menos estava arrumado de outros impactos?
-Desculpa, eu realmente sinto muito, não queria que fosse assim... Não mesmo, se pudesse voltar no tempo mudaria tudo, teria sido tudo tão diferente se eu soubesse das consequências... Mas não há como voltar, só me resta aceitar esse fim e Helena... Eu te amo, da minha forma estranha e confusa, mas eu te amo de verdade e se tem algo que eu não me arrependo foi ter pego você na praia e colocado dentro deste navio, ter lhe conhecido foi a única coisa boa que já fiz e eu queria ter sido melhor, para que você se orgulhasse de mim e não me visse como o traidor que sou...
-Eu tenho orgulho de você, Chad, orgulho por ter contado tudo, por ter sido franco e sincero, por estar colocando sua vida em risco por seus amigos, pelas pessoas que conquistou aqui, e eu sinto orgulho de lhe conhecer, porque eu sei que se você pudesse teria feito diferente, porque sabe que errou, nem todos têm essa coragem e nunca se esqueça de que independente de onde estivermos seremos sempre uma família, temos uma ligação, mais forte do que a de sangue, uma ligação de almas e essa nunca pode ser quebrada - Helena apoiou sua mão direita sobre o peito do loiro e sorriu deixando suas lágrimas mancharem seu rosto translucido.
Mais algumas palavras foram trocadas por ambos os jovens até que o navio aportasse na Espanha, a hora da despedida já foi relatada no capítulo anterior, então vejamos essa aventura por um novo angulo.
O corsário português aportava um pouco mais ao longe, dois homens que mais se assemelhavam com armários devido a suas alturas e ombros largos desceram da nau portuguesa, seus olhos de corvos percorriam como urubus o porto a procura de algo, ou melhor, de alguém, e eles o viram descer junto da jovem ruiva.
Era a chance que eles procuravam, ele era um traidor, um agente duplo que pendeu para o lado inimigo e só havia uma saida: a morte.
A passos apressados seguiram o casal, sempre a espreita como cobras, mas sem deixar rastros, com passos silenciosos e arrastados.
Não demorou muito para conseguirem a oportunidade perfeita, os dois jovens andavam pela praia e quem não adoraria morrer em plena areia com a agua do mar a banhar-lhe as entranhas? Seria talvez poético e melodramático.
Um disparo. Um impacto. Um corpo. Um tiro certeiro. Uma morte. Um coração partido. Uma despedida. Uma promessa. E por fim, a morte.

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