Mais uma vez, Mephiles some do universo quando entro para dentro de casa. Nem me preocupo, sabendo que ele faz aquelas aparições repentinas quando menos espero, e não demoraria para a próxima acontecer.
Sonic, que estava esparramado contra o sofá, se levantou correndo assim que me ouviu, sorrindo carinhosamente em minha direção.
— Oi, Sil — ronronou. Apesar do tom calmo, pude notar que algo estava estranho nele. Parecia mais cabisbaixo, menos alegre que o normal.
— Oi, Soso — cumprimento, caminhando lentamente até ele. Meus olhos vasculham a casa à procura de Shadow, que pelo visto não estava no andar de baixo. — Tá tudo bem? Você parece diferente.
— Diferente? Não estou diferente — a resposta vem veloz, definitivamente demonstrando o contrário do que dizia.
— Sério? — Ergo seu rosto até o meu, mirando profundamente em suas íris esverdeadas. Ele segura o olhar, firme e temeroso simultaneamente. — Você é o Sonic? — A pergunta o faz revirar os olhos, como se fosse uma bobagem. Porém, quando ele responde, não preciso de mais confirmações, sabendo que, dessa vez, não era mentira.
— É claro que sou eu. Não tenho motivos pra me sentir mal ao ponto de algum deles aparecer.
Eu concordo com a cabeça, ainda sem entender as razões daquela carinha tristonha disfarçada casualmente.
— Então, o que aconteceu?
Por alguns minutos, ele não responde. Faz bico, desvia o olhar, brinca com os dedos, morde o lábio… Até, enfim, soltar um demorado suspiro e começar a falar.
— É que… hm… — Ele me olha chateado, e sinto a facada bem no estômago. — Você não anda muito focado na gente ultimamente. Quer dizer, eu sei que é importante pra você essa coisa toda com o Mephiles, mas… sei lá, isso parece estar tomando todo o seu tempo! Só esse final de semana, você já saiu três vezes. Isso que eu saiba. Não me importo que você saia, mas você poderia pelo menos tentar incluir mais eu e o Shadow nisso. Afinal, somos seus namorados! Amanhã já é segunda-feira de novo e mal aproveitamos o fim de semana porque você estava ocupado demais com suas coisas. Isso é um pouco frustrante, sabe? — E, antes de soltar mais um suspiro, ele pede: — Desculpa…
Eu afundo no sofá ao seu lado, sentindo tanto a dor daquelas palavras em mim quanto a dor dele em conseguir pronunciá-las. Ele sempre falava o que queria, isso era fato, mas vê-lo colocar tanta emoção em suas frases e ao mesmo tempo tentar evitar que aquilo me magoasse era ainda pior do que levar todas na cara como um soco. Não sabia como reagir, o que falar. Era muito para absorver, mas o pior de tudo é que em momento algum ele mentiu. E ainda por cima ele estava coberto de razão. Eu realmente estava afastado dos dois, focando tanto em um certo alguém que quem fazia parte da minha vida por tanto tempo ficou de canto. E perceber isso machucava demais.
— Não. Desculpa eu — finalmente digo, apanhando ambas suas mãos com as minhas e as apertando com carinho. Ele não era capaz de me encarar. — Você tá certo, eu errei muito. Vocês são tão importantes pra mim, e ainda assim, eu abandonei vocês pelas minhas vontades. Eu esqueci que, se isso é importante pra mim, eu também posso adicionar vocês no meio. Eu estava tão preocupado com o que ele poderia fazer com vocês que eu acabei não percebendo que, no fim, ele na verdade não faria nada. Parecia certo os deixar de lado pra que ficassem a salvo, mas isso é ainda pior. Sinto muito…
O silêncio predominou por um bom tempo, com Sonic ainda evitando me olhar. A cada segundo, a dor parecia aumentar em meu peito, e não podia deixar de me martirizar por meus feitos. Porém, do alto da escada, uma voz grossa ecoou:
— Que fofinho. Eu te perdoo.
Tanto eu quanto Sonic viramos ao mesmo tempo, avistando Shadow descendo calmamente degrau por degrau até nos alcançar. Um sorriso tranquilo perpassava seu rosto, sendo o suficiente para amenizar um pouquinho a agonia da espera pela resposta de outrem.
— Eu também — Sonic respondeu, finalmente. Soltei a respiração que nem sabia estar prendendo, um sorriso surgindo em meus lábios.
— Ainda bem… Tive muito medo de perder vocês.
— A gente sabe. — Shadow se espreme do meu lado no sofá, obrigando o azulado a se arrastar mais para o canto. — Mas não é qualquer personalidade besta que vai nos afastar.
— Personalidade? — pergunto confuso, olhando de um para o outro. Sonic parecia ter levado um tapa.
— SHADOW! — Me encolho perante seu grito, atingindo em cheio meus tímpanos sensíveis. Shadow não parece notar seu erro, até compreender tudo com o olhar cortante de Sonic.
— Ah? Ah! Personalidade? Que bobagem, haha! Eu quis dizer… ahn… identidade!
— Quer parar de piorar as coisas?! — berrou Sonic mais uma vez, escondendo o rosto entre as mãos.
Minha cabeça rodava com as informações, tentando decifrar o código enviado por Shadow.
— Personalidade…? Tá falando do Mephiles? — Nenhum dos dois responde, apenas se encaram com o maior medo. — Mephiles é uma personalidade… O Mephiles… personalidade…
— Tá vendo o que você fez?! — resmunga o azulado mais uma vez, recebendo um sorriso amarelo de Shadow.
— Mas todos nós temos uma personalidade, não? — concluo por fim, para o espanto de todos.
Sonic bate com a mão em sua própria testa; Shadow solta um longo suspiro, aliviado com minha conclusão; até Mephiles brotou de algum lugar e agora batia sua cabeça contra a parede como se tivesse acabado de ouvir a coisa mais idiota da sua vida.
— Ué, gente, mas não é? — pergunto, voltando a me sentir confuso. Sonic me faz um sinal de mais ou menos com a mão, incapaz de conseguir falar.
— Não era exatamente isso… — murmura Shadow, mais para si mesmo do que para outro alguém.
Mephiles, pisando duro, caminha até mim, parando em minha frente com uma cara de raiva que nunca imaginei que seria direcionada a mim.
— Por que eu tive que fazer parte de alguém tão burro?!
E, simples assim, saiu pisando duro mais uma vez para algum outro canto da casa, me deixando desconfortável e, principalmente, com um ponto de interrogação gigantesco flutuando sobre minha cabeça.
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Behind The Shadows (Volume 2)
FanfictionContinuação de Os Mil e Um Você. A vida estava boa para o casal triplo. Boa até demais. Quando Silver se vê em um caos que só ele reconhece, teme contar aos namorados sobre ele, calando-se para não causar mais dor e medo após tanto tempo na paz. Mas...