Merecidas Férias

8 0 0
                                    

O carro seguia pela estrada de terra, as duas mulheres nos bancos da frente discutiam.

Co-pilota: A gente tá perdido fala sério.

Motorista: Não estamos.

Co-pilota: Estamos sim.

Motorista: O mapa indica essa estrada aqui.

Co-pilota: Mapa... em que século você vive, porque não pois no GPS?

Motorista: Não tem esse lugar no GPS, tá bom, nem pega sinal aqui, é um lugar retirado. Esse é o objetivo de passar férias reclusas.

Co-pilota: Mas eu deveria mesmo saber que um panfleto de um lugar que nem site tem deveria ser uma roubada.

A discussão acorda a mulher e o homem que dormiam no banco de trás do carro encostados um no outro.

Mulher: Gente deixa a DR para depois, não pegamos instrução na cidade anterior?

Homem: Que eu me lembre sim, mas ficamos indecisos no trevo, lembra?

A co-pilota retrucou: Sim, foi aí que vocês tiveram a segunda grande ideia, 'sigam a mulher na caminhonete velha', 'ela é da região', 'ela deve saber pra onde vai', a gente nem sabia se ela tava indo pro mesmo lugar.

Motorista: Qual foi a primeira grande ideia, em Mariana?

Mariana: É Mariana que fala agora Joana Coraline? A primeira grande ideia foi férias em 'casal de casal' eu nem sei de onde vocês tiraram o nome casal de casal.

O homem argumenta pensativo do banco de trás: Somos um casal de casal não? 4 pessoas.

A mulher ao lado continua: É sim, é daí que veio o nome.

Joana: Mery você tá nervosa, eu sei que você não gosta de viajar de carro - a fala é interrompida

Mery: Aaaaah, claro Joe, eu sei, você sabe, o Biela sabe, e sabe quem mais sabe? Uma pessoa que nem parece que é minha amiga de infância porque me convenceu a vir aqui, né Pé-de-pano. Todo mundo sabe, seu carro sabe, o cascalho e terra fedorenta dessa estrada devem saber.

Joe: Vocês sabem que o cheiro da terra molhada são bacte...

Mery: A gente sabe Joe, a gente sabe, a gente sabe que você tava certa.

Biela: Não teimar com a Joe, ela sabe as coisas. A gente sabe. Isso já tem anos e você ainda lembra.

Joe: Lembro que eu tava certa.

Mery: É viu parece que todo mundo se conhece e ainda assim sou convencida pelo suposto amor da minha vida e pela minha suposta amiga a estar aqui.

Pé-de-pano: Me erra Mery, você vai amansar quando a gente chegar. E a Joe me pediu ajuda e ela também é minha amiga de infância, ou você esqueceu que eu que apresentei vocês?

O carro começa a diminuir a velocidade em preparação para parar.

Joe: Ta bom pessoal, olha vamos parar no restaurante, bar, sei lá o que ali e comer, metade do nervosismo dentro desse carro é fome, a F-1000 tá parada ali também, deve ser um lugar bom.

Mery: Meu deus, Joe, para de achar que essa pessoa conhece tudo aqui.

Biela comenta: É uma D-20. Tem carroceria de madeira.

Joe: Biela eu vou esfregar sua cara no emblema escrito 'F-1000' naquela caminhoneta quando a gente descer.

Ao descer do carro a discussão sobre seguir ou não a caminhonete continua, Pé-de-pano nota que o veículo realmente é uma F1000, e tem um emblema colado no capô próximo a porta, ela cotuca Biela e aponta. Ele responde com um aceno de não com a cabeça. Pé-de-pano imagina o que passa pela cabeça dele "Como estavam distraídos discutindo se deveriam ou não ter seguido a garota dirigindo o veículo até ali, ele vai deixar o fato passar e não tocar mais no assunto. Afinal a Joe não vai largar do pé dele se confirmar que isso não é uma D-20".

Os cochichos na mesa, discorrem sobre a aparência da garota que dirigia a caminhonete, ela trajava um vestido alaranjado estampado, o tecido grosso se estendia até um pouco acima do meio da canela, as botas de couro marrom subiam até próximo a altura do vestido de modo que só uma pequena parte da pele da perna podia ser vista. As botas tinham sinais de muito tempo de uso embora ainda estivessem em perfeitas condições. Por cima de tudo ela usava uma jaqueta preta de couro desbotado. Cobrindo seus cachos vermelhos um chapéu marrom da mesma cor da bota.

Todos comeram e o silêncio tomou conta da mesa por um tempo, a medida das palavras pesadas do discurso no carro impedia novas palavras de serem ditas.

Biela: Ela parece que saiu dos anos 70, o vestido tem até aquele negócio lá por baixo.

Pé-de-pano: Negocio por baixo?

Biela: Sim de dar volume.

Joe: Vocês sabem que a história disso - ela é interrompida por Mery.

Mery: Bem anos 70. Ela não se depila.

Joe: Que isso mô, deixa ela, virou fiscal de pelo agora?

Mery: Só estou comentando.

Pé-de-pano: Comentário completamente desnecessário né.

Biela: Ah eu...

Pé-de-pano da um cutucão na costela dele: Você nada, não é assunto seu isso.

Biela: Que isso amor, só ia comentar.

Pé-de-pano: Comentar o que?

Mery: Também não se depila, ia dizer que ela está certa.

Biela: Depilo o sovaco.

Pé-de-pano: Vamo parar com esse assunto. Chatão vocês.

Mery dá de ombros: Parece estranho não ter ninguém no melhor restaurante.

Joe: Não começa Mery.

Pé-de-pano fala enquanto faz sinal para todos abaixarem: Shiii, escuta, a mulher da caminhonete tá perguntando do Resort Rio Vermelho pro atendente, viu ela tá indo pra lá também..

Joe fica apontando o dedo para eles e para ela, todos sabem que isso significa que ela vai passar o resto da viagem falando que estava certa.

A mulher pergunta: Resort Rio Vermelho é por aqui, estou no caminho certo?

Atendente: Certíssimo senhora, segue esta estrada aqui, vai dar mais uns 100Km de viagem, segue essa estrada até o trevo, pega o asfalto, mas não se anima não o asfalto acaba depois de uns 10Km, não vai ter erro é uma reta quando o asfalto curvar pra direita, tu entra na estrada de terra pra esquerda depois é só seguir ela até encontrar o resort.

Mulher: Daqui até lá até parece fácil, chegar aqui foi mais difícil, nem no GPS esse lugar existe.

Atendente: Faz tempo que ninguém vai pra lá, eles andaram fora das atividades, costumava ter umas placas antes.

Joe: Eu disse que tava no caminho certo, eu disse que a gente não estava perdida - ela comenta dançando sentada na cadeira.

Mery coloca a mão na testa e diz baixinho: Todos os deuses do olimpo dai-me paciência pra aguentar ela agora.

Joe diz animada: A cabocla tá saindo vamos seguir ela novamente.

Sua animação se esvai quando a mulher passa ao lado dela conversando sozinha baixinho, mas não o suficiente para não ser escutada

Mulher: Caramba, mais 100Km, eu já dirigi um tempão, vou dormir ali pra frente antes de continuar, escondo a Jandira no mato, dirigir cansada não rola não...

O Cheiro Roubado Das PedrasOnde histórias criam vida. Descubra agora