Minhas unhas curtas arranhavam a madeira áspera da caixa onde estava preso, criando um som abafado que se misturava ao meu próprio gemido de agonia. O cheiro de podridão impregnava o ar, se enroscando em meu nariz e garganta como uma serpente venenosa, sufocando minha respiração. O odor pungente de sangue seco misturava-se ao de carne apodrecida, o que fazia meu estômago se revirar, a bile amarga subindo pela garganta. Meu corpo magro tremia descontroladamente, coberto de suor frio. Eu estava completamente nu, vulnerável, mas o que mais me aterrorizava era o calor abrasador que se espalhava por minha pele, queimando-me de dentro para fora, ignorando o fato de que lá fora era inverno.
O breu absoluto dentro da caixa era esmagador, como se o mundo inteiro tivesse desaparecido, deixando-me sozinho em um vazio sem fim. Tentei me mover, mas o espaço era pequeno demais, as tábuas de madeira ásperas pressionando contra meus ombros, joelhos e costas. Cada movimento fazia a madeira ranger, o som ecoando de forma surreal, intensificando o pânico que já fervia em meu peito.
Os invernos no Rio Grande do Sul são gélidos, especialmente em Arupeuna, uma cidade esquecida na fronteira com a Argentina. O frio era uma presença constante, mordendo qualquer pedaço de pele que ousasse ficar exposto, e eu sabia disso, sentia isso em cada célula do meu corpo. Mesmo assim, o calor que me consumia agora era tão descomunal, tão insuportável, que parecia derreter minha sanidade. Minha boca estava seca como o deserto, a língua pesada e áspera como lixa.
Por que eu sentia tanto calor? Por que meu coração batia como um tambor frenético, ameaçando explodir dentro do meu peito? O desespero me enchia, me forçava a lutar, a arranhar, a tentar escapar, mesmo sabendo que era inútil. O gosto ácido do vômito subia pela garganta, um lembrete cruel de minha impotência.
"Socorro", eu murmurei, minha voz trêmula e fraca, como um fio de esperança prestes a se romper. "SOCORRO!" gritei, forçando meus pulmões a expelirem o ar com força, apesar da dor que rasgava meu peito.
Mas as risadas eram a única resposta que recebi, um som frio e distante que fazia o pânico em meu coração crescer. Elas vinham de todos os lados, reverberando na escuridão da caixa, como se a própria madeira estivesse zombando de mim. Minhas mãos tremiam enquanto eu arranhava as paredes, tentando desesperadamente encontrar uma saída, mas não havia nada além de madeira e dor.
Minha respiração era fraca, quase inexistente, e eu podia sentir o desmaio se aproximando, como um predador silencioso à espreita. Estava prestes a sucumbir, a deixar que a escuridão me levasse, quando, de repente, a tampa da caixa foi aberta com um estrondo.
A luz ofuscante que entrou foi um choque para meus olhos, cegando-me momentaneamente. Pisquei repetidamente, lutando para ajustar a visão, e então, como uma visão divina, eu o vi.
Kain.
Seu rosto era uma obra de arte, uma beleza etérea que não parecia pertencer a este mundo. Seu cabelo negro caía em cascatas suaves, emoldurando um rosto que era ao mesmo tempo angelical e perigoso. Seus olhos, de um azul profundo, me fixavam com uma intensidade que fazia meu coração acelerar ainda mais. Mas o que mais me aterrorizava era o sorriso em seus lábios, um sorriso que parecia carregar o peso de mil segredos sombrios.
Ele se abaixou, os dedos longos e pálidos roçando minha pele febril, enviando um arrepio por todo o meu corpo. O toque de Kain era frio como gelo, contrastando com o calor que me consumia, mas em vez de me trazer alívio, só intensificou minha confusão e medo. Eu tremi sob seu toque, meus lábios se movendo sem som, como se estivesse tentando formar palavras que não conseguia articular.
Eu deveria gritar por socorro, mas tudo que consegui fazer foi sussurrar o nome dele. "Kain," minha voz saiu em um sussurro quebrado, carregado de desespero. Ele era a única coisa que parecia real em meio àquele pesadelo, e em meio à minha confusão, ele se tornava tanto meu algoz quanto minha salvação.
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wires
Mystery / ThrillerKain era um deus, inalcançável, perfeito em cada detalhe. Seus olhos azuis brilhavam com uma intensidade que poderia queimar qualquer alma que ousasse encará-los por tempo demais. Cada cesta que ele marcava no time de basquete fazia o ginásio vibrar...