DIA TENSO

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Ele sentiu um nó se formar na garganta, de tal forma, que foi quase impossível engolir a pouca saliva que se formara, agora, com um gosto amargo. O medo aflorara por todo o seu corpo fazendo seus pelos eriçarem. No braço direito, o relógio marcava 12:20, a voz que ouvira na ligação mais cedo disse que tudo seria resolvido às 12:30. Por um momento pensou na vida, na ação que tinha dado início ao seu pior erro até aquele momento. Se pudesse voltar atrás, não estar no lugar errado, na hora errada...

Ah, Deus! se eu tivesse ido pra casa...

Agora estava ali, no local marcado, cansado e com as esperanças por um fio. Consultou o relógio e constatou que faltavam dez minutos, minutos esses que mudariam a sua vida; ele tinha esperança.

Ouviu-se um "bip", o telefone vibrou na sua mão e em questões de segundos a mensagem foi lida.

Remetente: desconhecido

"Dirija-se à cabine telefônica no meio da praça"

Ele hesitou por um segundo, os pensamentos a mil. Não havia mais nada na mensagem além da ordem descrita, há dias estava vivendo essa tortura. Ele olhou ao redor e sua atenção foi direcionada à pequena cabine isolada, no centro da praça: estava vazia. A praça circundada de lojas, ornamentadas por árvores altas e bancos de madeira sob as sombras, fervilhava de pessoas indo e vindo. No entanto, aquele homem estava só, inerte no tempo. As pessoas não passavam de sombras, borrões que rapidamente cruzavam seu campo de visão. Ele precisou de alguns segundos para a coragem tomar conta da sua mente. Ele não tinha opções, teria que ir.

Deu o primeiro passo e sentiu o corpo tremer, o sangue pulsava no rosto pelos batimentos acelerados enquanto caminhava. A mão segurava fortemente o aparelho celular como sendo algo precioso. Resquícios da cena daquela noite saltam em sua mente: o sangue, o corpo, o carro. Ele se arrepende. Não queria ter visto o homem, não queria ter tido àquela conversa. Mas as necessidades falaram mais alto. O momento, o anseio, foi a força inimiga que lhe fizera calar, o fizera ser cúmplice. Contudo as coisas fugiram do controle.

Fracassei.

Enquanto caminha de cabeça baixa e olhar fixo, ele encara o chão de pedras portuguesas em preto e branco, parando vez ou outra para alguém que passava na sua frente. Se pudesse retardaria o tempo. Ergueu a cabeça e fitou a cabine que, diante de tamanha tensão, jurou percebê-la se mover, se afastar. Rapidamente limpou o suor que escorria pelo rosto, passando o antebraço sobre o olhar cansado.

Se concentra. Talvez seja o cansaço, pensou ele.

Com as sobrancelhas franzidas e olhos espremidos ele avista uma mulher grande, de vestido longo e tênis preto. Uma dona de casa, supõe. Ela entra na cabine.

Aquilo fazia parte do negócio ou viera a ser algo do destino?

Ele se retém, talvez ela possa estar envolvida e tenha alguma informação do que aquilo tudo significava. Com olhar preocupado ele observa a civil no recinto. As pessoas não o notam, permanece parado, passam por ele como se estivesse invisível. A agonia só aumenta, o desespero misturado ao medo também. Uma onda de frio lambe suas costas quando outro "bip" é ouvido. Era o sinal de mais uma mensagem.

O que será agora? pensou.

Sua atenção foi atraída para o aparelho que de imediato revelou mais uma ordem.

Remetente: desconhecido

"Livre-se da mulher na cabine."

Sua garganta engoliu um onda de pavor. A mulher não fazia parte daquilo. Havia apenas ele. Estava só e sendo observado. Não tinha para onde fugir.

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