JULHO

7 6 0
                                    

•• EU, VOCÊ e o que não dizemos! ••
Quando os olhos falam, as palavras silenciam.
______________________________________

"Sully não deveria dar nome. Quando a gente dá nome começa a se afeiçoar." - MONSTROS S.A.

Após duas semanas viajando pelos Estados Unidos, Lisa estava de volta, combinamos de nos encontrar cedinho no parque para colocar o papo em dia.
O parque fica a poucos minutos de casa, exalava uma tranquilidade incomum para um domingo. O silêncio pairava entre as árvores, apenas quebrado pelo som suave do vento. Quase vazio, o lugar parecia esperar por algo. Calcei meus patins e deslizei em direção à pista. A cada movimento, uma memória de tardes passadas aqui com Donavan surgia, como ecos de um tempo que já não existe. Nós dois costumávamos ir sempre ao parque, quase que religiosamente, enquanto o sol se despedia atrás das árvores. Mas agora, que ele está na faculdade, tudo parecia perder o brilho. Não havia mais aquela risada compartilhada, nem a emoção de dividir o momento. Patinar sozinha era só... solitário.

Alex apareceu repentinamente, caminhava lentamente pelo jardim, os olhos fixos no chão como se procurasse algo invisível para os outros. De onde eu estava, deslizando de patins pela pista de skate, podia observá-lo sem ser notada. A camiseta branca que ele vestia trazia a inscrição "a culpa é sua" nas costas, uma frase simples, mas que carregava consigo uma ambiguidade inquietante. Dependendo de como se lê, podia conter tudo - de raiva a paixão.

Será que essa camiseta tinha algum significado especial para ele? Ou seria apenas uma piada, uma brincadeira leve? Não sei ao certo, e me dava medo perguntar. Depois da breve e objetiva conversa que ouvi entre Alex e Donavan, algo dentro de mim se retraiu. Fiquei contida, como se pisasse em terreno instável.

Eu gosto de Alex, mas temo que ele entenda errado o que sinto. Já sei como é doloroso alimentar esperanças em vão, sonhar acordado com algo que nunca será. Não desejo isso para ele. A equação não bate - Alex gosta de mim, eu gosto de Donavan, e Donavan... Bem, às vezes tenho a sensação de que ele também sente algo, mas logo se afasta, como se tivéssemos cruzado um limite que ele não pode ultrapassar.
E assim, ficamos presos nesse ciclo: nenhum amor correspondido, dois corações pendendo ao vazio, sem encontrar onde repousar.

Ele vêm em minha direção, tem uma das mãos escondidas nas costas e um leve sorriso nos lábios.

- O que tem aí! - pergunto curiosa.

Ele tira a mão de trás das costas e mostra um pequeno dente-de-leão.
Inevitavelmente sou transportada para infância.
Um sorriso espontâneo surgi, em meu rosto cheio de ternura.

- Para você! - ele estende a mão e me entrega.

Meus olhos brilham, involuntariamente, com a atenção que Alex me dedica. A carência tem dessas armadilhas - mesmo sem querer alimentar os sentimentos dele, não consigo esconder o quanto gosto de ser o centro de sua adulação. Nos sentamos na grama do parque, rindo como crianças despreocupadas. Seguro o dente-de-leão com delicadeza e sopro suas sementes ao vento, como se pudesse espalhar meus desejos no universo.

Gostaria de sentir por Alex o mesmo que ele sente por mim. Tudo seria mais fácil. Mas o coração, com sua teimosia implacável, tem outros planos.
Lisa finalmente aparece, ela se senta ao meu lado, e sorridente cumprimenta Alex. Antes que ela possa contar sobre suas aventuras da viagem, Donavan surge como se meu desejo tivesse sido realizado em segredo. Ele para de frente para mim, ali, imponente, lançando uma sombra que nos cobre. As mãos dele repousam nos bolsos da calça, e seu olhar permanece indecifrável, enquanto seu rosto guarda um silêncio enigmático.

- Bom dia! - diz enquanto se senta entre Alex e eu, nos separando propositalmente.
- O que estão fazendo tão cedo no parque em pleno domingo?

- Decidimos aproveitar amanhã de sol.

EU, VOCÊ e o que não dizemos!Onde histórias criam vida. Descubra agora