A rota do desespero

Capítulo 13

O limite das sombras

"A má fé é uma mentira contada a si mesmo." Jean-Paul Sartres em O ser e o nada

O caminho solitário que escolhi trilhar me levou a lugares onde a luz mal alcançava. As ruas familiares agora eram e envoltas em uma penumbra constante, como se o sol se recusasse a brilhar plenamente sobre mim. Mesmo durante o dia, havia uma sensação de que as sombras estavam sempre à espreita, prontas para engolir qualquer vestígio de esperança. A incerteza que antes pairava em meus pensamentos agora parecia se manifestar fisicamente ao meu redor, tornando tudo nebuloso e indistinto.

Passei a vagar sem rumo, deixando que meus passos me levassem para longe de tudo e de todos. As vozes que antes me atormentavam estavam em silêncio, mas o peso de sua ausência era ainda mais sufocante. Era como se o mundo ao meu redor tivesse perdido seu som, seu brilho, e tudo o que restava fosse um eco distante de algo que eu não conseguia identificar. Comecei a duvidar da minha própria sanidade, questionando se algum dia havia realmente confrontado minha escuridão ou se tudo não passava de uma ilusão.

Em meio a essa escuridão crescente, houve momentos em que a luz tentou se infiltrar. Pequenos lampejos de clareza e esperança surgiam em minha mente, mas eram fugazes, rapidamente consumidos pela sombra persistente. Eu percebia que, mesmo quando a luz conseguia encontrar seu caminho até mim, ela vinha com um custo – o retorno das memórias que eu preferia esquecer, dos rostos daqueles que eu havia machucado, das vidas que eu havia destruído. Cada vestígio de luz trazia consigo um fardo insuportável, um lembrete de que a escuridão era uma parte inextricável de quem eu havia me tornado.

Foi em uma dessas noites sem fim que encontrei algo que me fez questionar tudo o que havia vivido até então. Vagando por uma floresta escura e retorcida, onde as árvores pareciam dobradas sob o peso da própria escuridão, encontrei uma pequena cabana, quase oculta entre as sombras. Ela parecia abandonada, mas havia algo nela que me atraía, como se uma força invisível estivesse me puxando em sua direção.

Ao entrar na cabana, fui recebido por um silêncio absoluto, tão denso que parecia quase palpável. As paredes estavam cobertas de símbolos estranhos, marcas que eu não conseguia decifrar, mas que despertavam um sentimento de desconforto profundo. No centro da sala, havia um espelho antigo, sua superfície coberta por uma camada fina de poeira. Ao me aproximar, vi meu reflexo distorcido na superfície empoeirada – uma versão de mim mesmo que parecia mais uma sombra do que um ser humano.

Mas, quando limpei a poeira do espelho, algo estranho aconteceu. Meu reflexo começou a se mover por conta própria, me encarando com uma intensidade que fez o ar ao meu redor parecer congelar. E então, ele falou – sua voz era um sussurro frio, carregado de um conhecimento antigo e aterrorizante. Ele me disse que a luz que eu buscava, a redenção que eu desejava, nunca estaria ao meu alcance, porque a escuridão dentro de mim era muito profunda, muito enraizada. Ele afirmou que eu estava destinado a ser consumido pelo abismo, a me tornar aquilo que sempre temi.

As palavras do reflexo ecoaram em minha mente, deixando-me paralisado diante do espelho. A incerteza que eu sentia agora se transformava em algo mais sombrio, uma aceitação lenta e dolorosa de que talvez eu nunca escapasse da sombra que me seguia. Mesmo quando tentava me afastar dela, a escuridão parecia estar sempre um passo à frente, esperando o momento certo para me arrastar de volta para suas profundezas.

Com um último olhar para o reflexo, saí da cabana, sentindo o frio da noite me envolver. Eu não sabia o que esperar a seguir, mas uma coisa era certa – a batalha entre a luz e a escuridão dentro de mim estava longe de acabar. A cada passo, eu sentia o peso da escolha que precisaria fazer. E, enquanto caminhava para o desconhecido, não pude deixar de me perguntar se algum dia encontraria a redenção, ou se estava destinado a sucumbir ao abismo que me perseguia.