A CASA DE SOMBRAS

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Ana, uma jovem de vinte e poucos anos, transbordava sonhos e ambições ao se mudar para uma cidade desconhecida. Havia conquistado um emprego promissor, o que a motivou a alugar uma casa antiga, situada em uma área mais isolada, envolta por árvores antigas e distante do burburinho do centro urbano. A fachada acolhedora, com um jardim bem cuidado e janelas que deixavam a luz do sol entrar pela manhã pareciam o cenário ideal para começar uma nova vida.

No entanto, o que se escondia por trás daquela aparente serenidade estava além da compreensão humana.Na calada da noite, a casa revelava sua verdadeira natureza. As sombras se alongavam de maneira insólita, as paredes pareciam se estreitar, e um silêncio sufocante pairava no ar.

Logo na primeira noite, Ana foi abruptamente desperta por sons de passos ecoando no corredor. Desnorteada, levantou-se para investigar, mas não encontrou nada, convencendo-se de que o cansaço da mudança estava lhe pregando peças. Contudo, a sensação de inquietude persistia.

Com o passar dos dias, Ana começou a perceber que, mesmo estando sozinha, nunca se sentia completamente só. Havia uma presença, algo invisível, mas tangível, que a fazia sentir-se observada. Às vezes, ouvia sussurros que não conseguia entender, mas que a faziam arrepiar dos pés à cabeça.

Uma dessas noites, ao sair do banho, Ana notou algo alarmante no espelho do banheiro: uma figura nebulosa que desapareceu em um piscar de olhos. Alarmada, Ana decidiu relatar suas experiências aos colegas de trabalho, mas foi recebida com ceticismo. Sugeriram que o estresse da mudança poderia ser a causa de tais percepções.

Determinada a desvendar os mistérios que rondavam sua nova morada, Ana começou a investigar a história da casa. Seus esforços, porém, foram em vão; ninguém sabia muito, ou preferiam não falar. Apenas uma velha senhora, vizinha da casa, decidiu compartilhar um terrível segredo. Com voz baixa e cautelosa, a idosa revelou que, décadas atrás, uma família inteira desapareceu misteriosamente naquela casa.

Alguns acreditavam que a casa era amaldiçoada, que ali residia um mal ancestral, devorador de almas. A velha mulher implorou a Ana que deixasse a casa, antes que fosse tarde demais. Ana, entretanto, desconsiderou o aviso, convencida de que se tratava de superstição e lendas antigas.

Naquela noite, Ana foi novamente despertada, mas desta vez o som era distinto: alguém chorava, um choro baixo e desesperado. Contra seu melhor julgamento, seguiu o som até o porão, um lugar que evitava visitar.

A porta, que sempre estivera trancada, encontrava-se entreaberta. O choro tornou-se mais alto, mais angustiante, à medida que Ana descia os degraus.


Ao chegar ao fundo, deparou-se com uma visão horrível: uma figura esquelética, de costas para ela, soluçava de forma incontrolável. Antes que pudesse recuar, a figura virou-se lentamente, revelando um rosto retorcido pelo sofrimento. "Você não deveria estar aqui", disse uma voz profunda e cavernosa.

O pânico tomou conta de Ana, que tentou correr, mas sentiu uma força invisível prendê-la, como se mãos gélidas e intangíveis tivessem se enrolando ao redor de suas pernas, imobilizando-a. A criatura aproximou-se lentamente, e Ana pôde sentir o ar ao seu redor ficar pesado, como se a própria escuridão estivesse viva.

Um medo paralisante tomou conta dela, seus pensamentos ficaram turvos, e a vontade lutar evaporou. Era como se a criatura estivesse sugando sua energia vital, camada por camada, lentamente de forma agonizante.

A entidade começou a consumir Ana de dentro para fora, drenando não apenas sua força física, mas também sua alma. Ana sentia-se esvaziar, cada memória, cada emoção, sendo arrancada de si como se estivesse sendo devorada por uma fome insaciável.

O horror aumentava à medida que a criatura, em seu estado faminto, dilacerava o que restava da essência de Ana.

Ela sentiu seu corpo perder consistência, seus ossos se tornarem frágeis e sua pele se tornar translúcida, como se estivesse desaparecendo na escuridão. Sua visão começou a falhar, e tudo o que restava era a sensação de estar sendo puxada para um abismo sem fim.

O último lampejo de consciência que Ana teve foi o de ser tragada pela própria sombra, enquanto a entidade terminava de devorá-la, a escuridão do porão a envolveu completamente, e seus últimos instantes foram preenchidos pelo brilho maligno de olhos que a observavam consumindo-a com o terror absoluto.

A casa voltou ao silêncio absoluto, como se nada tivesse acontecido, deixando apenas uma vaga sensação de vazio no ar. Dias depois, os vizinhos notaram a ausência de Ana, e preocupados  chamaram a polícia. A casa estava vazia, sem sinais de luta ou desordem, como se a jovem tivesse evaporado no ar. Mais uma vez, a casa foi colocada para alugar, e a história de Ana se somou às lendas macabras que assombravam a cidade.

Continua...

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