016

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Helena

Gabriel então abriu a porta e pareceu confuso ao me ver, eu não avisei que iria vir. Forcei um sorriso e, em seguida, suspirei, desmontando as armaduras em mim e só sendo eu mesma. Soltei meus braços e encarei seus olhos.

── Eu vim porque queria conversar com você. — Falei, e ele concordou com a cabeça.

── Só um minuto. — Falou, olhando para trás e, em seguida, fechando a porta, ficando para o lado de fora comigo. ── Pode falar, gatinha. Tá brava comigo?

── Não tô. — Falei, mexendo nos meus dedos. Costume meu de quando fico nervosa. ── Tá, é um pouco difícil falar isso porque, caralho, eu nunca fiz isso antes, mas são só três palavras, eu consigo... — Comecei, enquanto continuava inquieta, e notei ele rindo levemente. ── Ai, não ri, capeta. Eu tô nervosa!

── Desculpa, você sabe que eu tenho mania de rir quando não posso. — Falou, inclinando a cabeça para o lado e, em seguida, franziu o cenho. ── Três palavras? Como assim?

── Eu gosto de você. — Falei rápido e notei sua boca entreabrir como sinal de susto. ── Eu queria poder esconder isso e só jogar para debaixo do tapete, mas isso não é justo com nenhum de nós dois, e também não é algo muito adulto da minha parte. Foi por isso que eu surtei ontem!

Ele ajeitou sua postura e continuou me encarando com uma feição que parecia tentar me decifrar. Meu coração estava acelerado, minhas mãos suando, e eu com o medo de levar o maior fora da minha vida. Nos conhecemos há dois meses e meio e foi tudo muito rápido, muito intenso. Isso me assusta, me assusta a ideia de ter um coração partido tanto quanto a de viver algo recíproco.

── Você surtou ontem porque gosta de mim? Preta, não tô entendendo, desculpa. — Negou com a cabeça. ── Relaxa! Eu te amo para caralho também, cada momento contigo é precioso, mas me ajuda a te entender.

Eu te amo.

Silêncio.

Eu respirei fundo, aliviada, e senti a tensão ir embora em seguida.

── É que eu achei que você poderia... — Fechei a boca após a porta abrir, revelando uma mulher loira com uma camiseta dele que batia na altura das coxas e o cabelo preso. Nós nos encaramos, uma tão surpresa e confusa quanto a outra.

Encarei Gabriel e ele passou a mão na nuca, indicando nervosismo enquanto intercalava o olhar entre nós duas. Ah, dane-se que a gente não tem um compromisso firmado, eu não me iludi sozinha, ele disse uma porrada de coisa e fez um monte também que fez eu me apegar nele.

Ele acabou de dizer que me ama e ele tá com outra.

── Ah, eu só posso ter cara de boba. Me esquece, Gabriel! — Falei, dando as costas e saindo, porém sentindo que ele vinha atrás enquanto escutava o mesmo me chamar.

Uma dor terrível. Eu literalmente tô me sentindo traída, mas não é traição. Então é isso que é um coração partido? Vontade de chorar, de bater na pessoa, e ter a plena certeza de que nunca mais quer ver ela na sua frente?

── Lê, Helena, para! — Ele falou firme e segurou meu braço ao me alcançar já próximo ao meu carro e eu me virei, o encarando.

── Que foi?

── Ela é só uma amiga.

── Tá tudo bem, você não me deve explicação. — Falei, encarando os olhos dele, e notei o mesmo negar com a cabeça. ── Eu botei expectativa onde eu não deveria ter colocado, mas você me disse uma porrada de coisa linda para caralho que pareceu real também.

── E foi! Nunca te menti, tudo que eu disse era verdade. Eu gosto de você! Eu tentei negar para mim mesmo por muito tempo, mas não dá mais. A gente não namora ainda, você também fica com outros caras.

── Com quem? — Perguntei, encarando suas íris escuras enquanto me segurava para não fraquejar e não demonstrar vulnerabilidade. ── O único cara que deu em cima de mim desde que você chegou, a oportunidade que eu tive de ficar com ele eu não fiquei porque você apareceu na hora. — Me referi à situação que envolveu o Richard uma semana atrás.

── Mas ele é um otário.

── Tem razão, ele é sim. — Concordei com a cabeça. ── Mas... Foi mal, outra hora a gente conversa e esquece tudo que eu disse aqui.

── Helena?! Para de drama! — Cruzou os braços.

── Drama? — Murmurei, sentindo meu sangue subir à cabeça enquanto me aproximava, e ele deu um passo para trás. ── Drama, Gabriel? Você fala e faz mil coisas lindas para mim, faz eu, infelizmente, me apaixonar por seja lá o que for a personalidade que você inventou aí, e quando eu descubro a real e fico brava, eu tô fazendo drama?

Meu coração parecia que iria sair pela boca; a raiva tomou conta de mim por inteiro já. Enquanto eu falava, sem perceber, batia com a ponta da chave contra o peito dele, enquanto o encarava para cima por ele ser mais alto. Gabriel passou a língua entre os lábios rapidamente, desviou o olhar, respirou fundo e negou com a cabeça. O fato dele estar calmo me irrita mais ainda!

Tudo me irrita quando eu chego ao meu limite de raiva.

── Como assim personalidade inventada? — Perguntou, passando a mão no rosto.

── É que aquela pessoa que fez mil planos para o futuro comigo ontem, não parece ser a mesma que fica com outra quando eu viro as costas. — Falei e só então senti o impacto das minhas palavras após elas saírem em voz alta. Eu não me apaixonei por ele, eu me apaixonei por quem eu idealizei dele. Por quem eu inventei dele. ── Acho que saquei o que aconteceu.

── Não fica brava. — Pediu, segurando minha mão de leve, mas eu a soltei.

── Outro dia a gente conversa. — Disse, me afastando dele, sentindo meu peito se fechar, como se cada passo que eu desse para longe, a dor se aprofundasse mais.

Enquanto me afastava, ouvi sua voz novamente:

── Helena, espera! — Mas eu continuei andando, sem olhar para trás.

O que ele poderia dizer agora? As palavras que eu queria ouvir já não faziam mais sentido. A máscara que eu mesma coloquei nele caiu, e a realidade, fria e dura, me atingiu em cheio. Estava na hora de ir embora, de deixar o que nunca deveria ter começado.

lentes no horizonte, gabriel medina. Onde histórias criam vida. Descubra agora