Capítulo 10: O Confronto Interno

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A carta ainda queimava na minha mente. "Você me conhece." As palavras se repetiam como um eco distante, assombrando cada pensamento. A letra "A", marcada em sangue nas paredes, tornava-se mais do que um símbolo de provocação. Era uma assinatura, uma mensagem clara, pessoal. E pior: era para mim.

A escuridão parecia me seguir para onde eu fosse. Durante a noite, o peso da insônia se tornava insuportável. Eu já não sabia onde terminavam os pesadelos e onde começava a realidade. Cada sombra no meu apartamento parecia ter vida própria, movendo-se, distorcendo-se. Quando finalmente desmaiava de cansaço, as lembranças de minha infância me assaltavam em um turbilhão de emoções e medos.

Minha infância. Aquela casa antiga, cheia de segredos e silêncios. Meu pai, sempre distante. Minha mãe, fria e controladora. E Anna...

Anna. O nome dela sempre fazia meu coração se apertar. Minha ex-esposa. A mulher que eu perdi por conta das minhas mentiras, da minha insônia, do meu caos interno. Ela sempre dizia que algo dentro de mim era quebrado, que eu tinha algo obscuro que nunca permiti que ela visse completamente. E agora, esse assassino parecia conhecer partes de mim que nem eu sabia que existiam.

No entanto, algo em minha mente ainda estava trancado. Havia um vazio, uma parte do meu passado que eu não conseguia acessar. Toda vez que tentava me lembrar, minha cabeça latejava como se estivesse prestes a explodir.

O dia começou nublado, o céu cinzento refletindo meu estado mental. Eu estava sentado no carro com Clara ao meu lado, enquanto Turner dirigia em silêncio. O destino era outra cena de crime, mais uma vítima. Mais uma assinatura em sangue.

Clara quebrou o silêncio, com a voz baixa, cuidadosa.

— Jack... essa coisa está ficando cada vez mais pessoal. Não posso deixar de notar o quanto isso está te afetando. Talvez devêssemos... tomar um tempo. Reavaliar as pistas.

Olhei para ela, exausto, mas determinado.

— Não podemos parar, Clara. Ele está jogando conosco. E quanto mais tempo perdemos, mais controle ele ganha. Esse jogo está longe de terminar.

Ela suspirou, mas não insistiu. Turner continuava focado na estrada, seu rosto uma máscara de concentração. Eu sabia que, em algum nível, ele também estava começando a desconfiar de mim, mesmo que não admitisse. A conexão entre mim e o assassino estava ficando clara demais para ser ignorada.

Chegamos à cena do crime pouco depois. Era uma casa de subúrbio, diferente das anteriores. Havia uma sensação de normalidade ali, como se aquela casa tivesse sido arrancada de uma vida comum e jogada no centro de um pesadelo. Mas assim que entrei, o odor de morte me atingiu como um soco no estômago. O sangue manchava o chão da cozinha, e o corpo estava ali, estendido como uma marionete quebrada.

A vítima era um homem, algo diferente dos assassinatos anteriores, que envolviam mulheres. Ele estava deitado de costas, os olhos vidrados olhando para o teto, com uma expressão de puro horror congelada no rosto.

— O que temos? — perguntei, me aproximando de um dos peritos.

— Mesmo modus operandi, exceto pelo sexo da vítima. Cortes profundos no torso e no pescoço. E a assinatura.

Meu olhar foi direto para a parede. E lá estava, mais uma vez, a letra "A", desenhada com precisão em sangue.

Mas havia algo mais dessa vez. Uma nova carta, presa ao peito do cadáver, dobrada cuidadosamente. Engoli em seco enquanto a pegava, minhas mãos tremendo levemente. Clara e Turner observavam em silêncio.

Abri o papel, revelando a mesma caligrafia cuidadosa.

"Você está quase lá, Jack. Vamos continuar? Está pronto para descobrir quem realmente é? Assinado, A."

Minhas mãos apertaram o papel com força. "Quem realmente é?" O assassino sabia de algo que eu não sabia. Alguma verdade que estava enterrada dentro de mim, e ele estava prestes a expor.

Turner quebrou o silêncio, a voz grave.

— Esse cara está brincando com você, Jack. Ele quer que você siga as pistas como um rato em um labirinto. E cada vez que você dá mais um passo, ele está um passo à frente.

Eu sabia que ele estava certo, mas o que mais eu poderia fazer? Eu estava preso nesse jogo, e desistir agora significaria deixar o assassino vencer.

Naquela noite, voltei ao meu apartamento com a carta ainda nas mãos, o peso das palavras me afundando cada vez mais na escuridão. As luzes fracas piscavam enquanto eu me jogava no sofá, olhando para o teto, tentando entender.

Minha mente voltou para Anna. Ela sempre dizia que havia algo em mim, algo que eu escondia até de mim mesmo. E quanto mais eu me lembrava dela, mais minha cabeça latejava com uma dor surda, uma pressão que parecia estar escondendo algo.

Fechei os olhos e me deixei levar pelas lembranças.

Eu estava sentado em uma mesa, de frente para Anna. Ela estava pálida, os olhos cheios de tristeza e frustração. "Você mente tanto que nem sabe mais o que é real, Jack. E isso... isso vai te destruir."

Eu tentei negar, tentei argumentar, mas algo dentro de mim sabia que ela estava certa. Havia uma verdade que eu não conseguia alcançar, uma parte de mim que estava trancada atrás de camadas de mentiras.

Voltei ao presente com um sobressalto quando o telefone tocou. Atendi, sentindo o peso da exaustão em cada parte do meu corpo.

— Jack, é o Turner. Temos um problema. Clara... ela desapareceu.

Meu coração parou por um segundo. Clara? Desaparecida? Não podia ser. Não agora.

— O que você quer dizer com "desapareceu"? — perguntei, tentando não deixar o pânico tomar conta.

— Ela saiu da delegacia mais cedo para investigar uma pista, e desde então, ninguém a viu. O telefone está desligado. Estamos procurando, mas... — Turner fez uma pausa. — Acho que o assassino a pegou, Jack.

A carta em minha mão parecia pesar uma tonelada. O jogo tinha mudado, e agora, Clara estava envolvida diretamente. O assassino estava me forçando a agir, e eu sabia que, se não fizesse algo logo, Clara seria a próxima vítima.

Eu estava preso.

JACK CARTEROnde histórias criam vida. Descubra agora