Entre todas as despedidas que a vida me forçou a viver, nenhuma foi tão cruel quanto a do fim de uma relação. Havia um tempo em que eu acreditava que certos laços eram inquebráveis, como árvores que crescem lado a lado, cujas raízes se entrelaçam sob a terra, firmando-se no solo da confiança. Acreditei que nossas histórias corriam como rios paralelos, destinados a desaguar no mesmo mar, movidos pela força do mesmo desejo de eternidade. Mas o destino, com sua ironia sutil e imprevisível, tinha outros planos.
Agora, é como se uma tempestade tivesse passado e levado consigo tudo o que era familiar, tudo o que construímos com gestos simples e palavras trocadas ao acaso. Aquelas tardes despreocupadas, o riso fácil que enchia o ar e as conversas que se arrastavam pela noite adentro — todos esses momentos agora parecem distantes, como se pertencessem a uma vida que já não é mais minha. Tentei agarrar essas memórias com a força de um náufrago que luta por ar, tentando encontrar, nelas, algum consolo. Mas elas escapam de minhas mãos como areia entre os dedos, dissolvendo-se no vento do tempo, perdendo a nitidez a cada tentativa de resgatá-las.
E fico aqui, sozinho, a imaginar onde erramos. Em que curva dos nossos caminhos nos desencontramos? Qual palavra, engolida pelo medo ou pela insegurança, plantou a primeira semente da discórdia? Talvez a resposta esteja nas coisas que não dissemos, no silêncio que deixamos crescer entre nós, como uma trepadeira que se agarra e sufoca, enlaçando o que um dia foi um jardim florescendo. Ou, quem sabe, mudamos com o passar dos dias, mudamos como mudam as estações, sem perceber que cada um de nós estava seguindo sua própria direção, afastando-se lentamente, sem olhar para trás. E agora, ao tentar revisitar os passos dados, vejo que nossos caminhos seguiram por estradas tão distantes que já não consigo enxergar o ponto onde eles se cruzaram.
A ausência, essa velha conhecida, dói de uma forma estranha. É como a dor fantasma de um membro perdido, sentida em um espaço que já não existe, mas que ainda pulsa, lateja, como se ainda estivesse ali. Tento seguir em frente, como quem reaprende a andar após um tombo doloroso, mas há dias em que a gravidade me puxa para trás, para dentro de mim mesmo, e o peso das lembranças me faz tropeçar em cada saudade, em cada rastro que ficou. O vazio, então, se instala como uma neblina densa, cobrindo cada fresta de luz, cada tentativa de enxergar além da perda.
Há um cansaço que se aloja fundo no peito, um cansaço de palavras não ditas, de desculpas que jamais pediremos, de abraços que nunca acontecerão. Às vezes me pergunto se é tarde demais para tentar refazer o que foi quebrado, para juntar os pedaços que restaram e costurar os fios desfiados do que um dia foi uma amizade. Mas, parte de mim, teimosa e esperançosa, ainda acredita que, de alguma forma, o universo possa conspirar a nosso favor, que um acaso improvável possa trazer de volta o que parecia perdido para sempre. Uma ligação inesperada, um encontro casual em uma esquina qualquer, que reacenda o que o tempo quase apagou.
Enquanto isso, carrego comigo as cicatrizes invisíveis de uma história que ainda lateja, que ainda queima sob a pele, mesmo sem ser vista. São marcas de um tempo que foi, mas que talvez jamais volte a ser. E eu sigo, por entre os dias, aprendendo a viver com um misto de saudade e aceitação, entendendo que alguns ciclos precisam, sim, se fechar para que outros possam começar.
Aprendi que nem toda despedida é definitiva, mas que, para seguir adiante, é preciso primeiro aceitar o fim. Que, por mais doloroso que seja, a aceitação é a chave que abre novas portas, é a luz tênue que nos guia por um caminho desconhecido, mas cheio de promessas silenciosas. E, de alguma forma, a esperança persiste, mesmo que seja apenas um fio frágil de luz em meio a um céu de nuvens escuras.
E eu sigo. Um passo após o outro, respirando fundo, desejando que, em algum lugar entre o fim e o recomeço, exista uma paz que me permita olhar para trás sem dor. Que me permita guardar o que foi bom e deixar o resto ir, como folhas que o vento leva para longe. Até lá, continuarei esperando pelo dia em que o peso diminua, e eu possa, finalmente, seguir sem olhar para trás.
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Quando os rios se desencontram.
PoetryExistem encontros que se dissipam como ondas no oceano, mas é no intervalo entre uma maré e outra que conseguimos escutar o que permanece dentro de nós.