A Bailarina Salvatore

Prólogo

  6 de outubro
   19:45
   Poderia ser quem fosse, se passasse pela rua mais afastada de Slizille, poderia ouvir músicas vindo de dentro do grande estúdio da banda Poets Of The Night. Os estalos e batidas da bateria de Vincenzo. As cordas do baixo de Claire. A melodia da guitarra de Takaki e a voz de Lily.

   Lily ia cantando os versos finais da música deixando a voz cada vez mais baixa até a última batida da bateria.

— Agora sim! — Claire exclamou assim que todos os sons cessaram. — Essa sem dúvidas foi a melhor passagem de dangerous de todas! — Andou até o canto do estúdio e guardou seu baixo em sua caixa.

   Claire Morgan era a baixista americana da banda. A garota tinha os cabelos negros que batiam na cintura e olhos azuis safira que contrastavam com sua pele branca e as bochechas levemente rosadas. Ela vestia um moletom preto com uma cereja desenhada e uma calça cargo verde musgo e vans pretos.

— Seu solo está cada vez melhor, meu príncipe. — Vincenzo disse se levantando da cadeira da bateria e andando até Takaki.

   Vincenzo Moreno era o baterista italiano da banda. Tinha pele marrom e olhos âmbar, o cabelo cacheado escuro cortado em um Mullet com um raio desenhado na lateral, o corpo forte. Ele vestia uma regata branca por baixo da jaqueta de couro preta e uma calça jeans larga e,  como todo ensaio, estava descalço.

— Obrigada, gatinho. — Takaki deu um selinho em Vincenzo.

   Takaki Yasujiro era o guitarrista japonês da banda. Tinha os cabelos negros presos e bagunçados cobrindo um pouco dos seus olhos puxados cinzas. Tinha pele branca, o corpo magro. Ele vestia um suéter de lã marrom e uma calça moletom um pouco mais escura que seu suéter, um tênis all star preto e luvas pretas que deixavam apenas seus dedos finos amostra.

— Parem de ser gays e vamos passar a próxima música logo! — Lily disse apertando alguns botões em seu microfone. — Sacrifice é a única música que não tem o baixo da Claire. Então já que ela vai embora, o casalzinho vai passar sacrifice comigo sim! — Ela cruzou os braços encarando o casal com uma sobrancelha arqueada.

   Lily McCartney era a vocalista britânica da banda. A garota tinha os cabelos castanhos ondulados na altura dos ombros e sua franja ficava um pouco acima dos olhos com heterocromia, um verde e um castanho. Sua pele era morena de sol e suas bochechas tinham sardas, "estrelinhas" como Claire gostava de chamar. Ela vestia uma blusa preta de manga longa e uma calça jeans marrom com uma casaco verde musgo amarrado em sua cintura. E como sempre, tinha os fones brancos pendurados no pescoço.

— Se acalma um pouco, McCarty — Vincenzo disse voltando para sua bateria. McCarty era o apelido que Vincenzo tinha dado para o sobrenome de Lily "McCartney".

— Tchau, gente — Claire disse acenando para todos já na porta com seu baixo às costas.

— Tchau, Claire — Vincenzo acenou.

— Tchau, amiga — Lily disse colocando o microfone de volta no suporte.

— Vai com cuidado, branquela — Takaki deu uma piscadela antes da garota sair pela porta.

   Claire trabalhava de vendedora no turno da noite. Afinal, suas condições financeiras não eram as melhores devido ao fato que, aos 15 anos, já tinha que se sustentar sozinha.

— Ficou irritada porque sua namoradinha foi embora, Lily? — Vincenzo provocou assim que viu Claire se afastando pela janela.

— Ela não é minha namorada. — Lily retrucou. Essas palavras a atingiam como adagas afiadas.

— Mas você queria — Vincenzo continuou.

— Escuta aqui seu — Lily foi interrompida pelos sons da guitarra de Takaki, o solo de guitarra que dava início a música.

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You know this is mine
mine
Sacrifice

   Lily cantava os últimos versos da música acompanhando o som da guitarra.

   Assim que terminaram de tocar a música e guardar os instrumentos, ele passaram um tempo conversando. Ao fim de tudo, Takaki e Vincenzo seguiam na direção oposta de Lily para chegar ao apartamento do casal.

   Lily caminhava sozinha pela rua vazia e molhada de chuva. A rua tinha pouca iluminação e não se via muitos carros, motos e nem mesmo bicicletas passando. Lily estava acostumada a fazer esse caminho diariamente voltando dos ensaios frenéticos da banda. Mas mesmo se acostumando, ela tinha medo de passar por uma parte específica da rua: a antiga residência Salvatore. A única coisa que a garota sabia do lugar era que, a grande mansão estava abandonada há alguns anos e era muito macabra. Lily passava pela rua observando a mansão atrás de um portão de grades chiques e pretas. Tinha dois andares grandes com as paredes brancas, agora muito sujas e lascadas. Ambos os andares tinham janelas com vidros quebrados e empoeirados. O telhado parecia ser feito de ébano ou algum material escuro como a noite.

   Analisando as janelas quebradas da mansão, Lily consegue enxergar o que seria uma luz fraca vindo de uma das janelas do primeiro andar da mansão. Curiosa como era, Lily hesita um pouco, mas então olha aos lados para ver se alguém vagava pelas ruas escuras e, concluindo que não havia ninguém aos arredores, a garota pula as grades pretas com um pouco de dificuldade. Ainda pensativa, a garota andava devagar até a janela de onde a luz vinha. Essa não seria a primeira vez que Lily fazia isso. Era a terceira vez consecutiva que Lily via a luz vindo da mansão e ia espiar.

   A garota olhou pela janela, e como das outras vezes, ela viu a silhueta escura de uma bailarina que dançava delicadamente. Lily não conseguia ver direito o rosto da bailarina, poderia não enxergar muito bem pela luz tão fraca, mas com certeza via as sapatilhas vermelhas intensas que se destacavam na luz fraca.

   Sempre que Lily via a bailarina, seu corpo formigava e ela sentia um frio na barriga. Sentia seu corpo inteiro se contrair e a cabeça doer levemente. A garota piscou lentamente e quando abriu os olhos novamente, a bailarina já não estava mais lá.

   Quem era aquela bailarina?
O que ela fazia alí?
Para onde tinha ido?

   Todas essas dúvidas martelavam na cabeça de Lily quando retomou o caminho de casa. Talvez essas dúvidas que tanto a perturbavam, nunca fossem respondidas.