Capítulo 34: Você é um babaca!

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Wyatt

O mercado estava praticamente vazio naquele horário da noite. Não era muito comum alguém sair pra fazer compras em um sábado a noite. Então tive todo o caminho livre pelos corredores pra pegar tudo que Taylor tinha em pedido. E tinha ficado feliz em ir sozinho, pra ter um pouco de sossego. Quando se cresce em uma família grande, você passa a valorizar o silêncio as vezes.

Não lembro dos meus pais verdadeiros. Não lembro se cheguei a viver com eles em algum momento da minha vida. Também não sei como eles se chamavam ou se estão vivos. Mas lembro de quando vivia em um orfanato cheio de outras crianças. Lembro dos quartos enormes cheios de beliche onde eu precisava dividir o espaço com várias outras crianças que não tinham mais ninguém.

Normalmente ninguém gosta de adotar uma criança mais velhas. Bebês sempre são a preferência de quem está tentando adotar. Mas acho que eu tive sorte, assim como meus irmãos, por termos sido escolhidos pelos nossos pais. Jasmine tinha sido a primeira a ser adotada. Mavie veio logo em seguida, depois o Joe e então a Taylor.

Quando eu cheguei, os quatro já estavam ali pra formar aquela família e eu tinha ganhado irmãos além de pais. Não gosto de pensar ou me lembrar da época que eu vivia em um orfanato. Eu ainda era muito pequeno quando fui adotado, mas me lembro de não me sentir feliz naquele lugar, porque não pertencia a ninguém. A nenhuma família. Porque me sentia sozinho.

Parei em frente a prateleira de doces, erguendo as mãos para esfregar a testa quando senti que estava começando a ficar com dor de cabeça. Precisava relaxar um pouco, porque aquelas últimas semanas estavam exigindo demais de mim, além de eu não conseguir parar de pensar em uma pessoa específica.

Olhei para a lista, vendo que Taylor não tinha especificado que doces queria. Mas eu conhecia o gosto da minha irmã, então escolhi o de sempre pra ela. Estava me afastando das prateleira quando esbarrei em alguém. Foi automático me virar para pedir desculpas, antes de ficar quieto quando vi quem era.

—Oi, Wyatt. Que bom ver você. —Brianna abriu um sorriso enorme, como se estivesse realmente feliz em me ver.

—Boa noite. —Soltei, acenando com a cabeça pra ela, porque não estava com vontade de ser simpático. E eu também não gostava de ser falso quando a pessoa em questão já tinha tentado me passar a perna.

—Que coincidência encontrar você aqui. A gente quase nem se fala nas aulas do teatro. —Comentou, apertando as mãos ao redor das alças da cesta de compras, como se estivesse nervosa. —Você está se saindo muito bem, sabia? Eu não fazia ideia de que você tinha tanto talento assim. Sempre acompanhei os seus jogos.

—Por que você me passou o número errado? —Questionei, vendo-a abrir e fechar a boca algumas vezes, como se tivesse sido pega de surpresa pela minha pergunta. Soltei uma risada, erguendo a mão para puxar meus cabelos para trás. —Aquele era o seu número, não é? Por isso ninguém me respondeu quando mandei mensagem aquele dia. Não demorei muito pra chegar a essa conclusão depois que percebi o que você tinha feito. Só não entendi porque você fez isso.

—Wyatt, foi sem querer. Eu juro que não foi por mal. Eu fiquei nervosa no dia da festa e acabei passando o meu número. —Afirmou, e eu revirei os olhos com aquela desculpa de merda. —Eu sempre fui muito sua fã e sei lá, não pensei direito. Fiquei com vergonha de dizer a verdade depois, quando você mandou mensagem.

—Não gosto de gente mentirosa, Brianna. —Falei, torcendo os lábios em resignação, porque a culpa também era minha por não ter pensado direito. Elisa era próxima de Hazel. Eu deveria ter falado com ela desde o início. —E também não gosto de gente tentando me sacanear.

—Eu não estava... —Ela parou de falar quando eu tombei a cabeça de lado e ergui as sobrancelhas. —Não acho justo Hazel conseguir tudo que quer.

—Não sou seu pai pra ficar ouvindo você resmungar sobre o que é justo ou não, só porque você não consegue aceitar a decisão dos professores. —Rebati, observando o rosto dela ganhar uma coloração vermelha, junto com uma expressão ofendida. —É melhor você não tentar me sacanear de novo, Brianna. E muito menos a Hazel.

—Você tá me ameaçando? —Questionou, e eu acabei soltando uma risada, enquanto negava com a cabeça, porque ela com certeza não fazia ideia do que era ser ameaçada. —Eu posso reclamar com a professora do teatro, sabia?

—E eu posso fazer você virar piada na universidade toda. —Retruquei, abrindo um sorriso gentil pra ela, que eu sabia que ia a atingir mais do que qualquer coisa. Pelo menos ela tinha parado de tentar fingir que não tinha feito aquilo de propósito. —Quem você acha que vai ganhar mais? A garota que não consegue papel em nenhuma peça ou o melhor jogador do time de basquete?

—Você é um babaca! —Exclamou, e dessa vez meu sorriso foi totalmente genuíno, porque ela não era a primeira pessoa a me chamar daquilo e provavelmente não seria a última.

—Eu sou mesmo, Brianna, e é por isso que as pessoas costumam pensar bastante antes de tentar me sacanear. —Afirmei, inclinando meu rosto para perto dela, porque eu sabia que na maioria das vezes eu intimidava as pessoas pra valer, mesmo quando não era minha intenção. E aquela garota estava merecendo um pouco disso, porque falsidade me irritava. —Vejo você na próxima aula.

Desviei do corpo dela para seguir em frente, sabendo que ela provavelmente estava me xingando das piores coisas possíveis naquele momento. Brianna parecia ser aquelas pessoas que estão acostumadas a ganhar tudo em casa e bater o pé quando recebem um não fora dela. Mas eu não tinha nada a ver com isso e Hazel muito menos.

[...]

Abri a porta de casa, fechando ela com o pé por conta das sacolas de compras nos meus braços. As conversas estavam altas na sala, assim como as risadas animadas. Abri um sorriso, porque reconheci uma voz específica que eu tinha sentido muita falta. Quando atravessei o corredor e cheguei na sala, Joe já estava no meio do caminho pra me encontrar, como se tivesse me visto chegando. Lívia, a esposa dele, estava sentada no sofá com Henry no colo, provavelmente o enchendo de presentes.

—Cara, você não vai parar de crescer mais? Já está ficando maior do que eu. —Joe brincou, me abraçando apertado quando deixei as compras no chão. Soltei uma risada contra o ombro dele, lembrando da última vez que tínhamos nos visto antes de Joe ir viajar.

—É bom ter você em casa de novo. —Falei, me afastando para olhar pro meu irmão. Joe tinha raspado os cabelos, o que o deixou com uma aparência muito mais nova. Ele tinha 31 e era um ano mais novo que Mavie, mas as vezes eu tinha a sensação que ele era o mais velho de nós.

—Eu sempre vou voltar. Não consigo ficar muito tempo longe sem morrer de saudade de todo mundo. —Afirmou, com um sorriso enorme nos lábios enquanto bagunçava meus cabelos. —Ouvi dizer que temos algumas novidades aqui.

—Você nem faz ideia. Tenho muita coisa pra te contar. —Falei, sabendo que preferia fazer isso antes que qualquer um dos meus irmãos fizesse primeiro.


Continua...

O último ato do jogo / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora