— Vamo visitar o maninho.
— O seu irmão militar? — perguntou Kyoto.
— Esse mesmo.
— Sabe que ele não vai emprestar barco nenhum pra gente, né? — declarou Calebe.
— Não penso assim. — Catupi se sentou e olhou para Bruna, que estava sentada no banco da frente. — Ei, Bruna, seu pai é policial, né?
— É sim.
— Agora que você sabe de tudo, pergunta pra ele o que a polícia vai fazer em relação a terem achado um corpo falso. Pode fazer isso?
— Posso.
Calebe olhou para Bruna.
— E aí, como se sente depois dessa aventura?
— Com vontade de te dar um tiro, sempre me sinto assim.
— Ah, qual é, você gostou, não foi?
— Odiei.
— Eu me amarrei.
— Uma taxa de 50% de sucesso — intrometeu-se Catupi, no banco de trás. E mordeu um pedaço de rapadura que pusera na mochila.
Calebe a ignorou e tornou a encarar Bruna.
— Pois eu acho que tu...
— Não se expresse em voz alta, isso diminui meu bom humor.
E ela ligou o rádio para não ter que escutar a voz dele caso falasse mais algo.— Num me arrependo nem um pouco de ter roubado as goiabas da goiabeira da tua casa. — falou Calebe após um resmungo, baixinho, para ela não escutar.
Mas Bruna escutou.
— Então era você!
Uma chuva fraca e gentil começou a banhar a estrada de asfalto.
Kyoto havia tirado quase toda a pintura do rosto; quando foi passar o demaquilante perto da têmpora, murmurou um gemido de dor, pois estava ferida. Catupi parou de cantarolar a música que escutava e olhou para o rapaz.
— Foi na hora que o vidro quebrou? — ela perguntou, passando o dedo para limpar o sangue que escorreu no rosto dele.
— Aí — disse com a voz fanha. — Você tocou na ferida.
— Foi mal, vou pegar sua maleta tá? — lamentou ela, pegando a maleta de primeiros socorros na mochila dele. — Mas na real, eu nem te toquei.
— Não? — Ele levantou as sobrancelhas e fez uma cara de “A, vá, conta outra”, o que lhe custou a dor ardente na têmpora triplicar.
Ela pegou algodão e começou a tratar o pequeno ferimento.
— O que você sentiu foi a força de repulsão dos elétrons que se equilibraram com a força de repulsão da minha mão te tocando.
— O quê? — perguntou o garoto interessado, um tanto esquecido da dor que sentia.
— Pega a visão... As nossas mãos são feitas de átomos que têm um núcleo de carga positiva orbitados por elétrons de carga negativa, cê tá ligado né? — começou ela, distraindo-o de propósito da ferida que estava sendo pressionada pelo algodão.— Como cada elétron tem carga negativa e cargas iguais se repelem, então dois elétrons sempre se repelem. Ou seja, o que você sentiu foram os elétrons se repe...
Mas pela primeira vez o rapaz não conseguiu prestar atenção no que ela dizia. O som da música no fundo e a chuva gentil pareciam ter abafado também. Enquanto ela colocava um curativo em sua têmpora, Kyoto fitou os olhos verdes claríssimos, como se a força de atração entre as cargas opostas dos seus átomos o puxasse para mais perto dela, e não pensou no que pronunciaria, somente disse, com uma suavidade certeira:
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Intrépida: a relíquia do inventor
Phiêu lưuHá dois anos, um ex-arqueólogo desvendou um enigma intrigante em um museu, deixado por um inventor famoso, sem suspeitar que isso desencadearia uma série de conflitos que mudariam vidas para sempre. Sua filha, Catupi Reis, uma garota intrépida de 1...