O socorro não tardou a chegar, eu, toda suja, o acompanhei até onde pude, estava aos prantos. Não sabia o que fazer, o que pensar. Também não demorou muito para saber, o médico se retirou lamentando-se da perda. Eu fiquei inconsolável. Não parecia real, nada ali parecia real. Eu caí no chão sentada, chorando muito. Meu peito doía profundamente, eu o apertava, querendo de alguma forma, segurar meu coração, mas não adiantava.
Algumas pessoas se aproximaram de mim e me abraçaram, mas não consigo me lembrar o nome de nenhuma delas. Eu estava tão sozinha. Tão perdida sem ele. Olhei minhas mãos cheias de sangue e as beijei. Aquilo era o que restou dele em mim. Eu me abracei escondida no canto da sala branca de hospital. Meu vestido cheirava a sangue, eu cheirava a sangue, eu cheirava a ele.
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Olhei sua mão limpa e gelada. Depositei ali um beijo e a deixei onde estava. Toquei no lugar onde havia a ferida e me senti fraquejar. Senti um corpo quente me segurar forte. Eu fechei os olhos e me deixei carregar.
"Jake..." Eu dizia entre soluços. "Jake, o que vou fazer sem ele?"
"Mai, você consegue. Nós sabemos disso."
"Eu tinha tantas coisas para dizer à ele, Jake. Tantas coisas para viver juntos. Foram tantas palavras perdidas, que jamais vou poder dizer." Falei, ainda de olhos fechados. Soltei meu peso sobre ele, minhas pernas já não aguentavam mais.
"Mai, não, ele quer te ver, ele quer te ver de pé." Ele me segurava sobre seu corpo. "Ele te amava tanto."
"Eu o amo tanto." Eu sussurrei antes de sentir tudo escurecer.
Quando despertei, vi os olhos de mamãe preocupada e os de Olívia logo em seguida.
"Alfonso" Me levantei e me vi numa sala pequena e pouco iluminada. "Cadê ele?"
"O enterro está para acabar. Devem estar cobrindo ele" Minha mãe falou. Eu arregalei os olhos e desci rápido da cama improvisada, logo senti tudo girar. "Madison, minha filha não..." Ignorando o que meu corpo e o que minha mãe dizia, eu levantei por completo e saí da pequena sala. Eu estava andando, logo correndo.
As lágrimas vinham rápido e, enquanto eu corria pelos jardins bem cuidados, lembranças invadiam minha mente e me faziam de impulso. Seu sorriso apareceu para mim dentro da minha cabeça e abri os olhos, encontrando a multidão logo a frente. Todos me olhavam chegar. Eu, com a respiração ofegante, caí de joelhos perto do buraco quase coberto.
"Poncho, meu amor" Murmurei. "Não me deixe, meu amor"
Eu fiquei ali, observando, deixando tudo acontecer. Não havia mais nada que eu podia fazer. Eu ouvia algumas lamúrias, vinham pessoas perto de mim e falavam algo, mas eu não conseguia ouvir. Eu só pensava nele. No vazio do meu peito apenas sentia meu coração bater lentamente, bem lentamente.
Eu nunca fui rica, nem muito pobre, mas sempre tinha tudo o que eu queria. Pessoas que eu amava e pessoas que me amavam perto de mim. Nunca fui popular. Sempre fiquei na média, nunca a maioria, nunca ímpar, sempre par. Eu tinha amigos, eu tinha um amor, uma família. Mas o mais importante que eu tinha na minha vida, era ele. Era meu viver, meu respirar, meu amar. E agora ele havia ido.
Eu me levantei e abri os olhos, pude ver a sombra de alguém do meu lado. Era Jake, e, logo atrás dele, Olívia. Ele me abraçou forte enquanto ela fungava atrás dele.
"Você vai ficar bem" Ele sussurrou em meu ouvido.
"Eu sei. Só não sei quando."
Ao voltar para casa, senti que eu deveria por para fora um pouco do que sentia, do contrário iria enlouquecer. Apanhei meu velho caderno de notas e comecei a rabiscar algumas palavras.
"Sabe para onde vão as palavras que não são ditas?
Para onde vai o que quer fazer e não o faz?
Para onde vai o que quer dizer e não diz?
Para onde vai o que não se permite sentir?
Gostaríamos que o que não dizemos caia no poço do esquecimento, mas o que não dizemos se acumula no corpo, enche nossa alma de gritos mudos.
O que não dizemos se transforma em insônia, em dor de garganta.
O que não dizemos se transforma em nostalgia, em destempo.
O que não dizemos se transforma em erro.
O que não dizemos se transforma em dever, em dúvida, em coisas a fazer.
As palavras que não dizemos se transformam em insatisfação, em tristeza, em frustação.
O que não dizemos se transforma em trauma, em veneno que mata a alma.
O que não diz te prende no passado.
O que não dizemos se transforma em ferida aberta.
E, por não aguentar mais aguentar prender as palavras, eu te escrevo, meu amado Alfonso. Eu te amo e sinto que sempre vou te amar. Eu deveria ter te dito isso mais vezes, mas agora que você se foi, apenas os pensamentos restam."
FIM
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Palavras Que Não Pude Dizer (Conto)
FanfictionMaite está passando pelo dia mais difícil de sua vida, Alfonso se foi e ela já não sabe o que faz com as palavras que ficaram guardadas dentro de si e ela se pergunta: Para onde vão as palavras que não foram ditas?