𝙲𝚊𝚙í𝚝𝚞𝚕𝚘 𝟸𝟽 ‒ É 𝚎𝚕𝚊!

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Ele suspirou aliviado.

Lucy chegou bem perto da garota com a flecha e murmurou perto de seu ouvido, tocando em seu ombro:

— Eu conheço ele, tá tudo bem.

A garota alta virou seu tronco de frente ao de Lucy e removeu o pé do corpo do rapaz de má vontade, sem tirar os olhos dela.

— Tens sorte que gosto de ti — disse em português com um forte sotaque.

Lucy ajudou-o a levantar e então se abraçaram. A garota alta — que na verdade não era tão alta, Kyoto apenas estava deitado e as outras duas garotas indígenas que eram baixas —  olhou para o lado e crispou os lábios.

— Acho bom ele não ter a ver com o cara que aqui veio esta semana e levou metade de nosso povo.

"Esta semana?" Indagou o rapaz. "Levou metade do nosso povo?"

* * *

Catupi entrou pelo caminho que seu amigo fora, mas lá havia mais uma bifurcação, e mais uma vez escolheu o lado esquerdo e seguiu seu rumo.

Um suspiro de exaustão saiu de sua boca, e após andar mais um pouco, fez uma pausa. Ao som do silêncio da floresta profanado apenas pelo canto do grilo, ajoelhou-se e tirou uma garrafa de água da mochila. Se levantou para voltar e tentar o outro caminho.

De repente, um braço envolveu seu pescoço, aplicando um mata-leão sem qualquer aviso. Sua audição não era tão aguçada quanto a de Kyoto, o que a deixou vulnerável, a fazendo não prever a chegada de alguém.

Catupi reagiu rapidamente, mordendo o braço do atacante com toda a força. Em seguida, desferiu uma cotovelada no agressor, determinada a se libertar. 

Ela se afastou e apressou-se, mas não foi longe, pois ao correr, escorregou e caiu em uma poça d’água pequena e rasa. 

Catupi começou a se arrastar para longe dele. 

Estando prestes a se levantar, o rapaz desconhecido a pegou pela cintura e a arremessou para o lado. Mas Catupi se levantou, ele também, e assim se encararam. Era um rapaz alto com cabelos longos; teve certeza de que nunca o viu antes. 

Ela estava se afastando para trás quando ele veio com o punho cerrado para acertá-la. Catupi desviou 2 vezes, mas na terceira ele acertou seu rosto impiedosamente.

* * *

Kyoto — ainda distante de Catupi — explicou a situação para Lucy, contando como se perdeu da amiga.

— Precisa me ajudar a procurar Catu.

Lucy convenceu as 2 garotas a irem ajudar e a terceira voltou para a comunidade avisar que as outras iriam demorar a chegar. Uma delas cumprimentou Kyoto com um aceno de mão meigo.

Os 4 entraram pelo caminho esquerdo. Andaram bastante e... nada.

— Tô começando a achar que essa tal Catupi é imaginária — disse a garota alta.

— Uyara! — advertiu Lucy.

— Ela é bem real, ok, precisa conhecê-la, ela é... —  Os ombros de Kyoto desmoronaram. — espetacular.

As últimas palavras dele soaram como se seu corpo estivesse entorpecido. Uyara comentou:

— Isso soa romântico.

Kyoto olhou para o chão, comprimindo os lábios, e retomou a chamar o nome da vizinha.

— CATU!... CATU!

* * *

Quando o desconhecido socou Catupi, ela não teve tempo de lamentar a dor ardente que fez seus olhos lacrimejarem e seu nariz longo sangrar, deu logo um soco na face dele também, com mais força, tanta que o fez cambalear para trás e cair.

O rapaz levantou-se rapidamente e veio com tudo, empurrando a garota, fazendo-a cair nas águas rasas.

Subiu em cima dela e pôs as mãos em seu pescoço. Ela lutava com desespero para sobreviver, mas estava difícil sair dali, tateou o chão para ver se encontrava algo para colidir na cabeça do agressor. 

Não encontrou nada. 

Sua respiração falhou, e seu rosto assumiu um tom rubro. Sua força se foi, e o último resquício de ar abandonou seus pulmões. 

— CATU! 

Ouviu uma voz, profunda e sutilmente grave, a voz do Kyoto.

Parecia estar muito distante, e sentiu por um segundo aliviada e feliz por ouvir aquela voz, mas era tarde. O desconhecido tirou as mãos de seu pescoço, mas não parecia arrependido. Em seguida, antes que ela pudesse fazer mais do que respirar com desespero, ele desferiu outro soco em rosto. 

Ela apagou.

* * *

Após Kyoto gritar pela última vez, Lucy tocou em seu ombro, fazendo-o voltar.

— Acho melhor a gente ir.
Ele obedeceu.

* * *

Catupi estava sendo carregada pelo rapaz que a apagou. Ele a soltou no chão de uma clareira, seu corpo bateu contra o chão coberta de folhas secas e alguns galhos quebrados. A dor a fez acordar.

Com seu corpo úmido coberto de suor e sujeira, estava tonta, seu nariz comprido sujo de sangue, os olhos ligeiramente avermelhados pelo enganamento e sua cabeça martelava de dor.

Demorou alguns segundos para assimilar a situação, olhou ao redor com uma expressão de desentendimento que a fez aparentar estar bêbada. 

Havia vários homens por perto, todos com traços indígenas, a maioria com suas armas — lanças, tacapes, zarabatanas e arcos com flechas. Ao olhar para trás, viu o rapaz que quase a matou.

— Olha só o que temos aqui — disse outro rapaz, este mais esguio.

Ele se aproximou dela, e Catupi, com suas mãos, foi se afastando para trás até se encostar no tronco de uma árvore.

— Se tomar um banho, até que dá pro gasto — disse em português bom, passando sua mão no queixo dela.

O olhar dela estava no chão até ele levantar sua cabeça. 

Ela o ameaçou com o olhar, sua garganta dolorida demais para fazer isso.

Ele pôs a mão em sua mandíbula e deslizou para baixo, mas quando chegou um pouco abaixo do pescoço, Catupi agarrou a mão dele, apertou com uma força que achara ter sumido e a entortou, fazendo-o gritar de dor.

— Sua vadia!

Ele a deitou no chão e levantou seu punho para bater nela, mas foi interrompido por uma voz autoritária.

— Iataí! Sem confusão! — vociferou um homem que parecia ser um líder. Seu corpo robusto e sua presença imponente. — Olhe bem... É ela!

Sussurros se espalharam entre os homens.

Alguém perguntou para o líder, ou melhor, o cacique:

— O que vamos fazer?

— Vamos fazer o que ele disse para fazer.

Intrépida: a relíquia do inventorOnde histórias criam vida. Descubra agora