capítulo 32.

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Carla Maraisa
˚.

Os jardins de Monet em Giverny eram mais bonitos do que eu havia imaginado. Eu passava o tempo caminhando pelo lugar, respirando as flores e apreciando a vista. Naqueles jardins, eu me encontrei de novo. Estar cercada por tanta beleza me lembrava dos olhos de Sophia, do sorriso torto de Marília, da nossa casa. Ao andar por um caminho pavimentado de pedras, sorri para algumas pessoas que visitavam os jardins. As vezes, eu imaginava de onde elas vinham. O que tinha acontecido para que estivessem ali no mesmo momento? Qual era a história delas? Elas já haviam amado? O amor as havia consumido? Elas tinham sido abandonadas?

- Docinho. - Senti um aperto no peito ao ouvir aquela palavra e reconhecer aquela voz. Eu me virei, e meu coração teve um sobressalto quando vi Mari. Eu queria ir até ela, mas meus pés não se moveram. Meu corpo não me obedeceu. Então continuei imóvel, assim como minha irmã.

- Eu... - começou Mari com a voz entrecortada. Ela segurava um envelope junto ao peito com força e fez uma nova tentativa. - Ela me disse que você estaria aqui. Que você visitava esse lugar todos os dias. Só não sabia o horário. - Permaneci em silêncio. As lágrimas brotaram nos olhos de Mari, e ela fez o possível para se manter firme. - Sinto muito, Maraisa. Sinto muito por ter perdido a cabeça. Por ter afastado você. Só quero que saiba que terminei tudo com o Ulísses. Uma noite, eu estava deitada ao lado dele na cama, e ele me abraçava bem apertado. Ele me mantinha bem junto de si, mas eu tinha a sensação de que não deveria estar ali. Toda vez que ele dizia que me amava, eu me sentia cada vez menos eu mesma. Estive tão cega para a verdade que deixei que o medo me guiasse de volta para os braços de um homem que não me merecia. Estava tão preocupada em ser amada que nem me importei se eu correspondia ao sentimento. E, então, eu afastei você, a pessoa que tem sido a única constante na minha vida, e não consigo acreditar que te magoei daquele jeito. Você é a minha melhor amiga, Maraisa, você é o meu coração, e eu sinto muito, sinto muito. Eu... - Ela não teve tempo de dizer mais nada antes que eu a puxasse para perto de mim e a abraçasse. Ela chorou copiosamente no meu ombro.

- Sinto muito, Maraisa. Sinto muito por tudo.

- Shhh - sussurrei, abraçando-a ainda mais forte.
Você não tem ideia de como é bom te ver, Florzinha. - Ela suspirou, o alívio percorrendo o corpo.

- Você não tem ideia de como é bom te ver, Docinho.
Depois de algum tempo para nos recuperarmos, caminhamos por uma das muitas pontes dos jardins e nos sentamos. Ela me entregou o envelope.

- Ela me pediu que entregasse isso. E disse que eu não deveria deixá-la sair dos jardins antes de ler cada página.

- O que é?

- Não sei - respondeu ela, levantando-se. - Mas fui instruída a dar um tempo para que você leia. Vou explorar o lugar e encontro você aqui quando terminar.

- Tudo bem.

Abri o envelope, e dentro dele havia um manuscrito com o título A história de M. Dias Mendonça Inspirei fundo: a autobiografia dela.

- Ah, e Maraisa? - chamou Mari, fazendo-me erguer os olhos das páginas. - Eu estava errada sobre ela. O modo como ela te ama é inspirador. E o jeito como você a ama é de tirar o fôlego. Se um dia eu tiver a sorte de sentir pelo menos um quarto do que vocês sentem uma pelo outra, vou morrer feliz. - Quando ela se afastou, respirei fundo e comecei a ler o primeiro capítulo. Cada um deles fluía sem dificuldade. Cada frase era importante. Cada palavra era necessária. Eu li a história de uma mulher que se tornou um monstro e que, aos poucos, havia aprendido a amar de novo. Então cheguei ao último capítulo.

O casamento

As palmas das mãos dela suavam enquanto sua irmã, Karla, ajeitava sua gravata. Ela nunca imaginou que poderia ficar tão nervosa ao tomar a melhor decisão de sua vida. Ela também nunca imaginou que um dia se apaixonaria por ela.
Uma mulher que sentia tudo. Uma mulher que havia mostrado a ela o que era viver, respirar, amar. Uma mulher que tinha se tornado a sua força nos momentos mais sombrios. Havia algo romântico no modo como ela encarava o mundo, como ela dançava na ponta dos pés e ria sem se importar de parecer ridícula. Havia algo muito verdadeiro em seu olhar e em seu sorriso. Aqueles olhos. Ah, ela poderia fitar aqueles olhos pelo resto da vida. Aqueles lábios. Ela poderia beijar aqueles lábios pelo resto dos seus dias.

- Você está feliz, Marília? - perguntou Mary, sua mãe, ao entrar no cômodo para ver os olhos da filha brilhando de animação. Pela primeira vez na vida, a resposta veio sem dificuldade.

- Sim, estou.

- Está pronta?

- Estou.

Ela deu o braço a ela, e Karla fez o mesmo do outro lado.

- Então vamos lá buscar a garota.

Ela seguiu pelo corredor principal até o altar, e ali esperou que sua eternidade se juntasse a ela. Mas primeiro, vinha a filha. Sophia caminhou pelo corredor em seu lindo vestido branco, rodopiando e jogando pétalas de rosas pelo caminho. Seu anjo, sua luz, sua salvadora. Quando chegou ao altar, correu até o mãe e a abraçou bem apertado. Ela a pegou no colo, e as duas esperaram. Esperaram que ela se juntasse a elas. Que aqueles olhos encontrassem os olhos delas. Quando isso acontecesse, Marília certamente ficaria sem fôlego.
Ela estava linda, mas isso não era surpresa. Tudo nela era deslumbrante, real, forte e gentil. Vê-la caminhando em direção a ela, em direção à nova vida delas, fez com que algo mudasse dentro de Marília. Naquele momento, ela prometeu dar tudo de si a ela, até mesmo as rachaduras em seu coração. Afinal, era por elas que a luz entrava.
Quando finalmente ficaram diante uma do outra, as duas entrelaçaram as mãos como se fossem uma só. Quando chegou a hora, ela pronunciou as palavras que havia sonhado em dizer.

- Eu, Marília Dias Mendonça, te recebo, Carla Maraisa Henrique Pereira, como minha esposa. Prometo tudo a você: meu passado conturbado, meu presente cheio de cicatrizes e o meu futuro. Sou sua antes de ser minha. Você é minha luz, meu amor, meu destino. Ar acima de mim, terra abaixo de mim, fogo dentro de mim, água ao meu redor. Eu te dou toda a minha alma. Eu me entrego inteiramente a você. Então, com todos os clichês possiveis, elas viveram felizes para sempre.

Fim.

Fiquei um tempo ali, olhando aquelas palavras, emocionada.

- Ela escreveu um final feliz - sussurrei para mim mesma, perplexa. Marilia nunca tinha escrito um final feliz.

Até me conhecer.
Até nós ficarmos juntas.
Até agora.

Eu me levantei da ponte e corri para encontrar minha irmã.

- Mari, precisamos voltar.

Ela deu um grande sorriso e fez que sim com a cabeça.

- Esperava que você dissesse isso. - Ela tirou do pescoço o cordão com o pingente em forma de coração que minha mãe havia me dado e o colocou em mim

- Agora vamos. Vamos para casa.

A Força que Nos Atrai - Malila.Onde histórias criam vida. Descubra agora