05 - Cartas

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Depois de semanas enviando poemas e flores, percebi que Enid estava cada vez mais envolvida no mistério. Sua curiosidade aumentava a cada gesto, e o desconhecido admirador secreto ocupava grande parte de seus pensamentos. No entanto, eu sabia que, se quisesse conquistar seu coração completamente, precisaria ser mais direta. Não revelando minha identidade de imediato, claro, mas deixando uma pista clara de quem estava por trás de tudo.

Foi então que a ideia das cartas me ocorreu. Não bilhetes curtos ou poemas enigmáticos, mas cartas verdadeiras. Algo mais íntimo, mais revelador, que a fizesse entender o que eu sentia por ela. A assinatura seria "A", uma forma sutil de conectar ao meu sobrenome. Só quando estivesse pronta, ela descobriria o verdadeiro significado.

Peguei meu caderno e escrevi o próximo item da lista:

4. Cartas

Na primeira carta, eu queria expressar o que realmente sentia, mas da minha forma. O amor não era algo que eu compreendia plenamente, nem algo que quisesse entender. No entanto, quando se tratava de Enid, havia algo diferente. Um desconforto que eu não conseguia ignorar. E era isso que eu precisava transmitir.

"Enid,
O amor, para mim, sempre foi algo estranho. Uma emoção desnecessária, confusa e cheia de complicações. Algo que os tolos perseguiam, acreditando que poderiam encontrar felicidade duradoura. Mas então você apareceu. E o desconforto que senti ao seu redor não era algo que eu pudesse simplesmente ignorar.
Você, com suas cores vibrantes, sua luz, seus sorrisos irritantemente constantes... você me perturbou de uma forma que ninguém jamais conseguiu.
Esta é a primeira de muitas cartas. Eu sou 'A'. Alguém que te observa, de longe, mas que sente algo profundo e, talvez, indesejado.
A."

Deixei a carta na mesa dela antes que Enid acordasse, como fiz com os bilhetes anteriores. O impacto foi imediato. Quando encontrou o envelope simples, selado com um "A", seus olhos brilharam de surpresa. Ela abriu o envelope com cuidado, seus dedos tremendo levemente.

Observei de longe, fingindo indiferença, enquanto ela lia cada palavra com atenção. Seu rosto se transformou em um misto de curiosidade, confusão e, de alguma forma, carinho.

— 'A'...? — ela murmurou para si mesma, franzindo o cenho. — Quem será?

Yoko, sempre ao lado de Enid, deu de ombros, sem muito interesse.

— Talvez seja algum admirador secreto tentando parecer misterioso. Você já recebeu flores e poemas, então não me surpreenderia.

— Mas isso... — Enid hesitou, segurando a carta com delicadeza. — Isso parece tão... sincero. Como se fosse alguém que realmente me conhece.

Eu permaneci em silêncio, satisfeita com o rumo que as coisas tomavam.

Na segunda carta, aprofundei o sentimento, tentando capturar o que era estar ao redor de Enid sem ser notada, observando cada detalhe, mas nunca deixando que ela visse o que eu realmente sentia. Era como um diário de uma paixão escondida, algo que apenas eu e "A" conhecíamos.

"Enid,
Você vive no meio de uma tempestade de cores, tão cheia de vida, tão cheia de luz. Eu, por outro lado, observo de longe, habitando o escuro. O contraste entre nós é inegável. Você é tudo o que eu nunca quis, mas tudo o que não consigo deixar de admirar.
É estranho estar ao seu lado, tão perto, e ao mesmo tempo, sentir uma distância infinita. Suas risadas ecoam em meus ouvidos, como se estivessem tentando me puxar para um mundo que não me pertence. Mas ainda assim, continuo observando. Talvez porque, no fundo, quero ser puxada.
A."

Deixei a segunda carta no bolso da jaqueta preferida de Enid. Quando ela a encontrou, foi impossível não notar sua reação. Dessa vez, ela estava sozinha no quarto, e ao abrir o envelope, pude ver o sorriso suave em seus lábios. O sorriso que apenas ela conseguia dar. Aquele que eu sempre fingia ignorar, mas que, secretamente, me fascinava.

Enid leu a carta lentamente, como se saboreasse cada palavra. Eu sabia que ela estava começando a entender que essas cartas eram mais do que simples gestos românticos. Elas carregavam uma verdade que, se ela prestasse atenção, perceberia que vinha de alguém que estava mais perto do que ela imaginava.

Para a terceira carta, decidi ser mais honesta, permitindo que as palavras expressassem algo mais profundo. Não revelaria minha identidade, mas deixaria claro que o sentimento que eu tinha por ela era mais do que uma simples admiração à distância. Era algo que me consumia de uma maneira que eu não podia controlar.

"Enid,
O que você faz comigo é... inexplicável. Eu, que sempre mantive o controle de tudo ao meu redor, me vejo desarmada quando estou perto de você. Não deveria ser assim. Eu deveria conseguir manter minha distância, meus sentimentos sob controle. Mas você, com seu jeito caótico e brilhante, tem a capacidade de desestabilizar tudo.
Eu sei que, no fundo, nunca poderei existir no mesmo mundo que você. Somos opostos demais. Mas isso não muda o que sinto. Ver você, ouvir sua voz, observar como se move pelo mundo... tudo isso me afeta de uma forma que eu não queria. E ainda assim, aqui estou.
A."

Enid encontrou essa carta enquanto estava sentada no gramado da escola, aproveitando o sol da manhã. Quando abriu o envelope e começou a ler, sua expressão mudou. Ela ficou mais séria. Era como se estivesse começando a perceber a profundidade do sentimento que "A" nutria por ela.

Ela olhou ao redor, como se tentasse encontrar alguma pista, mas eu estava, como sempre, longe o suficiente para observar sem ser vista.

Já estava na quarta carta. Eu precisava começar a preparar Enid para a revelação. Sabia que não poderia esconder minha identidade para sempre, e essa carta seria o primeiro passo em direção a isso. Seria uma provocação, uma pista sutil que a fizesse questionar ainda mais quem poderia ser "A".

"Enid,
Cada dia que passo observando você, percebo que estou ficando mais próxima de revelar quem sou. Não posso continuar escondida para sempre. Há uma parte de mim que quer se manter nas sombras, mas outra parte... quer se aproximar.
Eu sei que, se soubesse quem sou, talvez se surpreendesse. Ou talvez, de alguma forma, já saiba.
Eu sou 'A', mas isso é apenas uma parte de quem realmente sou. A questão é: você está pronta para descobrir o resto?
A."

Enid leu a quarta carta com uma expressão completamente diferente. Havia algo mais intenso em seu olhar, como se estivesse prestes a desvendar o mistério. Ela segurou o papel com força, quase como se quisesse extrair mais informações do que as palavras que estavam ali. E então, ela murmurou algo para si mesma.

— Quem é você... e por que parece tão familiar?

Eu sabia que estava próxima. Ela estava começando a fazer as conexões. Mas ainda não era o momento certo para revelar tudo. Havia mais passos a seguir, mais peças do quebra-cabeça a serem colocadas.

As cartas haviam cumprido seu papel. Enid agora estava profundamente envolvida no mistério de "A". Sabia que quem quer que fosse estava mais perto do que imaginava, e, ao mesmo tempo, estava fascinada pela profundidade das emoções que essas cartas traziam. Eu estava jogando um jogo perigoso, mas o controle ainda era meu.

A questão agora era simples: quanto tempo mais eu poderia permanecer nas sombras antes que Enid finalmente percebesse quem eu era? E, quando isso acontecesse, estaria ela preparada para aceitar o que eu sentia?

Ninid é mais lerda que eu, fato.

Hey, Sinclair. | WenclairOnde histórias criam vida. Descubra agora