Amnésia

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DULCE MARIA SAVIÑON

Dias atuais

– Christian? – Chamo, assim que abro a porta da sua sala e o encontro jogado em uma cadeira reclinável, atirando uma bola pra cima, claramente entediado.

– Veja só se não é a Rainha e o Rei do Apocalipse – cantarola e se senta ereto, sorrindo para nós dois. – Quebrem meu ócio. O que precisam? Uma bomba? Um míssil? Um batom que tem laser e pode furar a retina dos outros? Um teletransportador?

– Uma escuta – Christopher o interrompe antes que ele nos ofereça um sabre de luz ou um disco voador. – Discreta.

Toda a animação de Christian se esvai.

– Discreta pra você? – Ergue a sobrancelha.

– Pra mim – respondo e ele pressiona os lábios, pensado.

– Bom, Saviñon, eu tenho uma coisa – diz e se empurra para trás sobre as rodinhas da cadeira. – Mas ainda está em teste.

– Então, não – Luís decreta, cruzando os braços e se apoiando no batente da porta – Quero algo confiável. Não vou correr o risco de perder comunicação com ela.

Christian estala a língua e revira os olhos, puxando uma pequena caixa de vidro de dentro do cofre.

– Está em teste, mas foi criada por mim, Uckermann, então no mínimo, é algo bom pra caralho – se defende e volta deslizando até onde estou parada, me mostrando um piercing em formato de ferradura com duas esferas prateadas na ponta. – Escuta e rastreador.

– Por que tá em teste? – questiono, sem realmente acreditar que haja uma escuta dentro de algo tão pequeno.

– Culpa do meu perfeccionismo – responde, ficando em pé. – Acho que consigo aumentar a sensibilidade da escuta e a precisão do rastreador. Mas os testes iniciais foram satisfatórios – continua, caminhando até um corpo com água e jogando o piercing dentro. – É a prova d'água. –Ele o tira de dentro do copo, antes de coloca-lo sobre a mesa e bater com um peso de papel. – A prova de impacto.

Olho para Christopher, que parece tão surpreso quanto eu com a genialidade de Christian, mesmo que já estejamos juntos há anos.

– Ele é a prova de curtos – acrescenta, pegando um teaser disfarçado de celular e pressionando-o contra o piercing. – Recarrega com luz solar e... É ligado e desligado remotamente. – conclui, voltando a nos olhar.

– Qual a precisão? – Luís pergunta.

– Cinquenta metros quadrados para o rastreador e... – ele reflete um pouco, então suspira, balançando a cabeça. – Não vai adiantar ou tentar explicar a distancia e os decibéis, então, pensem que uma pessoa falando em tom de voz normal pode ser ouvida até dois metros de distância.

No começo, quando ele e Maite chegaram, precisávamos pedir que repetissem tudo o que diziam, traduzindo para língua das pessoas normais, como eu e Luís. Hoje em dia, eles já vão direto a explicação.

– A escuta ainda está em teste porque acho que consigo aumentar a sensibilidade dela para mais uns três ou quatro metros – explica – Mas, de resto, ela tá pronta pra uso.

Mais uma vez, troco olhares com Christopher e nós dois damos de ombros, antes que eu assinta e olhe para Christian.

– Tudo bem.

Ele sorri e esfrega as duas mãos antes de chegar até o armário, voltando com um estojo de veludo preto.

– Vai ser só uma picadinha – anuncia como um completo psicopata antes de começar a se preparar para furar minha orelha enquanto me empurro pra cima da bancada que ele usa para suas invenções.