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DULCE MARIA SAVIÑON

Dias atuais

Acelero.

Ignoro a dor do vento acerando meus dedos, os cabelos chicoteando em minhas costas e o som alto do ar sendo cortado pelo capacete, me concentrando apenas na adrenalina que bombeia por mim à medida em que o velocímetro se move.

Ziguezagueio em meio aos poucos carros que trafegam pela madrugada e não penso sobre a possibilidade de reduzir, afinal, é como se eu fugisse da dor que eu sei que vai me atingir em menos de vinte e quatro horas, quando o avião decolar e levar Christopher para outro lado do mundo.

Para longe de mim.

Acelero mais.

A moto ruge, mas obedece.

Nesse segundo, com a fúria que eu sinto, o melhor é que ele me obedeça.

Os últimos dias não passaram. Eles correram.

Cada hora que eu passei ao lado de Luís foi reduzida a segundos. E mais rápido do que eu esperava, nosso tempo acabou.

Sei que não é pra sempre, mas um ano sem respirar é tempo o bastante para que meu corpo, meu coração e minha mente sofram.

Cerro o maxilar e tenho vontade de gritar ao ver que a moto não consegue ir mais rápido do que já está, como se isso me mostrasse que por mais que eu tente não vou ser capaz de me manter longe da dor que eu sei que vou sentir.

Então, pelo retrovisor, eu vejo o farol de outra moto piscar pra mim, se aproximando tão rápido quanto estou.

E eu sorrio.

Porque é isso o que esse homem faz comigo desde a primeira vez em que nos vimos.

Mesmo em meio a dor, ele é capaz de me mostrar algo bom.

Desacelero e deixo que sua moto me ladeie.

As viseiras abaixadas não deixam que nossos olhos se encontrem, mas eu apostaria minha vida que por trás do capacete Christopher está sorrindo, assim como eu estou.

Ele acena a cabeça e eu assinto, aceitando seu convite pra correr e quando voltamos a acelerar, fica claro que não estamos apostando uma corrida, estamos apenas... aproveitando a adrenalina que sentimos ao pilotar a quase duzentos por hora.

O vento continua machucando, o cabelo continua chicoteando e o ar continua zunindo, mas, ao ver sua moto lado a lado com a minha, não me irrito por não conseguir ir ainda mais rápido, afinal, ele está comigo.

Mais uma vez, a mesma sensação que parece me sufocar ao mesmo tempo em que me aquece sobe por mim.

Nem mesmo vejo o tempo passar e só percebo que estamos nisso há horas quando os primeiros raios de sol brilham, anunciando o início da manhã.

Sem que seja necessário nem um único sinal, tanto eu quanto Luís, seguimos para uma área mais isolada e desligamos as motos, mas continuamos sobre elas, apenas tirando o capacete.

– Como me achou?– questiono, olhando pra longe.

– Acordei assim que não te senti na cama. – Sinto seu olhar sobre mim. – Conseguiu?

– O quê?

– Espairecer.

Rio, fraco.

AmnésiaOnde histórias criam vida. Descubra agora