Capítulo 1: O Trauma

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A chuva caía incessantemente, um som monótono que se misturava ao meu pensamento turbulento, como se o céu estivesse lamentando a dor que eu carregava dentro de mim. Olhei pela janela da sala de terapia, onde as gotas deslizavam pelo vidro, levando consigo fragmentos de um passado que eu desejava esquecer, mas que se agarrava a mim como uma sombra inescapável.

“Samantha, como você se sente hoje?” A voz suave da Dra. Laura me trouxe de volta à realidade. Ela sempre tinha esse jeito gentil de me fazer falar, mas hoje eu me sentia distante, como se estivesse observando a cena de fora do meu corpo.

“Eu… não sei,” respondi, a frustração transbordando em minha voz. “Às vezes, sinto que estou progredindo, mas outras vezes, sinto que estou presa em um ciclo sem fim.”

Ela acenou com a cabeça, encorajando-me a continuar, mas eu hesitava. Fechei os olhos por um momento, tentando encontrar as palavras que poderiam descrever o turbilhão dentro de mim. Era como se cada gota de chuva fosse uma lembrança, cada uma batendo contra a superfície do meu ser, despertando emoções que eu tentava enterrar.

“Lembre-se, Samantha, você está aqui para enfrentar isso. O trauma pode ser uma sombra que nos acompanha, mas é importante que você saiba que não está sozinha,” Dra. Laura disse, mas suas palavras não conseguiam aliviar o peso que eu carregava. O passado ainda me assombrava.

“Eu não consigo entender por que isso aconteceu comigo. Por que ele não foi punido?” As palavras saíram mais fortes do que eu pretendia, mas a raiva estava lá, pulsando sob a superfície.

“Você não é responsável pelo que aconteceu. A culpa é dele, não sua,” ela respondeu, mas isso não fazia sentido para mim. Como poderia eu não ser responsável? Como poderia eu não me sentir impotente quando o olhar daquele homem ainda estava gravado em minha memória?

“Mas ele ainda está lá fora,” eu disse, a raiva se transformando em uma tempestade. “E outros como ele também. É como se o sistema estivesse dizendo que o que ele fez não importa. Isso me faz sentir impotente.”

Dra. Laura fez uma pausa, e eu percebi que ela estava ponderando suas palavras. “Às vezes, o que sentimos é a vontade de fazer justiça. Mas a justiça nem sempre é encontrada nas mãos do sistema. Precisamos encontrar maneiras saudáveis de lidar com isso.”

Saudáveis. O que isso significava para mim? Eu não queria ser saudável. Eu queria justiça. Depois de semanas de terapia, uma ideia começou a brotar em minha mente. E se eu pudesse fazer algo? E se eu pudesse ser mais do que uma vítima?

Quando uma nova sobrevivente entrou na sala, chamada **Emily**, tudo mudou. Sua história era tão dolorosa e familiar. Ela falava sobre a impunidade do seu agressor, e eu podia sentir a mesma frustração fervendo dentro de mim. Olhei para ela e, em um momento de clareza, percebi que a nossa dor não era isolada, mas parte de um ciclo maior.

“Não pode ser assim. Precisamos fazer algo. Precisamos nos unir,” eu disse, a determinação crescendo em meu peito.

As semanas se passaram, e a ideia de agir se tornou uma obsessão. Comecei a investigar os casos de outras mulheres, cada história me impulsionando a ir mais fundo, a me mover mais rápido. Eu não queria ser apenas uma testemunha, queria ser uma força de mudança.

Naquela noite, a chuva parou. Olhei para o céu limpo e estrelado, e um novo sentimento começou a brotar dentro de mim. O desejo de lutar, de me levantar e de fazer valer minha voz. Eu não seria apenas uma vítima; eu me tornaria uma força a ser reconhecida.

Com um novo propósito, tomei a decisão de transformar minha dor em ação. A luta por justiça não seria mais um sonho distante; seria minha realidade. Mas, à medida que eu me preparava para esse novo caminho, percebi que a linha entre justiça e vingança estava prestes a se tornar perigosamente tênue.

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