A manhã estava fria e calma, nada além do comum na pequena cidade de Bergamota, que mais parecia um vilarejo do que uma cidade, ela era minúscula comparada as outras cidades de São Paulo, não havia prédios ou grandes movimentações de veículos.
Estava tão afastada de São Paulo que o Estado nem os reconhecia oficialmente, ninguém nunca ouviu falar da cidade, os únicos que a conheciam eram seus habitantes e os amigos das pessoas que se mudaram dela. Eu sabia bem que se fosse para o centro do estado e falasse que vim de Bergamota, uma parte riria e a outra desacreditaria que tal Cidade existisse, contudo todos temos muito orgulho do nosso pequeno lar e sempre que possível enaltecemos ela.
Éramos esquecidos, porém felizes!
As casas eram bonitas, tinham aspectos de arquitetura colonial, muito parecidas com casas nordestinas, bem coloridas e bem próximas uma da outra, existiam pouquíssimas ruas de asfalto, a maioria eram de paralelepípedos, haviam muitas arvores, típico de interior, cores mais verdes e menos cinzas. A cidade era tão pequena que quase todos se conheciam, algo comum em um local com quase 5 mil habitantes, todos conheciam a lojinha de R$1,99 da Dona Claudinha, a quitanda de esquina do Heitor e as diversas igrejas e bares que haviam se espalhado pela cidade.
Eu mesmo conhecia cada ponto da cidade como a palma da minha mão, quando criança passeava muito com meu pai e brincava muito pelos paralelepípedos da cidade com meus amigos e antigas namoradas. Pessoas comuns conheciam lojas e bares, já eu e meus amigos quando pequenos, conhecíamos o sistema de esgoto, brincávamos muito de esconde-esconde pelos labirintos abaixo da cidade e muitas vezes explorávamos o local em busca de jacarés, claro que nunca encontramos um, o animal maior que vimos foi um rato que correu por baixo das pernas de Luísa, me lembro até hoje dela correndo e gritando desesperada. Caio e eu rimos e quase caímos na pequena vala que havia no corredor, a medrosa da Luísa ficou brava e logo preocupada, avisou seus pais e então nunca mais exploramos juntos o local, eu nunca mais sequer entrei em um esgoto após isso.
Anos depois nos encontraríamos, em uma situação nada muito agradável, Luísa me ligara pedindo por socorro, eu sendo um bom "policial" a respondi e fui a seu resgate. Na minha chegada me depararia com a pior sensação da minha vida, pois eu vi Luísa e seu marido Caio, ambos mortos.
Meu parceiro teria ido comigo, ele foi aquele que iria anunciar o mau presságio para nossa pequena e pacífica cidade. "Acho que ele está aqui... O Padre chegou".
Porém isso só aconteceria no final do meu dia. Ainda estava de manhã e eu estava a caminho da delegacia, um caminho curto, ia sempre a pé, meu carro era usado em raros casos, como quando tive que tirá-lo da garagem para o limpar.
No meu caminho eu passava primeiro pela padaria do Sr. e da Sra. Augusto, eles abriam sempre as 6 horas da manhã, nunca depois e nunca antes, e 6:05 eu já estava lá, pedindo o de sempre ao Sr. Augusto, um copo de café e 2 pães na chapa. Nossos encontros eram marcados por um aceno de cabeça, um sorriso amigável de sua parte e um levantar de mão da minha. O velho senhor estava com seu uniforme padrão que se consistia em uma camisa social e calça preta ou jeans, usava um óculos retangular de metal fino, era calvo e possuía pouco cabelo e sua barba estava sempre por fazer, ele muitas vezes cuidava do caixa, porém ficava na chapa no horário de abertura para cobrir o chapeiro que sempre se atrasava. Ele me trazia o de sempre mesmo sem perguntar, e ele sempre acertava então nunca reclamei, sua esposa a Sra. Augusto eu via raramente na cozinha, ela quando me via acenava com a mão e piscava para mim, e eu mandava um beijo. Ela devia ter cerca de 60 anos, mesma idade de seu marido, vestia sempre seu avental branco, uma touca preta na cabeça cobrindo seu cabelo em coque e usava um batom vermelho quase imperceptível.
Naquela manhã então fiz o padrão, cheguei, acenei, mandei beijos, comi, paguei e saí. Após a padaria eu passava pelo parque, um pequeno coreto que naquele horário da manhã era apenas habitado por alguns cachorros e pelo Pudim. Ele era um mendigo que vivia perambulando pela cidade, todos o conheciam, e todos o ajudavam, eu o conheci quando eu ainda era pequeno, eu e meus amigos o apelidamos Pudim pelo fato de que sempre que podia comprava uma pequena porção na padaria Augusta.
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Banho Escarlate
Mystery / ThrillerPedro vive em Bergamota, uma pequena e entediante cidade do interior de São Paulo. Sua vida estava parada e cansativa, pois mesmo com seus 3 anos trabalhando como detetive, seu maior caso havia sido uma pequena briga de bar, contudo, sua vida estava...