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DULCE MARIA SAVIÑON

Quatro anos atrás

Não sei ao certo se é o cheiro de ovos ou a claridade que me acorda, mas mal tenho tempo de despertar antes que corra para o banheiro, cobrindo a boca.

– Maria? – ouço Christopher me chamar preocupado, mas não lhe dou atenção de afundar de joelhos em frente ao vaso e vomitar.

Meu estômago se agita e os espasmos forçam minhas costelas, o arrepio correndo por meu corpo enquanto minha última refeição é expelida.

Sinto meu cabelo ser puxado para longe da minha boca e, por algum motivo, tento empurrar Christopher pra longe, mas ao invés de se afastar, ele segura minha mão e entrelaça nossos dedos, como se dissesse que não tem a menor intenção de sair de perto de mim.

E ele não sai.

Na verdade, ele se aproxima ainda mais e fecha a tampa do vaso ao perceber que já não tenho mais o que vomitar.

– Tudo bem? – questiona baixo e eu assinto. – Você tá suando. Vou te colocar no banho – avisa sem o menor esforço, me ergue em seus braços.

Sem se importar com a roupa que estamos vestindo, Luís abre o chuveiro sobre nós dois, ajustando a água para uma temperatura quase fria, numa tentativa de aliviar o mal-estar que cresce.

– Odeio vomitar – reclamo em voz baixa, antes de começar o processo de tirar esse gosto desgraçado da boca.

– Eu sei – diz e se abaixa ao meu lado, me olhando de maneira preocupada enquanto toca minha testa, desgrudando os fios molhados. – Prefere tomar um tiro do que vomitar – repete mesma frase que dizia sempre que a ressaca vinha forte demais e eu acabava abraçando o vaso para esvaziar o estômago.

– Exatamente – confirmo, lhe devolvendo a escova, mas sem cuspir o creme dental, torcendo para que o gosto de menta neutralize o amargo da bile. – Acho que foi alguma coisa que eu comi.

– Tudo o que você comeu, eu comi.

– Então... estou doente.

– Estava bem até o meio da madrugada.

É, eu estava muito bem enquanto quicava no seu pau.

– Maria...

– Eu sei o que você vai dizer, Luís, e eu não quero que vá por aí. Eu não quero pensar na possibilidade de estar grávida.

Porque esse tem sido meu medo desde o mês passado, quando nós dois fomos para uma missão no México, conseguimos concluir a operação antes do esperado e decidimos aproveitar nossa última noite lá, bebendo doses e doses de tequila.

A tequila que não deixa nenhum de nós lembrar como acabamos no quarto de hotel, como transamos e, o pior, se usamos uma porra de uma camisinha.

Quando percebemos o que podia ter acontecido, mesmo que tivéssemos chegado na mesma conclusão sobre não sermos irresponsáveis ao ponto de correr o risco de gerarmos um filho, além de confiar que, nós usamos preservativos, também decidi que tomaria uma pílula, só pra garantir.

Não tocamos mais no assunto, mas isso não quer dizer que eu tenha esquecido da possibilidade da pílula não ter funcionado.

– E se eu estiver grávida? – contradizendo minhas últimas palavras proferidas, pergunto, olhando para onde sua camiseta cobre meu abdômen. – Que porra eu vou fazer com uma criança?!

– Maria...

– Um filho?! Como se cria um filho?!

– Ei...

AmnésiaOnde histórias criam vida. Descubra agora