"Acredito que posso voar... Sim, eu me permito voar! Parece ridiculamente engraçado e aventureiro, eu sei. Afinal, ninguém pode voar sem antes aprender a usar suas asas." - Lola
🌙Praça de São Nicolau, Primavera dos dias atuais...
Ainda consigo ouvir a voz do meu pai ecoando pela casa, vociferando que sua filha inútil seria um fracasso:
"Julia Antunes!" Ele suspirava nos nervos a flor da pele "Não dá pra viver inventando historias malucas, você tem que crescer!"
Segundo ele, eu iria me arrepender quando visse meus amigos de classe se tornando grandes médicos, advogados, engenheiros, pessoas bem-sucedidas. Enquanto eu? Ora, estaria lendo "livrinhos" para velhinhos no asilo, ou em algum outro lugar onde as pessoas são descartadas como bolinhas de papel, porque já não servem mais.
Não sei qual foi o pior infortúnio para o Sr. Ramón Antunes: Sua filha ter reprovado no cursinho de vestibular, como consequência, não ter terminado o ensino médio com dignidade; ou ter engravidado de um cara que nem sabia o nome... (bem, apenas para constar, eu sabia exatamente o nome e o sobrenome dele.
Creio que todos os eventos ruins que aconteceram em minha vida, acabaram de certa forma me instruindo a ser uma pessoa melhor. Ao mesmo tempo, me transformaram numa mulher que jamais imaginei que seria. Daqui para a frente sei que será diferente, preciso me adaptar a essa nova realidade.
Antes pensei ser apenas um sonho. Um sonho que nunca imaginei ser palpável ou real. Papai, com certeza tem orgulho de mim agora. Nós dois ainda não nos falamos desde o dia em que saí de casa. Daquela casa. Já se passaram anos. Meu irmão me ajudou com o lançamento no sábado passado, me contou que lá no fundo, o Sr. Romeu, deseja me ver novamente:
"Ju, você deveria visitá-lo e resolver isso aí dentro!"
"Não tenho certeza, se consigo!"
Tudo o que aconteceu lá atrás deve permanecer no passado. No entanto, eu sempre fui de guardar mágoas. Estou pensativa sobre isso. Será se consigo? Será, se consigo depois de tudo?
Uma convicção crescente dentro de mim diz que posso ser livre de todas as correntes que me prendem e me impedem de seguir em frente. Finalmente, posso me encontrar onde eu realmente quero estar. Exatamente aqui, nesta rodovia de possibilidades abundantes. Se existe algo que aprendi e desejo compartilhar do fundo do meu coração, é sobre a história que já foi escrita. O passado não pode ser alterado, nem mesmo pelas questões mais conflituosas que carregamos em nosso íntimo. Nada apaga as ações que já nos trouxeram consequências. O que nos resta é continuar...
O passaporte está em minhas mãos. Eu sinto ele. É real!
Para qual lugar quero ir? Enfim, posso ir para todos eles!
Clara, minha filha, não esconde o entusiasmo. Depois de andar de skate, tenho certeza de que, para ela, andar de avião será bem mais radical — para nós duas, na verdade.
Enquanto ela saboreia uma enorme bola de sorvete de pistache, guardo os documentos dentro da minha bolsa e finalmente encaro o outro lado da rua. Quem diria que um dia me sentaria numa sorveteria e veria exemplares das minhas "histórias malucas", espalhados pela vitrine de uma livraria? Parece impossível, mas é verdade! Me emociono sem perceber. Meus olhos são contornados por lágrimas de felicidade. Já viram lágrimas assim? Elas são mágicas!
De forma alguma eu gostaria de iniciar essa história com tristeza. Embora, é claro, haja espaço de sobra para ela aqui. Sempre há...
Clarinha me olha, sem precisar dizer uma palavra. Apenas sorri. Um sorriso meigo e travesso. O mundo poderia desabar, eu abraçaria esse sorriso e viveria tudo de novo. Seus olhos são de um azul oceânico, tão profundos quanto o próprio mar; as sardinhas espalham-se por suas bochechas cheias e rosadas; alguns fios encaracolados do seu cabelo castanho caem sobre a lateral do rosto, quase mergulhando na sobremesa gelada. No último segundo, ela os prende atrás da orelha com delicadeza.
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Destino: Para Todos os Lugares
Romance"Ah! e jamais posso me esquecer: A melhor parte, sem dúvidas, é a menor de todas: uma noite regada a álcool na tentativa de esquecer um cara escroto ou criar histórias de assassinatos tão habilidosas que alguém poderia levar a ficção à realidade, tr...